19 DE ABRIL DE 1952 749
quilinos. Há uma tal ou qual desorganização familiar, e a corrupção alastra na vida particular e na administração pública.
O problema social é o da distribuição da riqueza, que não tem solução vantajosa sem o aumento da produção. Salvo o caso de parasitismos económicos, que devem ser evitados e corrigidos, só o aumento de riquezas pode favorecer a questão social.
Para que o trabalho possa ser mais bem retribuído é, pois, necessário organizar, intensificar, valorizar a produção e obter nesta mais elevado rendimento; numa (palavra, resolver o problema económico, aumentando as riquezas, para que a todos caiba maior quinhão. Sem isso, a legislação de carácter social e de protecção operária será quase inútil ou poucas vantagens trará.
Sr. Presidente: as palavras que acabamos de reproduzir e que foram pronunciadas há quase vinte e quatro anos, têm hoje completa actualidade e podem servir de guia para se encontrarem os desvios a que já nos referimos.
Restauraram-se, é certo, as finanças, mas a economia não se restaurou, ou pelo menos não se aproveitaram os meios que já houve à disposição para se assegurar o aumento da riqueza nacional, que é absolutamente necessária para se elevar o nível de vida e, consequentemente, melhorar o problema social. É certo que este se não resolverá apenas por meios materiais, mas o outro aspecto não cabe no âmbito da aplicação dos dinheiros públicos; é de outra ordem, embora com ele também valesse a pena, e bem, gastar alguma coisa.
Deve tirar-se mais uma vez a conclusão de que o País não se pode entregar a largas despesas que não sejam de carácter reprodutivo sem que a sua economia esteja na verdade fortalecida, pois episódicos aumentos das receitas públicas não são garantia suficiente e corre-se o risco de que se desvirtue a verdadeira causa do abrandar do ritmo dos trabalhos iniciados ou anunciados e se leve à conta de inviabilidade o sistema político. Mas ainda isto não é tudo, e o que mais importa é a influência que tem sobre as gerações futuras.
Não se pode esquecer - e ainda há pouco foi demonstrado nesta tribuna - que a população continua a crescer em ritmo muito superior ao da produção de bens de consumo e do aumento da riqueza nacional. Com uma população acrescida os problemas sociais hão-de necessariamente complicar-se e as medidas já tomadas para a colonização interna e ultramarina mostram-se insuficientes.
Há que reconhecer que se perdeu muito tempo e se gastou muito dinheiro que poderiam antes ter sido aplicados em fomentar riqueza que facilitaria a colocação do nosso excesso demográfico. Não vale a pena insistir, a não ser para que da lição se colha algum proveito.
Portugal continua a ser um país essencialmente agrícola, mas em que as condições agro-climáticas ciclicamente são desfavoráveis. Mas da terra se vivia e só da terra quando abrimos as rotas marítimas que nos deram as glórias que o Épico cantou e assombraram o Mundo.
Éramos então poucos, como poucos fomos durante o tempo em que houve terras para conquistar ao árabe. Lentamente fomos aumentando e quando as especiarias se transformaram em ouro, por milhares, em cada ano, demandávamos o lonquínquo Oriente. Na mira do ouro, das pedras ou das especiarias, que tudo ouro era, ou ouro valia, abandonávamos a terra, conquistada com tanta glória e tanto sangue. Nas fúrias dos mares revoltos deixámos vidas e fazendas, primeiro nos caminhos da lendária índia, depois no do auspicioso Brasil, que el-Rei D. João VI, com a sua presença e a sua corte, valorizou.
Para se chegar ao apogeu, o grande Infante isolou-se no árido promontório, debruçado sobre o mar, a tentar desvendá-lo, a procurar arrancar-lhe os segredos. Não lhe chegou a vida para poder receber os louros da floria, mas também não viveu a época da decadência, atávamos reduzidos a bem poucos para podermos segurar a vastidão que tínhamos descoberto e senhoriado. Mais depressa ido que as tínhamos conquistado, delapidámos riquezas imensas, e, com as riquezas, foram-se as fontes.
depois, mais tarde, principiámos a aumentar, e em menos de um século no último- dobrámos a população do continente e ilhas. Vivemos na mesma faixa continental, agora que somos cerca de 9 milhões, com a mesma terra para nos alimentar como quando éramos apenas 2 milhões de almas; a terra, que é a mesma, menos a que, por virtude da erosão, os rios carrearam para o mar, continua ciclicamente a ser ingrata ou a desfazer-se em abundantes colheitas, como prémio pelo esforço heróico doa que a tratam, a trabalham, a acarinham.
E da terra que ainda hoje vive mais de metade da população portuguesa do continente, e é à terra que o fisco vai buscar uma alta percentagem do total que arrecada em cada ano. Por estas duas circunstâncias, importa que mais uma vez nos detenhamos no seu exame.
Os problemas sociais em Portugal, quer se queira, quer não, só terão possibilidade de se desagravarem quando a maior parte da população vir elevado o seu nível de vida, e a maior parte é a que anda ligada directa ou indirectamente à terra.
Verifica o relator das contas públicas, como já o fizera em 1949, o lento progresso nos rendimentos colectáveis rústicos e o consequente fraco aumento de contribuição predial rústica.
Outro tanto se não observa no que diz respeito à contribuição industrial, que vem aumentando razoavelmente.
Nos concelhos já cadastrados verifica-se um aumento substancial dos rendimentos colectáveis. São vinte e dois os concelhos já em regime de cadastro, tendo havido aumento de rendimento colectável em vinte e diminuição em dois. Os aumentos traduzem-se em percentagens que variam entre 19,93 em Almodôvar e 233,74 em Mértola. As diminuições verificaram-se em Cascais e Oeiras, respectivamente de 25,77 e 20,32 por cento em relação ao rendimento das antigas matrizes.
As matrizes cadastrais principiaram a funcionar em 1944 e os concelhos onde elas já funcionam viram aumentar o rendimento colectável em 80,46 por cento, correspondentes a 63:063.752$. Por outro lado, em outros vinte e oito concelhos procedeu-se à avaliação geral da propriedade rústica, subindo, em consequência, o rendimento colectável em 57,4 por cento, representando 56:236.732$.
Não obstante estes aumentos consideráveis, como já se disse, o progresso da contribuição predial rústica é bastante lento, pois entre 1938 e 1950 apenas rendeu mais 23,42 por cento.
Desejaríamos que os aumentos do rendimento colectável correspondessem, na verdade, a uma valorização efectiva da propriedade privada, mas julgamos que se não trata verdadeiramente de uma maior valia em consequência de maior produtividade, que é o que interessa atingir.
Por uma determinação dos respectivos valores, feita por métodos diferentes, subiram os rendimentos colectáveis, mas o cadastro geométrico em si não aumenta o valor absoluto da propriedade rústica.