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24 DE FEVEREIRO DE 1951 391

geiros, mantendo-se apenas as que já existem no ultramar.
A diferença de redacção que se nota entre o § 2.º sugerido e o artigo 8.º do Acto Colonial é fácil de compreender pela leitura do conjunto do artigo 2.º
A Câmara conformou-se com a proposta de lei quanto à supressão da intervenção da Assembleia Nacional para autorizar os Governos estrangeiros a adquirirem terrenos ou edifícios no ultramar. Na verdade essa intervenção parece dispensável.

Artigo 6.º

9. O artigo 6.º da, Constituição enuncia algumas incumbências fundamentais do Estado como instrumento político da realização dos interesses nacionais. Não se trata de uma enumeração exaustiva: pelo próprio texto constitucional se encontram outras dispersas, como se vê dos artigos. 12.º, 14.º, 16.º, 22.º, 31.º, 32.º, 34.º, 40.º, 41.º, etc.
A proposta de lei contém duras alterações ao artigo 6.º Pela redacção actual «incumbe ao Estado

3.º Zelar pela melhoria de condições das classes sociais mais desfavorecidas, obstando a que aquelas desçam abaixo do mínimo de existência humanamente suficiente».

Propõe-se agora que a parte sublinhada seja substituída como segue:

...procurando assegurai-lhes um nível de vida compatível com a dignidade humana.

Trata-se das tais modificações de redacção que não se impõem por nenhuma necessidade imperiosa caem estuo destinadas a produzir qualquer resultado prático.
Até aqui a Constituição consagrava o princípio da protecção aos econòmicamente débeis es impunha ao Estado o dever de velar por que as suas condições de vida não descessem abaixo do mínimo de existência humanamente suficiente. Se a Câmara bem interpreta o sentido do preceito, trata-se de uma forma de assegurar o dever de assistência social que incumbe ao Estado, em lugar do direito à assistência pública que a Constituição de 1911 inscrevei-a entre os direitos e garantias individuais (artigo 3.º, n.º 29.º).
Pela redacção agora proposta pretende-se, segundo parece, atribuir ao Estado uma função mais larga, que não se limita a evitar a miséria e o abandono, antes promove o acesso dos econòmicamente débeis a certo grau de bem-estar, assegurando-lhes um nível de vida compatível com a dignidade humana.
Mas qual?
Que conceito de dignidade humana se contém neste preceito? Qual é o critério de compatibilidade entre o nível de vida e essa dignidade? Dado que as necessidades humanas nos tempos presentes são ilimitadas e insaciáveis, onde acabará esta função do Estado como promotor do bem-estar individual?
A proposta de lei não é, infelizmente, acompanhada de relatório, como o exigiria a quantidade e importância das questões em que toca ou que vem suscitar. Mais uma razão para a Câmara Corporativa aconselhar a máxima prudência mas inovações. O texto da actual Constituição não impede que o Estado faça o que puder no sentido não pó de evitar que haja portuguesas sem as condições mínimas de existência humanamente suficientes, mas até para promover que eles melhorem de situação. Mas a primeira parte deste breve programa não está ainda cumprida: para que ir assumir solenemente compromissos muito mais difíceis ainda de honrar?
Porém, visto que o Governo julgou oportuno tocar no referido preceito, a Câmara admite que a fórmula adoptada em 1933 e segundo a qual o Estado deve obstar a que as classes sociais mais desfavorecidas desçam abaixo do mínimo de existência humanamente suficiente, pode prestar-se a interpretações desairosas para o País e não corresponde já às actuais preocupações em matéria social.
Por isso parece-lhe que o anais conveniente seria suprimir toda a parte final do n.º 3.º, o qual ficaria reduzido apenas à incumbência de zelar pela melhoria de condições das classes sociais mais desfavorecidas - o que constitui programa bastante vasto e compreensivo para nele caber toda uma política social de largo alcance.
Foi esta solução que no seio da Câmara conciliou opiniões divergentes e reuniu a unanimidade dos votos.

10. A outra alteração proposta para o artigo 6.º não merece o aplauso da Câmara pela razão da se tratar de mera afirmação redundante de um princípio já consagrado na Constituição.
Na verdade, propõe-se que seja aditado um n.º 4.º, segundo o qual incumbiria ao Estado:

Defende? a higiene pública e a salubridade da alimentação.

Ora o actual artigo 40.º da Constituição, que, segundo a proposta subsistirá, é do teor seguinte:

Art. 40.º É direito e obrigação do Estado a defesa da moral, da salubridade da alimentação o da higiene pública.

Não se compreende, portanto, o aditamento agora proposto, tanto mais que, como de início foi dito, vários outros preceitos existem dispenses, a indicar obrigações precisas do Estado 1.

ARTIGO 8.º

11. Careceria também de explicação em relatório a melindrosíssima inovação proposta para o n.º 1.º do artigo 8.º, segundo a qual na enumeração dos direitos e garantias individuais dos cidadãos portugueses será aditado, ao direito à vida e à integridade pessoal, o direito ao trabalho nos termos que a lei prescrever.
A Câmara ignora quais os desígnios do Governo ao incluir este novo direito na declaração das garantias individuais. Procurará esclarecer os problemas que essa inclusão pode suscitar.
E em primeiro lugar observa que o lugar em que se pretende inseri-lo não parece o indicado.
A afirmação do direito à vida e à integridade pessoal na Constituição não é meramente platónica: trata-se de direitos efectivamente existentes, isto é, cuja eficácia resulta da garantia assegurada pelas sanções penais.
Acontece mesmo que antes de se definirem expressamente esses direitos subjectivos a sua existência foi reconhecida por modo implícito através da cominação das sanções: a punição do aborto voluntário e do homicídio implica o direito à existência, assim como a pu-

1 O Digno Procurador que nesta Câmara representa a Ordem dos Médicos fez alguns reparos à redacção deste número da proposta dignos do nota para o caso em que se insista em aprovar o aditamento ao artigo 6.º
Assim, observa-se que a palavra higiene, considerada como «ramo do saber médico que se ocupa dos meios para salvaguarda da saúde», está a ser proscrita dos usos internacionais e da linguagem política: o Comité d'Hygiène da S. D. N.º foi, depois da segunda grande guerra, substituído pela Organização Mundial da Saúde. E é o termo saúde que presentemente se emprega onde até há pouco se dizia higiene pública.
A «salubridade da alimentação» é simples modalidade da higiene, e por isso não se justifica a especificação.