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12 DE JANEIRO DE 1952 153

cioso e hábil, perante um caso de doença ou anomalia organicamente séria: combate frontal à causa principal do processo patológico e mitigação, por adjuvantes adequados, das respectivas manifestações secundárias.

Por outras palavras: terapêutica integral, e não apenas a de alguns sintomas mais incómodos, teimosa e amorosamente aplicada durante tanto tempo quanto o necessário, mudem ou não mudem os responsáveis pela sua administração.

Este o ponto de chegada, quer o queiramos também, quer não, se efectivamente desejarmos alcançar resultados práticos e concretos em matéria de progresso industrial.

Se V. Exª. me dá, por isso, licença, Sr. Presidente, alongar-me-ei um pouco mais, para não me ocupar só seca e exclusivamente do condicionamento industrial - um dos tais tratamentos de sintomas secundários desagradáveis a que atrás me referi-, mas integrando-o devidamente no quadro geral das providências de conjunto que, a meu ver, convêm ser tomadas simultaneamente com aquele.

Respeitando, portanto, a mesma ordem de encadeamento das anomalias que apontei como caracterizando a indústria portuguesa, vou ocupar-me, ainda que muito rapidamente, como não podia deixar de ser, daquilo que suponho serem os respectivos remédios, a saber:

A expansão dos mercados;

O condicionamento propriamente dito;

O auxilio técnico;

O crédito e a atracção dos capitais.

Expansão dos mercados. - É este, como disse, o problema crucial de toda a indústria portuguesa, pois que sem mercados não há produção, sem produção não há lucros, sem lucros não pode haver progresso, nem técnica, nem bons produtos, nem bons salários, nem, em suma, bem-estar social!

Apesar de se tratar de uma realidade mais do que evidente, tenho a impressão de que ela ainda anda muitas vezes arredia dos nossos espíritos -de governantes e governados -, não sei se pensando que, abandonando à sua sorte o que é nosso e nos há-de sustentar, os outros ou o céu se hão-de encarregar, milagrosamente, de nos dar o pão e velar pelo nosso bem-estar e o dos nossos filhos!

Com necessidades de importação anual de produtos industrializados que pesam ainda em mais de 00 por cento (mais 3,5 milhões de contos) na nossa balança de importações; com o alarme gritante que nos dá o quadro dos nossos rendimentos nacionais, que, ao mesmo tempo, nos aponta uma capitação de rendimento na indústria, apesar de recente e embrionária, quatro vezes superior ao de uma agricultura muitas vezes secular; num mundo em que no campo industrial se está recorrendo aos mais agressivos processos de concorrência - como os da retenção de matérias-primas essenciais e o da prática dos seus duplos preços, que chegam a beneficiar a indústria dos seus países de origem em mais de 100 por cento do preço do custo dessas matérias-primas-, nós ainda hesitamos e nos damos, por vezes, ao luxo de preferir produtos estrangeiros, mesmo em igualdade de condições de preço e qualidade!

Ainda há poucas semanas um grande industrial se me queixava de que, tendo despendido, expressamente, alguns milhares de contos no equipamento de uma das suas fábricas, com vista à produção de certa maquinaria pesada que nos é muito necessária, estava a ver toda a sua arrojada e patriótica iniciativa em terra -depois do fabrico auspicioso de meia dúzia de unidades, uma das quais esteve exposta, com grande sucesso, na ultima Feira das Indústrias - pelos obstáculos de toda a ordem

que se lhe levantavam em certas repartições oficiais, sobretudo do ultramar, para poder ser preferido material de fabrico estrangeiro!

O exemplo é expressivo, mas não único; antes e depois dessa ouvi queixas de natureza análoga a outros industriais. Serve, porém, bem para demonstrar a urgência de uma mais rigorosa actuação governamental e colectiva no sentido da defesa dos produtos do trabalho nacional, tanto na metrópole como nas províncias ultramarinas.

Como muito bem se acentua no relatório da Câmara Corporativa e na declaração de voto do Sr. Prof. Rodrigues Queiró, é, de tacto, cada vez mais instante traduzir-se por actos nu campo da política económica concreta aqueles princípios de coordenação e unidade imperial que há muito se proclamam.

Em quase todo o território nacional, mas sobretudo no de certas províncias ultramarinas, está-se processando hoje, com efeito, um movimento de larga envergadura no sentido do seu equipamento e desenvolvimento, em parte importante, à custa de produtos estrangeiros, que fazem uma guerra de morte aos nossos.

Suportarmos, pois, as responsabilidades e encargos de todo esse esforço e deixarmos aos estranhos um dos mais imediatos benefícios que dele poderíamos tirar - o do progresso efectivo da nossa armadura industrial- é repetirmos o mesmo erro que cometemos, bem. como a Espanha, no século XVI, quando sofremos a inflação brutal produzida pelas riquezas dos Descobrimentos e as não aproveitámos no desenvolvimento das nossas indústrias, deixando esvair essas riquezas a fazer trabalhar para nós os nossos perigosos concorrentes - a Holanda, a Inglaterra, a França, etc. -, os verdadeiros beneficiários de todo esse ouro, como os séculos seguintes bem vieram a demonstrar!

Temos, portanto, de agir e agir depressa.

Não bastam, porém, atitudes passivas, embora também evidentemente úteis, como, por exemplo, as medidas recentemente tomadas sobre a obrigatoriedade de preferência dos produtos nacionais (Decreto n.º 38:504) e sobre o reajustamento das pautas alfandegárias.

Impõe-se, sobretudo, a planificação adequada e a realização esclarecida de uma ofensiva sistemática no sentido da expansão efectiva dos mercados para todos os nossos produtos em geral, e os industriais em particular, aqui, no ultramar e no estrangeiro.

Reparem VV. Ex.ªs que, enquanto países estrangeiros bem mais ricos e poderosos que nós chegam a possuir organizações, oficiais e particulares, expressamente para esse fim - que para tal se servem dos mais variados meios, desde a propaganda ao estudo e informação permanente das necessidades e demais características dos mercados-, nós nem sequer podemos possuir ainda, à falta do comando único de um Ministério de Coordenação Económica, uma orientação convenientemente centralizadora sobre a matéria, dispersa presentemente pelos mais variados Ministérios: Economia, Ultramar, Estrangeiros, etc.

Excepção feita, por isso, de uma ou outra actividade melhor organizada corporativamente, o industrial português tem de contar prática mente consigo - num mundo de concorrência atroz - se tiver a veleidade de muito patriòticamente pensar em colocar os seus produtos no ultramar ou no estrangeiro.

As próprias referências de ordem geral sobre as tendências particulares dos vários mercados em cada momento, que tão facilmente poderiam ser colhidas e divulgadas periodicamente pelos interessados, com o auxílio dos nossos consulados e adidos comerciais, se existem, morrem quase sempre, sistematicamente, no segredo ou nos arquivos das respectivas repartições oficiais.