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12 DE JANEIRO DE 1902 151

ganização militar, de marinha- mercante, de obras públicas, etc.

Ter-se-á, porém, verificado a mesma sequência e unidade de critérios e de pontos de vista em matéria económica e sobretudo industrial?

Teremos nós já realizado tudo quanto humanamente - e como portugueses verdadeiramente conscientes dos melindres dos problemas da sua pátria- podíamos e devíamos ter feito para atingir esse estado de maturidade orgânica e espiritual tão necessário?

Que resposta, atinai, podemos dar, em consciência, a essas questões prévias tão fundamentais para que possamos, ao menos, começar por saber o que queremos, porque queremos e como queremos?

Lamento muito dizê-lo, mas receio que algo do que temos visto nesse campo, sobretudo nos anos que se têm seguido à guerra de 1945, nos leve a concluir por uma negativa muito pouco reconfortante.

O espírito com que parece haver sido elaborada a proposta que estamos apreciando, em contraste com a doutrina dos outros diplomas que a precederam - a Lei n.º 1:956, sobre o condicionamento industrial, de 1937, e a Lei n.º 2:005, sobre o fomento e reorganização industrial, de 1945 -, julgo mesmo que constitui só por si mais um exemplo desse tactear constante de um rumo que nos satisfaça que apontei.

Esse e outros sintomas, por isso que aqui e ali afloram com frequência no plano da nossa economia, dão-me mesmo às vezes a impressão de que não chegámos ainda a assentar ideias sobre alguns dos seus conceitos basilares, e por maioria de razões sobre certos pormenores da respectiva execução. E, todavia, tal é - nos absolutamente indispensável, por motivos óbvios.

Reparem, por exemplo, VV. Ex.ªs que, a um quarto de século de vida de uma revolução nacional que se disse corporativa, ainda se parece perguntar o caminho no campo das doutrinas gerais económicas: liberalismo ou dirigismo? Dirigismo integral ou mitigado? Corporativismo do Estado ou de associação? Concentração ou dispersão? No campo da própria orgânica e especificamente até no da estrutura do respectivo Ministério não falta mesmo quem discuta - e receio que com certa razão- se a direcção superior da economia deverá estar confiada, como presentemente, só a um Ministério da Economia, com dois Subsecretariados, ou a um Ministério de Coordenação Económica - em plano equivalente ao da Presidência e ao da Defesa -, que, assistido por um Conselho Superior de Coordenação Económica, integrasse em bases imperiais toda a política económica da Nação, conduzida através dos Ministérios das Finanças, Comércio e Indústria, Agricultura, Ultramar, Obras Públicas e Corporações, este último, por sinal, pesando já, só com a sua política de carácter social, com cerca de 25 por cento sobre o custo da mão-de obra empregada nas actividades industriais!

Não faço comentários, mas, registando o que vejo e ouço, sinto-me na obrigação moral - ao tratar concretamente da proposta que aqui me trouxe - de começar por pensar um pouco em voz alta e, guiando-me apenas pela razão e alguma experiência da vida, tentar abrir um caminho, pelo menos para mim, através da divergência manifesta de opiniões que parece ainda existir sobre o tão debatido problema da orientação que mais nos convém seguir na indústria.

Sr. Presidente: ao estudar-se qualquer tema que diga respeito à condução geral da política industrial de um país há que manter constantemente presentes no nosso espirito os seguintes três tipos de questões fundamentais:

Os interesses da sociedade;
Os interesses do indivíduo;
Os condicionalismos da própria indústria.

Só por uma justa ponderação e equilíbrio destes três grupos de sujeições -e não apenas pela consideração exclusivista de alguns deles-, por isso, será possível chegar-se às soluções que mais convenham aos objectivos de ordem superior que toda a política procura ou tem a obrigação de procurar.

Vejamos então o primeiro: os interesses da sociedade. Por definição, indústria é todo o conjunto de operações que visa a transformação de matérias-primas e a produção de riqueza, isto é, de bens que, directa ou indirectamente, interessem ao indivíduo ou à colectividade em que este se integra.

Leva-nos assim o estudo da História facilmente à conclusão de que as primeiras actividades de carácter industrial foram quase contemporâneas, se até as não precederam, das primeiras manifestações milenárias da actividade agrícola do homem, esse ser que, no dizer de alguém, desde que a sua presença se manifestou na Terra, logo se revelou como «técnico» e cuja prodigiosa aptidão para o desenvolvimento de uma vida em sociedade, bem como todo o seu progresso material e moral, estiveram potencialmente contidos na chama da sua primeira fogueira!

Desde então, e como muito bem observa o mesmo autor, «a história da civilização é, em grande parte, constituída pelos esforços alternados destas duas grandes forças que sustentam e dominam o indivíduo: a técnica, que prolonga até ao infinito a sua acção; a sociedade, que prolonga até ao infinito a sua duração.
Umas vezes é o génio industrial, a invenção cientifica e mecânica que parece conduzir toda uma civilização na sua marcha ascendente. Outras vezes é a sociedade que domina o progresso técnico, que o regula e, por assim dizer, o contém, dobrando-o à harmonia dos grandes instintos vitais; mas, enquanto civiliza em extremo, o pensamento técnico adormece-o: as requintadas realizações da Grécia e de Roma, os refinamentos da muito alta cultura chinesa, parece bem terem exigido semelhantes renúncias.

Suponho que muito pouca gente terá hoje já dúvidas sobre que é qualquer coisa como uma época de transição entre essas duas posições extremas que estamos vivendo, ou devíamos estar vivendo, se verdadeiramente quisermos salvar as formas de civilização a cuja sombra nos criámos.

Extraviada, com efeito, durante quase dois séculos por um racionalismo sistematicamente destruidor de tudo o que nos ligava às experiências e disciplinas de um passado secular; tendo-se atribuído o direito de decidir livremente, por si própria, das fronteiras do sobrenatural e da ética; arvorando o pendão do êxito material e da força como única razão de ser, ou fanal, da vida dos indivíduos e das sociedades, era fatal que mais tarde ou mais cedo a humanidade viesse a encontrar-se - qual novo «aprendiz de feiticeiro» - perante o trágico espectáculo de forças diabólicas em colisão, que ela própria afinal desencadeou. Esta a verdade nua e crua.

Ouve-se, no entanto, com mais frequência do que se devia, atribuir à técnica e à ciência a responsabilidade de todos os malefícios da nossa época, como se elas tivessem estado também presentes num período semelhante ao actual - o da queda do Império Romano - e não tivessem acompanhado, em contraste flagrante com essa afirmação, um dos surtos mais maravilhosos da história do Mundo: o do Renascimento!

Tenta-se fugir assim a uma realidade de que só o homem é responsável e pode remediar, e que é a de que não foi a máquina, mas o espírito diabòlicamente egotista com que ela tem sido usada -traindo alguns dos mais sagrados direitos do humano e do sobrenatu-