DIÁRIO DAS SESSÕES-N.º 160 642
solução provisória, quer dizer, uma solução que será adoptada apenas enquanto não se atingir certa e determinada posição, ou seja, enquanto Lisboa e Porto não estiverem em condições de lhes ser aplicado o mesmo critério que se aplicará ao resto do País.
E, como é uma solução provisória, dentro de pouco tempo desaparecerá esta destrinça e ela não durará até ao fim do vigor da lei.
E esta razão dominou no meu espírito para aceitar a distinção feita pela comissão eventual. E depois, já em matéria de inquilinato, sobretudo em matéria de direito adjectivo, não é caso único ter-se feito esta distinção entre Lisboa e Porto e o resto do País.
Lisboa e Porto têm, na realidade - todos o reconhecemos e creio que é opinião dominante-, o seu clima especial no que respeita ao inquilinato.
A legislação, sobretudo para ser aplicada instantaneamente, tem repercussões no caso de Lisboa e Porto diferentes das que tem no resto do País.
Agradar-me-ia muito mais que a comissão tivesse encontrado uma solução que não fizesse esta destrinça, até porque, sendo na realidade a Assembleia Nacional a representação dos interesses gerais do País, eu não posso esquecer que represento aqui um sector do País
- a província do Ribatejo- e que, por vezes, em matéria legislativa vária ainda não se considera suficientemente o interesse da província.
A comissão eventual não encontrou outra solução para estes casos. Por isso não tenho dúvidas em aderir à solução por ela proposta.
O Sr. Melo Machado:-V. Ex.ª dá-me licença?
Muitas vezes o que tem sucedido é eu ouvir queixar-se a província de que, afinal, se legisla como se todo o País fosse apenas Lisboa. Eu não estou a contrariar V. Ex.ª; estou a salientar este facto e este queixume da parte da província. Efectivamente não é assim e as condições não são iguais. Não percebo agora como o facto de se terem feito dois processos pode causar tanta celeuma. Desculpe V. Ex.ª
O Orador: - Outra divergência entre as soluções apontadas aqui é a aceitação ou não aceitação das possibilidades económicas do inquilino como factor a considerar para a actualização das rendas. A lei deve inspirar-se nas fortes realidades da vida - é um princípio elementar.
Não há dúvida de que as possibilidades económicas do inquilino são um factor a pesar e a considerar quando se tenha de legislar em matéria de inquilinato. Mas também considero que a lei deve ter um carácter genérico e que é princípio elementar o de uma disposição legal ser aplicável nos seus precisos termos a todos os indivíduos a quem ela se dirige.
Este factor das possibilidades económicas do inquilino ainda há pouco foi fortemente salientado pelo Sr. Dr. Pacheco de Amorim. Efectivamente este é um ponto, repito, em que divergem as diversas opiniões aqui emitidas.
Seria talvez uma inovação em matéria legislativa portuguesa trazer para a lei um princípio como este que se preconiza nalgumas soluções aqui expostas. E depois, a despeito do que ele tem de humanitário, sentimental e
- digamos - até de realista, parece impraticável, sobretudo quando se pretende transferir de uns inquilinos para outros a responsabilidade pelo pagamento da renda global.
Este princípio, portanto, preconizado nas propostas dos Srs. Deputados Bustorff da Silva e Botelho Moniz não me parece praticável.
Acho perigoso impor tal princípio numa lei de tão larga repercussão, que tantos interesses afecta e que abrange a maioria da população portuguesa.
E depois há que considerar que a solução "actualização da renda" não funciona independentemente daquelas providências que já votamos para atenuar a crise da habitação.
Não podemos, portanto, considerar isoladamente este aspecto - actualização da renda - dos outros aspectos da questão. Por isso a própria proposta do Governo se designa pelo título de "Questões conexas com o problema da habitação".
Não considera exclusivamente o problema das rendas, a disciplina jurídica das relações entre senhorios e inquilinos.
Associa este problema ao de promover a suficiência de habitações para toda a população portuguesa, para que, depois de esta lei actuar no conjunto das suas providências, se poder caminhar para o regime da liberdade de contrato.
É esta a conclusão que extraio da letra e do espírito da proposta do Governo e das alterações que foram aqui apresentadas pela comissão eventual.
Criação ou não criação de comissões arbitrais é outra divergência que se apresenta entre as várias soluções.
É evidente que para pôr a funcionar, o sistema preconizado pelos Srs. Deputados Botelho Moniz, Bustorff da Silva e Pacheco de Amorim seria indispensável a criação de comissões arbitrais.
Já se disse aqui que não seria nenhuma originalidade esta solução do problema, porque outros países a têm adoptado.
Não me repugna aceitar a existência dessas comissões arbitrais, cuja intervenção seria reclamada facultativamente por senhorios ou inquilinos, cada um para o sen caso.
Mas essa solução não está, a meu ver, dentro da economia da proposta de lei que o Governo nos enviou, nem no parecer da Câmara Corporativa, e se lá não está razões de vária ordem devem ter imperado para tanto, e também não me parece que fosse uma solução absolutamente eficiente.
Sendo assim, para qual das soluções me inclinarei?
Considerando que a proposta de lei do Governo foi revista pela Câmara Corporativa e que depois estas duas soluções foram revistas pela comissão eventual desta Assembleia, que sobre elas trabalhou afincadamente, que com certeza considerou todas as objecções por nós aqui postas -e tanto as considerou que os vários membros dessa comissão têm respondido prontamente a todas elas-, parece que, na verdade, neste momento o que é praticamente realizável em matéria de actualização de rendas é aquilo que propõe a comissão eventual da Assembleia Nacional.
Várias sugestões aqui foram feitas pelos Srs. Deputados e várias propostas de alteração, de emenda e de substituição aqui foram apresentadas e farão parte do Diário das Sessões. E, meus senhores, o Governo não pode ignorar o Diário das Sessões.
O Governo fica tendo nas suas mãos uma larga possibilidade de regulamentar esta lei; e, portanto, nessa regulamentação pode dar satisfação a muitas opiniões aqui manifestadas que caibam dentro do espírito das disposições votadas pela Assembleia Nacional.
Assim, Sr. Presidente, concluo da seguinte maneira: o período de funcionamento da Assembleia Nacional foi prorrogado, dentro da faculdade que a Constituição confere a V. Ex.ª, por mais um mês, para discutir e votar a lei do inquilinato.
Assembleia Nacional teve dois pareceres da Câmara Corporativa e o parecer da comissão eventual.
O assunto está largamente debatido. Já não vai votar-se empiricamente qualquer das soluções que aqui se apresentam.
Considero que a Assembleia não satisfará o fim para que foi convocada se deixar de votar esta proposta.