5 DE DEZEMBRO DE 1952 151
que no campo lanígero se tem registado nos últimos anos. por fim, os terrenos de cultura esgotam-se amiugua fertilizantes naturais.
E tudo isto porquê?
Em relação a 1852 a nossa população aumentou 106 por cento, enquanto que o gado bovino aumentou apenas 59 por cento. E pela estatística do matadouro de Lisboa ainda se verifica, além disso, que a média de produtividade de um bovino adulto era, em 1910, de 264 kg e em 1943 era apenas de 206. Em 1870 tínhamos, em média, um terço de cabeça de gado por habitante e em 1940 esta média baixou para um quarto.
Como disse um técnico esclarecido, temos andado n sustentar os bovinos para trabalhar a terra, em vez de trabalharmos a terra para que ela sustente os bovinos.
Além do mais, convém ter presente que a criação de gados é o grande antídoto contra o desemprego rural que a mecanização da agricultura poderá vir um dia a ocasionar. Quanto mais gados mais trabalho para o homem - trabalho que eles generosamente retribuem.
Eu não me esqueço de que no relatório se afirma o reafirma que muitos empreendimentos referidos e não referidos serão realizados através das dotações a inscrever nos orçamentos ordinários e também sei que muitos aspectos de pormenor podem ser objecto de planos parcelares, a cargo das diferentes direcções-gerais.
Porém, essas alegações deixam-me um pouco incrédulo, porque não vejo que se tenha seguido um tal critério quanto ao sector industrial do Plano. onde se desceu ao ponto, que considero impróprio de um documento desta envergadura. de transferir para ele as discussões dos gabinetes e das cátedras sobre o rendimento dos carvões e os processos de aproveitamento das sucatas. Mas se me dissessem que aquelas passagens do relatório representam resposta antecipada às objecções e às denúncias de falha do Plano, então toda a discussão seria ridícula. E a nós, Deputados, que mais ou menos acreditamos na nossa função, só reataria responder a alguém que proclamasse «seja louvado o Governo» com um «paia sempre seja louvado» e, feito isto, pormos o chapéu na cabeça e tomarmos o elevador.
Mas também me parece que esta objecção não terá cabimento, porque a propósito da prospecção mineira só faz um largo relato de pesquisas e se termina por dizer que os trabalhos a efectuar serão pagos pelas dotações ordinárias do orçamento, porque se referem então estes trabalhos no Plano? Ou porque não referiram todos os outros, a cargo também do orçamento normal?
Na parte do fomento agro-pecuário não se vislumbra uma ideia , não se adivinha um plano, não se esboça uma directriz de melhoramento.
Será esse o caminho mais indicado? Não o creio.
O grande Anselmo de Andrade, já atrás citado, escreveu com a sua habitual lucidez:
Não se pode pensar em fazer de Portugal um país de indústrias, que nunca poderiam competir com as dos países estrangeiros: é a agricultura a nossa legítima função de trabalho.
Hoje, sem alterar o texto, poderíamos, contudo completar o conceito dizendo: a agricultura e as industrias ,à custa dos seus produtos a técnica moderna tem conseguido criar.
A industrialização crescente de todos os países do Mundo limita cada, vez mais as possibilidades de larga exportação de produtos industrializados, como está sucedendo com as nossas conservas de peixe .Por outro lado, quanto mais os agricultores dispuserem de elevado poder de compra ,pela criação de riqueza à custa da terra, tanto maior será o consumo de máquinas , de vestuário ,e de calçado, de energia eléctrica, de carburantes, etc. A agricultura é, de facto, a nossa legítima função de trabalho, ou, pelo menos a primeira das nossas actividades fundamentais.
Procurar trabalho para todos é bom; mas melhor seria que, ao lado desta ambição louvável, se procurasse também produzir alimentos para todos .Podem dizer-me, talvez que isto equivale ao mesmo, mas eu não aceito a equivalência. Num âmbito de economia familiar, e em épocas familiar, em épocas normais, ter o chefe de família trabalho equivale e ter pão e conduto para si e para os seus. Mas no quadro da economia nacional já assim não é. E em épocas anormais, há muita gente que tem dinheiro e valores, sem que, por isso, tenha o seu sustento garantido.
Como num plano de fomento se poderia traçar um programa de melhoramento da alimentação do povo português, sobretudo em produtos de origem animal, que são os mais nobres e os mais importantes para a produção de energia, não e este o local mais apropriado para o dizer. Mas, apesar disso, não quero deixar de contribuir com o meu depoimento no que se refere a um sector do campo animal, por ser esse o que menos mal conheço.
O nosso povo, especialmente o das zonas rurais, alimenta-se escassamente, e raro figura nas suas refeições um mínimo do protídeo indispensável ao equilíbrio orgânico.
No inquérito rural realizado em 1934 por intermédio da Universidade Técnica pode tornar-se conhecimento da emende de uma família rural minhota:
Almoço (às 7 horas) -Caldo verde o pão de milho.
Jantar (ás 12 horas) - Caldo verde, pão de milho e conduto (sardinha ou bacalhau ) quando o há.
Ceia (às 20 horas) - Caldo verde e pão de milho.
Eu não sou comilão, nem em sentido próprio nem em sentido figurado, e tão-pouco sou apologista das grandes comezainas. Mas, sem dúvida, esta alimentação é, aos olhos de todos a gente, fisiològicamente insuficiente. Se esta família come tão pouco, que pudera ela despender em vestuário e calçado, em objectos de uso doméstico fabricados pelas industrias, em energia e combustíveis, em transportes, etc., mesmo naquelas actividades que, não sendo indispensáveis à existência, fazem, no entanto, parte da vida do espírito e da condição de pessoas civilizadas?
Poderão responder-se que estas famílias não vivem melhor por falta de recursos e que outros meios do aplicação das suas possibilidades já lhes facultariam melhores bases de subsistência.
Estou de acordo. Mas não seria indicado que esta melhoria de aplicação de meios lhes fosse oferecida no ambiente rural em que vivem pelo aumento e valorização dos produtos da terra? Se assim não fizermos, estes milhares de famílias serão solicitados a um consumo mais avultado de produtos nobres, sobretudo de carne, e, como apesar da nossa inferior capitação já somos obrigados a uma larga importação, esta subirá progressivamente, e taremos então a surpresa do gastarmos na importação de carne e de gorduras as divisas que conseguirmos poupar na importação de ferro e carvão.
Num estudo publicado em 1931 pelo Ministério da Economia deu-se conta do que o povo português precisaria em 1960, se agrupasse então 8 650 000 almas, para se alimentar com 3 033 calorias por dia, o que ainda não seria muito. Ora como o presente Plano