472 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 145
quando houvesse sublocação, e não tentar uma solução radical que ameace a tranquilidade de muitas famílias.
Mas há uma faceta que pode e deve ser já resolvida - a da sublocação total.
Se a escassez de habitações aconselha a uma atitude de prudência no que respeita à sublocação parcial, o mesmo não sucede com a sublocação total.
Aqui não se descortina nenhum benefício social que mereça ser acautelado. E por isso dou o meu inteiro aplauso à sugestão governamental de permitir ao senhorio tomar a posição do arrendatário quando tal caso se verifique.
Sr. Presidente: é tempo de terminar, dizendo, em conclusão, alguma coisa sobre a oportunidade e vantagem dos novos princípios legais e sobre a economia, dos diplomas em análise, tal como o exige o Regimento desta Assembleia.
Se bem que isso se depreenda, de certa maneira, das considerações que julguei de meu dever formular, quero expressamente afirmar que considero a proposta do Governo, em que também foram assimiladas algumas soluções do projecto do Sr. Deputado Sá Carneiro, como uma hábil e vantajosa medida política preparatória da normalidade, que todos desejamos, o que por isso lhe não regateio, na generalidade, a minha aprovação.
Disse.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi muito cumprimentado.
O Sr. Antunes Guimarães: - Sr. Presidente: ninguém duvida de que os dois diplomas em discussão - projecto de lei do nosso distinto colega Sr. Dr. Sá Carneiro e proposta de lei do prestigioso Ministro da Justiça -, um e outro visando o momentoso problema do inquilinato e alguns assuntos conexos, tiveram invulgar projecção em todas as classes sociais; e adivinha-se o anseio geral com que, em todo o País, só vêm seguindo, primeiramente, os trabalhos da Câmara Corporativa e, agora, os debates da Assembleia Nacional.
Problema geralmente reputado dificílimo e por alguns pessimistas considerado insolúvel. Mas, se for ponderado com a devida calma, apreciado segundo o critério de indispensável justiça e colocado no quadro das realidades, aliás bem evidentes, a sua solução afigura-se-me não sòmente viável, mas susceptível de o ser em condições de dar satisfação às exigências legítimas de senhorios e inquilinos; de garantir a precisa defesa de proprietários de prédios urbanos e rústicos na contingência de expropriações; de restituir à iniciativa privada a sua tradicional e fundamental intervenção na construção de moradias; e, ainda, de levar aos cofres do Estado e dos municípios os réditos precisos para a administração pública.
Satisfação a exigências legítimas de senhorios ou de inquilinos, venho eu de afirmar.
Mas sòmente a essas, às indiscutivelmente legítimas, porque, desgraçadamente, são assaz conhecidas, e desde há muito tempo, exigências doutro jaez, cujo expurgo radical e imediato a própria moral exige, tais como os abusos, por vezes monstruosos, da geneneralidade dos sobrealugos, as negociatas dos traspasses, depredações graves nos prédios e seu desvio, quantas vezes ruinoso e até imoral, para fins não autorizados nos arrendamentos; isto sem falar nas rendas escandalosamente baixas, que, não retribuindo nem de longe o capital investido nos prédios, nem ao menos permitem a sua conservação.
Falta de conservação, bem patente no aspecto sórdido de algumas zonas citadinas, em que prédios antigos, e até alguns de construção relativamente recente, se apresentam com as frontarias por pintar ou mascarradas de nódoas de aspecto sujo, com vidros quebrados, telhados desmantelados, caleiras rotas, e chegando algumas vezes a ameaçar ruína.
Isto o que se vê por fora.
Mas o que se passa no interior das moradias é frequentemente deplorável.
Acontece as famílias amontoarem-se em promiscuidade doentia e imoral, sem ar, faltas de luz, carecidas dos requisitos mais rudimentares de higiene e de tudo o que possa proporcionar-lhes o mais elementar conforto.
Ao lado destas insuficiências no que respeita aos prédios, verifica-se que, enquanto as câmaras, em obediência a planos grandiosos de urbanização, não trepidam em cortar quintas e bosques com novas avenidas (que tarde ou nunca virão a ser marginadas de casas, porque o afluxo anormal de famílias às cidades acabou com a guerra, que o determinara), ruas importantes, muitas delas centrais, são ladeadas de barracões ou de prédios modestíssimos, quantas vezes de aspecto medíocre e até miserável, constituídos por simples rés-do-chão, quando muito com um andar; e também acontece existirem largos espaços marginais dos arruamentos sem qualquer construção que contribua para os pesados encargos de iluminação, limpeza, policiamento é outros que a conservação exige, acontecendo acharem-se pavimentos e passeios arruinados, e até sem os requisitos mais indispensáveis, porque desta forma os réditos municipais não estão em relação com as despesas que tão precária urbanística exige, indiferente ao número de prédios e moradias, bem como ao respectivo valor e, consequentemente, ao montante das contribuições cobradas.
Mas, simultâneamente com o sudário deplorável e de já longa vida a que venho de aludir e lado a lado com as tristezas e prejuízos que lhe são inerentes, registam-se os que vêm lucrando à farta, merco de tão deploráveis circunstâncias, com o mal alheio.
Rendas mínimas pagas por inquilinos muitas vezes mais abastados que os respectivos senhorios, acontecendo terem estes de alugar a preços incomportáveis moradias para si ou suas famílias.
E, como se não bastasse o prejuízo das rendas a preços vis, é frequente registarem-se danos de vulto causados pelos inquilinos e serem os prédios utilizados em desacordo com as cláusulas contratuais.
Mas entre os abusos mais revoltantes regista-se frequentemente o dos sobrealugos, classe que vem medrando à sombra de legislação umas vezes insuficiente, outras mal aplicada.
Classe sem preocupações tributárias, que não segura os prédios nem olha pela sua conservação; classe que desconhece limitações de rendas, não faz arrendamentos nem atende a quaisquer considerações para ordenar despejos, que, apesar das peias burocráticas, sempre vai conseguindo ; classe que, invariavelmente, lucra e só é pobre no que respeita a escrúpulos.
Mas, apesar de tudo o que fica dito e do muito mais que haveria a dizer, outro remédio não se tem oferecido senão aturá-los, com toda a sua infindável série de abusos e de manifestações da mais torpe usura, os quais, constituindo a ruína dos proprietários, se vêm traduzindo na exploração ignóbil dos sublocatários e em autêntica ignomínia para a sociedade, que, mercê de leis anacrónicas, insuficientes ou iníquas, tem sido forçada a assistir ao desenvolvimento desses autênticos cancros.
Perante a jurisprudência, arrendar um prédio tem equivalido a transferir para o arrendatário e seus descendentes ou sucessores, e a troco de uma quantia insusceptível de actualização, todos os direitos de habitação ou para outro uso, ficando ao proprietário os encargos de tributação, de seguro e de conservação, todos eles seguindo a linha ascendente e fatal da actualização de salários e encarecimento de materiais, mas sujeitos ainda às gran-