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512 DIÁRIO DAS SESSÕES - N.º 147

Já aqui se demonstrou que 25 por cento, pelo menos, da população de Lisboa vive em partes de casa sublocadas. Ora este facto não pode deixar de ser considerado em relação aos seus reflexos na tranquilidade social.
Não podemos colocar numa situação de pura instabilidade tantos inquilinos que organizaram a sua vida à sombra de uma lei complacente, mas que era lei.
É justo, portanto, que este estado de facto, hoje geralmente transformado em estado de direito, seja respeitado, o que, aliás, é juridicamente imposto pelo principio da não retroactividade da lei civil..
Regule-se para o futuro o problema das sublocações; permita-se ao senhorio substituir-se ao arrendatário sublocador; mas não privemos de habitação ou local de trabalho a família ou indivíduo que, ao abrigo da lei ou de uma tolerância pela lei presumida, uma ou outro adquiriram licitamente.
E mais uma observação apenas, Sr. Presidente.
O projecto do Sr. Deputado Sá Carneiro e os aditamentos que, num trabalho mais do que magistral, a Câmara Corporativa lhe introduziu vêm resolver muitos e graves problemas jurídicos, que é da maior conveniência arrumar.
Diz-se, porém, que está em perspectiva a elaboração dum Código da Locação e que, por isso, será melhor deixar essas questões para momento mais oportuno.
Não é esse o meu parecer. Quem vive a vida dos tribunais sabe bem o que representa a incerteza do direito: é o desânimo e a dúvida sobre a máxima garantia de segurança social que o Estado nos dá.
Ora os tribunais precisam de ser cada vez mais prestigiados, e o seu prestigio resulta, em grande parte, da unanimidade do critério informativo das suas decisões.
Afigura-se-me portanto de flagrante oportunidade este capítulo do projecto de lei n.º 104. E nada se poderá objectar, também, relativamente à sua economia, desde que as suas disposições sejam devidamente coordenadas e integradas na proposta do Governo.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem !

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Cunha Gonçalves: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: poucas vezes subo a esta tribuna, porque me convenci de que a minha palavra não tem aquela eloquência e força de convencer suficientes para arrastar ao meu parecer a maioria desta Assembleia.
Não apoiados.
Desta maneira, convenci-me de que, não possuindo a eloquência de S. João Crisóstomo, a minha intervenção na maioria das questões seria coisa inútil.
Não apoiados.
No entanto, nesta questão do inquilinato entendi dever marcar a minha posição por vários motivos, e até mesmo pelo interesse pessoal.
Srs. Deputados: como VV. Ex.ªs sabem, o pós-guerra de 1914-1918 produziu em todos os países o singular fenómeno da extraordinária afluência de população às cidades. Foram várias as causas dessa afluência: o êxodo rural, a atracção das indústrias e a aglomeração forçada pela guerra, porque havia populações do campo abandonadas às suas próprias necessidades e incapacidade de a elas prover.
Havia também motivos particulares a cada país que determinaram essas mudanças incessantes de habitantes para as cidades, não só nos países ocidentais, mas até na Rússia Soviética. Com esta diferença: que a Rússia Soviética podia, em virtude dos seus poderes totalitários, proibir o movimento das populações, exigindo passaportes para viagens internas, o que nos países ocidentais nenhum Governo resolveria decretar.
Mas, caso singular: ao passo que o Governo Soviético abolia a propriedade da terra e todos os instrumentos de produção da riqueza, protegia simplesmente os proprietários urbanos, como um dos meios de acudir a esta situação perigosa.
Na Rússia Soviética foram consignadas, no seu Código Civil, certas disposições que os proprietários portugueses gostariam de ver na nossa legislação. De facto, uma das disposições é precisamente a de fazer cessar o arrendamento no termo do contrato. Nenhum arrendamento pode durar mais de doze anos. Findo este prazo, os arrendamentos serão sempre considerados por tempo indeterminado, sendo licito ao proprietário requerer o despejo do locatário por não lhe convir a continuação do arrendamento.
E há numerosas outras disposições que estabelecem a plena liberdade contratual, que no nosso País seria um ideal impossível de estabelecer.
Pelo contrário, nos países ocidentais, sobretudo nos países democráticos, entendeu se que a melhor solução para o caso seria a tabelação das rendas, a proibição dos despejos, a supressão da liberdade contratual, etc.
Porque foi esta orientação dos países democráticos?
Porque eles tiveram em vista apenas a aura popular, assegurar os votos dos inquilinos, e por isso se estabeleceu no nosso País aquilo que todos VV. Ex.ªs conhecem de 1912 para cá: estabelecimento de rendas fixas, supressão da liberdade contratual, proibição dos despejos, etc.
Na legislação de 1914, de 1919 e de 1924 partiu-se de dois princípios fundamentalmente erróneos: um é o critério de que todos os inquilinos são pobres e de que todos os senhorios são ricos, especuladores e exploradores do pobre. É um slogan absolutamente sem fundamento.
Eu pergunto à consciência de VV. Ex.ªs se se podem considerar pobres inquilinos que andam de automóvel, que frequentam o Casino do Estoril, que trazem as suas mulheres com casacos de peles que custam 100 contos. Estes inquilinos são pobres?
Podem considerar-se pobres comerciantes e industriais que tem sempre o automóvel à porta do prédio em que habitam como inquilinos?
Podem chamar-se pobres os inquilinos que sustentam as suas amantes em diversas casas da cidade?
Podem chamar-se pobres os inquilinos que, sendo altos funcionários, directores de grandes companhias, onde ganham 20 e 30 contos mensais, vivem em casas alugadas ?
Estes inquilinos são os exploradores dos proprietários, pois se negam a dar um pequeno aumento ao senhorio, alegando que tem a lei a seu favor!
Outro critério, a meu ver erróneo, foi transformar-se o rendimento colectável numa espécie de leito de Procusta, segundo o qual todas as rendas devem ser medidas.
Ora o rendimento colectável ilíquido é baseado na renda; como VV. Ex.ªs sabem, todos os proprietários, logo que fazem o arrendamento, têm de levar o respectivo contrato às secções de finanças -isto acontece de 1910 para cá -, e é esse rendimento colectável ilíquido que fica inscrito na matriz.
No decreto n.º 15:289, de 1928, diz-se que os senhorios de prédios inscritos na matriz antes de 1914 poderão aumentar dez vezes o rendimento colectável ilíquido inscrito na matriz. Somente na maior parte das terras da província não existe distinção entre os prédios arrendados em globo e os arrendados parcelarmente.
Comigo sucedeu isto: quando quis aumentar as rendas dos meus inquilinos, foi-me certificado na repartição de finanças que na matriz só constava o rendimento global,