19 DE MARÇO DE 1952 547
Justificação das propostas n.ºs 186 e 187. Podem consubstanciar-se em dois pontos:
l.º Melhor coesão e coordenação aéreas.;
2.º Maior economia.
Em relação a qualquer destas pretensas vantagens, ouso pedir a atenção dos Srs. Deputados para o parecer da Tâmara Corporativa e, muito especialmente, para aN desassombradas declarações de Acto dos Dignos Procuradores Srs. -Dr. Afonso Rodrigues Queiró, Dr. Rafael da Silva Neves Duque, Dr. Afonso de Melo Pinto Veloso, Joaquim de Oliveira Guimarães, Joaquim de Sousa Vaz e João Francisco Fialho. Ninguém deverá decidir sem as ter lido cuidadosamente. Postas em confronto com a fragilidade de argumentação do digno relator vencido, coronel Humberto Delgado, não podem deixar dúvidas de que lado se encontra u razão.
A teoria de que os aviadores de terra são perfeitos na luta auti-subinariua acha-se destruída pelas próprias alegações desse relator. Criada a base da R. A. F. nos Açores, em 1 milhão de milhas quadradas, depois de 3:l55 deslocagens e 24:978 horas de voo, a R. A. F. localizou unicamente 38 submarinos e atacou apenas 10. Não diz o relator se algum foi destruído.
Ora isto não pode considerar-se precisamente como triunfo nem como argumento em favor da eficácia da aviação terrestre no serviço marítimo. É caso para perguntar: tanto dinheiro e tantos esforços gastos para quê? E quantos submarinos mais poderiam ser localizados pelos olhos experimentados dos marinheiros e atacados com maior eficiência?
Quanto às manobras na Alemanha, a que se refere o mesmo ilustre relator, responderei apenas que foram manobras. E nas sapientíssimas manobras, em tempo de paz. só existe um pequeno defeito: não haver inimigo a dar tiros.
Á coordenação debaixo de fogo é sempre muito diferente da coordenação nos problemas tácticos, nos mapas e nos relatórios.
Essa coordenação cresce naturalmente se se filiar naquilo que se chama espírito de corporação. É natural que seja maior entre aviadores navais e marinheiros do ([lie entre entidades mutuamente desconhecidas ou rivais. No debate sobre a especialidade voltarei ao assunto e fornecerei exemplos práticos. Assim, o argumento da coesão e coordenação é puramente teórico. Xá verdade, em vez de coordenação, realiza-se dispersão. Porquê? Porque, a pretexto de "*e unificar a aeronáutica militar, unifica-se sómente o comando administrativo. Xá .verdade, em troca, retira-se ao Exército e à Armada a aviação que deve cooperar directamente com as forças empenhadas na luta próxima e coloca-se entre essas forças e a aviação de (pie elas necessitam um novo orgão de tendência totalitária a dividi-las, em vez de as unir.
Unifica-se o comando, mas separam-se as realidades de execução. Centraliza-se a direcção superior, puramente administrativa, mas demora-se e prejudica-se a acção táctica.
Compreende-se a aviação estratégica, à disposição de um comando supremo, paro missões de destruição dos elementos de produção e comunicação do adversário. Porém, essa não vai existir entre nós. Mas a aviação que trabalha com a" unidades navais, apoia e defende a marinhas mercante e de guerra na luta anti-submarina nunca poderá deixar de ser aviação especializada.
Se não pertencer à Marinha, só atacará dezanove vezes os submarinos numa zona onde nada menos de cem (número oficial alemão) passaram invisível* em alguns milhares de ocasiões.
Coesão! Coordenação! Se para ligar as missões tácticas das armas fosse indispensável criar novos subsecretariados, dentro em pouco teríamos o Subsecretariado da infantaria, o Subsecretariados da engenharia, o Subsecretariado da artilharia e. para melhor os coordenar entre si, o super-subsecretariado do estado-maior. E o Pacto do Atlântico já não seria preciso. Enfrentaríamos sozinhos a Rússia Soviética. A sua cortina de ferro ficaria despedaçada pela nossa cortina de papel dos sub-secretariados ...
A proposta governamental não significa coordenação. Sob todo* os aspectos tácticos por que se encare, chama-se divisão. Divisão terrível, de resultados que podem ser catastróficos entre marinha de guerra e aviação naval. Fosso profundo que se cava entre a Armada e o Exército. Dificuldade de relações tácticas entre Exército e Aeronáutica.
A tropa de terra, a tropa que rasteja pelo chão, que assalta trincheiras e ninhos de metralhadoras, que sobe encostas e conquista montes; a tropa que luta horas e horas por um palmo de terreno e leva dias para avançar alguns metros, tem algo que dizer nas questões de aeronáutica. Não sobe a quilómetros de altitude, não marcha com a velocidade do som, mas, por isso mesmo, necessita que os senhores do céu não a abandonem, não dependam de comandos e subcomandos em número infinito, de mais esta dos arés de aviação a acrescentar aos estados-maiores dos exércitos, corpos de exército e divisões Necessitam de apoio rápido, decisivo e eficaz.
Vozes: - Muito bem, muito bem !
O Orador: - Não lhes serve a aeronáutica de tendência estratégica, cujas bases se situam a longa distância, cujos comandos são forçados a ignorar os pormenores das posições amigas e cuja metralha nos causa mais vítimas e mais desmoralização que ao adversário.
Do relatório da proposta n.º 186 conclui-se que, segundo as concepções actuais da nossa actuação em caso de guerra, as forças terrestres a intervir no conflito terão carácter expedicionário e deverão ser acompanhadas e apoiadas, naturalmente, por aviação de cooperação. j
No que respeita à Marinha, caber-lhe-á especialmente a missão de proteger a navegação pesqueira e mercante, especialmente nos pontos de acesso ao território- nacional, designadamente na luta anti-submarina e na defesa costeira. Para isso necessita de cooperação aérea especializada, com bases em terra.
As forças aéreas para operações independentes daquelas destinam-se, em especial, à defesa aérea do território contra aeronaves inimigas.
Sublinha-se também mo relatório do Ministro da Defesa que a política de amizade peninsular e os acordos militares realizados no quadro ido Pacto do Atlântico não fazem prever a necessidade da existência de aviação estratégica ou de bombardeamento a longas distâncias, que as grandes potências já possuem.
Analisados estes dados do problema, e verificado o desejo de economia natural em todos os governantes, meditemos nem profundeza se com lógica. Seremos levados a solução completamente diversa da proposta: para melhor economia e para melhor ligação táctica com o Exército e a Armada, visto não haver que considerar aviação estratégica, a força aérea de cooperação com o Exército deveria continuar no Exército e a aviação de cooperação naval deveria continuar na Marinha.
Esta solução seria a mais económica, se houvesse comunidade de escolas e de certas infra-estruturas.
No caso especial português importa muito mais a coesão entre aviação de cooperação terrestre e Exército ou entre aviação de cooperação naval e Marinha que entre duas aviações destinadas a missões distintas.