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18 DE DEZEMBRO DE 1952 419

Era preciso, com efeito, reflectir-se uni dia no abuso que hoje se fax no nosso país, em certos meios, da palavra «demagogia».
Abusam da palavra, afinal, como os outros abusaram da própria demagogia: para estabelecer cortinas de fumo, obscurecer verdades simples e, tantas vezes, para camuflar ganâncias.
Não me é dado tomar por muito tempo a atenção de VV. Ex.ªs para concretizar desenvolvida mente, como tanto desejaria, o pensamento que deixo expresso acerca de uma larga elabora-lo legislativa e de uma redobrada acção política que julgo indispensável no domínio social.
Dignar-se-á, V. Ex.ª, Sr. Presidente, permitir-me, ainda que, ao menos, aponte para dois ou três aspectos concretos.

O Sr. Nunes Mexia: - V. Ex.ª dá-me licença?
Eu pergunto como é que V. Ex.ª, em face da nossa densidade populacional, que em função da área arável anda por 90 habitantes por hectare, consegue a efectivação do seu ponto de vista?
Se em terreno de regadio, segundo cálculos feitos, são precisos 4 ha para o sustento de uma família e em terreno de sequeiro cerca de 20 a 30 ha, como é que V. Ex.ª coordena esse pensamento com a possível área arável do nosso território?

O Orador: - Mas V. Ex.ª concorda com a necessidade absoluta da desproletarização?

Sr. Nunes Mexia: - Eu compreendo a defesa total da família, e, como esclarecimento, direi a V. Ex.ª que numa pequena conversa estivemos a fazer o cálculo da área correspondente ao ordenado de um funcionário público de categoria.
Tratava-se de um juiz conselheiro, e nós, dentro do rendimento real, chegámos à consideração do uma área próxima dos 1 000 ha.
Isto é apenas uma enunciação da realidade, pois a minha consideração é apenas a de conjugar o nosso desejo com as possibilidades reais.

O Orador: - Se V. Ex.ª não deixa de considerar, pois, a necessidade urgente da desproletarização do trabalhador português e se ó condição desta o acesso quanto possível à propriedade, julgo que encontrará razões para desfazer o pessimismo que exprime considerando que nem só na terra se pode ser proprietário, mas também na indústria, que vamos agora desenvolver tão decisivamente, há formas de assegurar o acesso do próprio operário ao capital, e considerando ainda que não temos ao nosso dispor apenas esta nesga de torra europeia, mas todo o vasto Portugal ultramarino, assim como a emigração.
De resto, como V. Ex.ª vai ver, no terreno concreto, não vou defender utopias, mas soluções já experimentadas por toda a parte. Não estou a pedir o absoluto, mas o que for possível.
O que devo procurar-se é que sejam criadas as condições para que o maior número possível do portugueses possa ascender à propriedade.
Mas que esta tendência seja marcada com firmeza na legislação e na acção política, visto que, embora contra doutrina expressa de Salazar, julgo não me enganar afirmando que se tem dado nos últimos anos, desde a guerra precisamente, demasiada concentração nas mãos de grupos fechados, sobretudo no mundo dos negócios, mas também na terra e até, como aqui tem sido discutido com toda a razão, demasiada concentração das grandes empresas. Esta concentração é que é preciso combater, pois ela tem prejudicado o aumento do nível médio de
vida, que, embora por forma a não poder ainda satisfazer-nos, é inegável ter-se verificado como efeito da obra de Salazar, e, sobretudo, é inegável estarem postas as condições económicas para um grande aumento.
Portanto, o que desejamos é que a tendência seja marcada decididamente, e não por forma tímida, como já está nas nossas leis, embora saiba que não há-de ser fácil chegar o momento em que o rendimento médio dos Portugueses seja o dum juiz conselheiro.
De resto, V. Ex.ª ainda há dias aqui pôs alguns destes problemas com toda a nobreza e isenção e de maneira que não contraria aquela tendência de justiça que eu sei estar também no seu espírito. Agradeço assim a interrupção.

O Sr. Morais Alçada: - V. Ex.ª está, salvo o duvido respeito, a enunciar princípios e, por consequência, não está a cuidar das possibilidades da aplicação deles, que numas actividades podem ter mais acuidade e noutras menos, e que deverão ser resolvidos conforme as possibilidades de cada uma delas.
Sondo assim, se os princípios de V. Ex.ª não se podem aplicar, muito ampliadamente, na actividade agrícola, por exemplo, eles são de maior aplicação, pelo menos nalguns casos, segundo a minha maneira de ver, à actividade industrial, corrigindo assim a tendência concentralista que se verifica neste sector.

O Orador: - É esse em parte o meu pensamento.
No parecer subsidiário da Câmara Corporativa da secção de Produtos florestais, quando trata de colonização interna, revelam-se algumas preocupações acerca de aplicações que pretendem fazer-se da doutrina contida na Lei n.º 1 940, segundo a qual pode a Junta de Colonização Interna promover a expropriação das terras beneficiadas pelas obras de hidráulica, agrícola e proceder à colonização directa.
Tal doutrina creio-a absolutamente justificada e não é ela, de resto, no da nova na nossa legislação.
Anda bastante esquecida uma lei notável que foi publicada já pelo Estado Novo, durante a gerência da pasta da Justiça pelo nosso ilustre colega Dr. Lopes da Fonseca: a lei do casal de família (Decreto n.º 18 551, de 3 de Julho de 1930).
Pois lá está prevista a possibilidade do expropriação de terras particulares, quando incultas ou do pousio, mas susceptíveis de melhor aproveitamento, para serem em seguida aforadas.
Aplicação esta bem mais avançada, digamos assim, que a da Lei n.º 1949, e de resto ao sabor da doutrina da legislação vigente nos países atrasados que querem verdadeiramente resolver o seu problema agrário e ao mesmo tempo fazer face ao comunismo com as armas próprias: citarei apenas a Itália de De Gasperi e o novo Egipto, que se verticaliza como se fora ocidental e cristão.

O Sr. Carlos Moreira: - V. Ex.ª dá-me licença? Eu não posso deixar de me associar às palavras de elogio que V. Ex.ª acaba de ter para com a disposição legal sobre o casal de família e o seu autor, nosso ilustre colega Dr. Lopes da Fonseca, mas, para sermos inteiramente justos (ocorre-me neste momento o clássico suum cuique), é preciso considerarmos que se trata de uma aspiração que vem de longe, estudada por doutrinadores que exerceram a sua acção já há muito tempo, como Xavier Cordeiro, por exemplo.

O Orador: - V. Ex.ª refere-se ao notável projecto do casal de família de Xavier Cordeiro? Sem dúvida, eu considero-o também um dos mais perfeitos trabalhos