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272 DIÁRIO DAS SESSÕES N.° 178

sempre mais e mais álcool, chegou-se aos 16 graus e descobriu-se a maravilha que é o vinho do Porto.

Foi o comércio deste vinho que salvou as empresas bacalhoeiras inglesas, porque a voga que alcançou em Inglaterra teve como contrapartida em Portugal a voga do bacalhau. E foi o bacalhau que fez a compensação do vinho do Porto. E não foi só em Inglaterra que o bacalhau e o vinho do Porto andaram ligados.

Foi também noutros países protestantes, como a Suécia e a Noruega. E a verdade é que, se agora importamos menos bacalhau, porque temos empresas nacionais que o pescam e preparam, também não é menos certo que estamos a vender menos vinho do Porto.

Não se pode concluir daqui que estes dois factos estejam ligados pela relação de causa-efeito, porque, de contrário, perguntaríamos: para que nos fadou melhor a natureza: para produzir vinho do Porto ou para pescar e curtir bacalhau?

Por isso digo: produzir para poupar ouro, não; para melhorar o nível de Vida, sim.

Vozes: - Muito bem !

O Orador: - Mas não pode bastir produzir mais e melhor, comprar e vender com sucesso nos mercados estrangeiros ligeiros, para aumentar o nível de vida da população. É preciso fazer tudo isto e alguma coisa mais: dar trabalho bem remunerado á população válida, ou, por outra, aumentar o poder de compra das massas. Só assim se poderá estabelecer o equilíbrio entre a população e as subsistências em nível mais alto.

Mas, como muito bem nota o relatório do Plano, o aumento da produção, tanto agrícola como industrial, pela melhoria da técnica, se por um lado aumenta a produtividade por habitante, por outro diminui o número de braços ocupados nessas profissões, e, muito ao contrário de aumentar o poder de compra das massas, a partir de certos limites vem a diminuí-lo.

Foi esta a razão profunda do desemprego permanente que na Inglaterra se iniciou em início em 1920 e da grande crise de 1929, que abalou a economia do Mundo inteiro e desorientou políticos e economistas pelos aspectos nunca vistos que apresentou.

Não podemos contar com a melhoria da técnica para dar trabalho a todos os braços disponíveis. Com a criação de novas indústrias, sim, podemos dar mais trabalho e aumentar o poder de compra; mas este meio não é saco sem fundo e as suas possibilidades diminuem rapidamente com o uso que dele se faça.

Vozes: - Muito bem !

O Orador:- O mesmo se pode dizer da colonização interna, de alcance muito limitado para o efeito de dar trabalho e aumentar a curto prazo o poder de compra das massas.

A emigração para o nosso ultramar, embora em progresso sensível, também não tem ainda, nem terá tão cedo, grande eficácia para a solução do problema que estamos a considerar.

A emigração para o Brasil, essa sim, se continuar a ser feita como antigamente, em que o emigrante ia e deixava cá a família. A emigração de famílias inteiras é um remédio para situações aflitivas, e nesse aspecto é digna do nosso acatamento; mas debaixo do ponto de vista económico não tem para nós grande interesse.

Todavia, é de ponderar que a nossa emigração para o Brasil, nem para Portugal nem para aquela grande nação é problema de mera economia.

O Brasil, pela sua língua, costumes, religião e história, faz parte integrante do grande império lusíada, e, como tal, se precisar do nosso sangue, devemos de lho dar, visto que Portugal é a Mãe-Pátria, a cabeça dessa grande comunidade espiritual que se ofende por todas as partes do Mundo.

Neste aspecto o Brasil está em pé de igualdade com o nosso ultramar. A todos nos prende e nos obriga a mesma fraternidade.

Mas independentemente destas razões de ordem espiritual, há outras de momento que nos forçam a aproveitar o melhor possível essa porta de saída para o nosso excedente populacional, que em alguns pontos cria situações verdadeiramente aflitivas! E não me refiro só ao trabalhador manual. Temos também excedente de trabalhadores intelectuais. Só de engenheiros há sem colocação mais de um milhar, segundo consta. O Brasil precisa de uns e de outros. Porque havemos nós de lhe negar tal auxílio, se também a nós nos convém a muito respeitos?

Dizem-me que está proibida a emigração de intelectuais e que só passaporte turístico podem obter. Há nisto uma grande crueldade. Pelo facto de terem um curso superior hão-de os jovens portugueses ficar amarrados à terra, como os antigos servos da gleba? Pior do que isto, porque estes não morriam de fome, porque tinham onde trabalhar.

Os intelectuais desempregados estoirarão de miséria se não tiverem família que os possa sustentar. Em qualquer caso viverão « uma apagada e vil tristeza».

Vozes: - Muito bem !

O Orador:- Acho horrível esta situação e imprópria de um país cristão.

E não se diga que o Estado tem direitos porque gasta muito dinheiro com as escolas superiores. E os pais não gastaram muito mais? E o que gastaram os pais não fica a menos aos filhos?

Repito: precisamos de mandar para o Brasil a maior parte do excedente da nossa população, mas de toda, que não só da mais inculta.

Vozes: - Muito bem !

O Orador: - Mas nem a melhoria da técnica, nem a criação de novas indústrias, nem a colonização interna, nem a emigração bastam para elevar o nosso nível de vida à altura em que para o dos povos do Ocidente europeu. E por duas razões: a primeira, porque o nível de vida não é somente um produto de bens materiais; e a segunda, porque, mesmo para a aquisição desses bens, não basta, a partir de certo momento da evolução, o poder de compra dado pelas actividades produtoras.

O nível de vida doa povos do Ocidente implica cultura, que não só abastança. Cultura intelectual e física. Cultura física, que é a saúde e vigor. Cultura intelectual, que é Religião, Arte, Letras e Ciências.

E esta cultura é ao Estado que compete, fomentá-la, que não monopolizá-la. E para isso tem de alargar os seus serviços, principalmente de educação e assistência, em escala mais do que proporcional ao crescimento da população, pelas razões que já aqui apresentámos quando, em Abril último, discutimos as contas públicas.

Sem este desenvolvimento dos serviços públicos não será possível aos povos cultos dar trabalho útil à população válida, nem criar nas massas aquele poder de compra necessário para dar escoamento aos bens materiais produzidos.

Poderá dizer-se que, dado o atraso da nossa técnica, bastará por agora que o Estado Português alargue os serviços de educação e assistência em escala proporcional ao crescimento da população.