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494 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 135

dos alunos, que, como os seus mestres,, tem outra aspiração mais alta do que viver entre rurais.
O que fica dito não significa censura ao abnegado e heróico professorado primário, classe benemérita a que é devida a melhor e mais agradecida homenagem, pelos seus valiosíssimos serviços. O que se dá está na lógica das coisas e é resultado de não se ter ainda posta completamente a escola ao serviço da Nação e dos seus maiores e primordiais interesses.
O professor que tenha de ensinar na aldeia tem de receber para isso uma formação especializada, som o que a escola nem chegará a interessar o meio em que funciona nem a pôr-se bem ao seu serviço.
Não há nada que estranhar que professores ou professoras com horror à vida da aldeia e sem espírito rural tenham, enquanto se conservam em escolas da aldeia, como única preocupação sair dali quanto antes.
De tudo quanto acaba de dizer-se resulta, Sr. Presidente, que o empobrecimento das nossas aldeias se deve à falta de preparação dos rurais para o exercício da sua profissão.
Se não é missão da escola primária fazer agrónomos nem regentes agrícolas, nem capatazes ou práticos da lavoura, há direito de exigir-lhe que trabalhe para Portugal, não desviando do trabalho da terra e estimulando no amor a ela a quase totalidade dos seus alunos.
Parece que não ficaria mal, antes daria às populações rurais possibilidades de maior domínio da terra e maior resultado do seu trabalho, que junto da escola da aldeia funcionasse um campo de experiências e demonstrações de cultura agrícola, onde a criança, na idade em que é mais olhos e sentidos e imaginação que raciocínio, visse como se faz e aprendesse a fazer.
A poda, a enxertia e outras artes da profissão agrícola constituiriam para as crianças interessantes diversões, que seriam ao mesmo tempo preciosos ensinamentos. E não aconteceria depois o que está sucedendo actualmente: o rapaz que se apanha com o exame da 4.ª classe querer ser tudo menos lavrador e chefe atilado de uma família agrícola.
A isso se deve a falta de amor à terra e de competência para a granjear convenientemente. Este factor, junto a outros mais, concorre para que no trabalho da terra fique apenas quem não serve para outra profissão mais rendosa e para que não seja mais alto o nível económico das populações rurais e se não possa decentemente aguentar nas aldeias uma população densa e rica de costumes e de alegria de um trabalho desejado e suficientemente compensador.
Sr. Presidente: sem o pensar, o quartel une-se, em conspiração, à escola contra o maior rendimento do trabalho agrícola e para o desamor à profissão agrícola e à vida na aldeia. Precisa a Pátria de soldados que, em horas de paz, a defendam do estrangeiro do interior e, em caso de guerra, da ambição o da ameaça de estranhos.
O treino do português para soldado faz-se no tempo do serviço militar, em que deixa a sua terra e o convívio da sua família para os trocar pela vida no quartel.
Embora devam subordinar-se a vida do quartel e o tempo do serviço militar às exigências militares da técnica e prática do manejo das armas, não seria impossível nem mesmo difícil aliar-se a este treino a formação mais completa do português, para melhor defender Portugal e o engrandecer no aumento da riqueza e na valorização económica da Nação. Perdem-se as guerras por falta de soldados, mas também se perdem por falta de pão e à míngua de recursos e de resistência económica.
A melhor preparação e treino do português para a defesa da sua pátria serão os que o fizerem melhor soldado e homem mais capaz de valorizar e enriquecer a vida nacional.
O quartel faz soldados, mas desinteressa-se do outro aspecto de valorização nacional, quando podia favorecê-la e aumentá-la.
Sucede com frequência que os rapazes saem da aldeia para o quartel habituados a uma vida simples, morigerada e honesta, com bom sangue e bons costumes.
Ao terminar o serviço militar, parte deles não regressam ao lar e à sua terra natal, porque a vida das cidades, com os seus prazeres e divertimentos, por tal maneira os fascinou que juraram a si mesmos que haviam de ser da Guarda Republicana ou da Polícia, ou contínuos de um Ministério, mas que ninguém mais os veria na situação deprimente de «fossar» a terra.
Os outros regressam, mas nas horas de folga do quartel frequentaram lugares e adquiriram vícios, que os corromperam e lhes envenenaram o sangue.
A vida do quartel ensinou-lhes o manejo das armas, mas permitiu-lhes que se tornassem menos fortes e sadios para a defesa da Pátria. Quantas povoações rurais de Portugal foram enfraquecidas e envenenadas no seu sangue por estes rapazes, no regresso do quartel e da vida militar! ...
Seria difícil ao quartel defender melhor a saúde dos rapazes durante o seu tempo de soldados e fomentar neles maior amor da Pátria, valorizando-os para melhor e mais entusiástico exercício a sua profissão agrícola?
Creio que não. Bastaria para isso que junto do quartel houvesse para os rapazes vindos da aldeia uma quinta agrícola, em que nas horas vagas alternasse com o manejo das armas o exercício mais criterioso e mais perfeito das fainas agrícolas.
Não teriam assim tempo nem ocasião de frequentar lugares inconvenientes para a moral e para a saúde e, ao sair do quartel, regressavam aos seus lares mais habilitados a tratar da terra e a torná-la mais fértil e mais produtiva.
Desde a enxertia à floricultura, desde o emprego dos adubos até à poda, desde o estábulo e criação de aves e coelhos até à apicultura, quantas coisas interessantes a ensinar ao rapaz durante o tempo do serviço militar.
Se a lei já exige que ele não saia do quartel nem deixe a vida militar sem aprender a ler, escrever e contar, se era analfabeto, porque não estabelecer o mesmo princípio no que se refere ao essencial à sua profissão agrícola?
O quartel daria assim práticos no manejo das armas e práticos agrícolas, tão necessários à economia nacional e ao aumento da população.
Não se intensifica a produção ao ritmo da população sem ensino conveniente, e a maior parte dos que trabalham a terra ninguém os ensinou a trabalhá-la bem. Aproveitem-se ao menos as obrigações da escola e do quartel para os tornar mais úteis a si e à Nação, em sentido atento ao aumento demográfico no Império Português.

O Sr. Ribeiro Cazaes: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faz favor.

O Sr. Ribeiro Cazaes: - Tenho muita pena que V. Ex.ª ignore o que é hoje a vida de um quartel.

O Orador: - Nunca lá estive, não fui militar.

O Sr. Ribeiro Cazaes: - Normalmente conhece-se a vida militar através das suas exibições, que sómente se realizam no sentido em que elas podem servir a disciplina geral.
Mas a vida de um quartel, a vida de trabalho hoje numa unidade, é qualquer coisa de muito importante na vida da Nação.