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422 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 185

na grande e livre América, pátria precisamente da produtividade.
E o espanto também entre nós vem de não raro esquecermos que já no nosso texto constitucional aflorou o princípio. Dispõe, com efeito, o artigo 36.º:

O trabalho, quer simples, quer qualificado ou técnico, pode ser associado à empresa pela maneira que as circunstâncias aconselharem.

Já o nosso ilustre colega engenheiro Mendes do Amaral quis, quando da última revisão da Constituição, mudar aquele «pode» para «deve». Foi muita pena que não tivesse vingado o projecto, porque, na verdade. Sr. Presidente, já tarda também que nos actualizemos neste domínio.
A reforma da empresa, Sr. Presidente, torna-se uma necessidade urgente, se queremos sinceramente promover a desproletarização das massas e fazer frente à desolação colectivista.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Ela não é tanto uma forma de aumentar a retribuição do trabalho, como de elevação moral do trabalhador da condição de mão-de-obra vendável à de colaborador consciente. Ela é uma forma de obviar aos efeitos dessa pavorosa filosofia do ressentimento, com que estão a ser minados os alicerces das nossas sociedades do Ocidente europeu.
Escreveu Simone Weil, gentilíssima figura de mulher, normalista francesa que quis viver a fundo os ambientes proletários:

O operário não sofre apenas da insuficiência do ganho. Sofre porque é relegado pela sociedade actual para um papel ínfimo, porque é reduzido a uma espécie de servidão. A insuficiência dos salários não é senão consequência desta inferioridade e desta servidão.

A participação do trabalhador no lucro da empresa, sob uma modalidade que viesse a ser preferida entre as que têm sido estudadas e praticadas, seria até um recurso para corrigir, aos sectores prósperos, os estragos emergentes do facto de o salário familiar quase não ter passado, no nosso país, de uma aspiração, e ainda, Sr. Presidente, assegurando ao operário certa participação no chamado capital de investimento, de alguma maneira preveniria até o fenómeno corrente de os grandes aumentos de salários engendrarem o aumento dos preços.
Mas, sobretudo, Sr. Presidente, seria a forma de se procurar impedir a concentração capitalista, que anda tão paredes meias da concentração socialista, sem impedir, contudo, a concentração técnica que for necessária.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Seria a marcha para a propriedade generalizada às massas, que é garantia de liberdade, contra a propriedade monopolizada, que é instrumento de opressão e, iniludivelmente, veículo do comunismo.
Perdoar-me-ão VV. Ex.ªs se, apesar de ter tesourado impiedosamente nas considerações que queria, fazer, ainda fui longo.
Parecia-me que, em hora realmente tão decisiva como esta, ao votarmos diploma de tal transcendência, havia que sugerir, no menos, ligeiros tópicos, como fiz, duma elaboração legislativa e duma acção política no domínio social, que me parecem antes cada vez mais necessárias, precisamente para que deste, esplêndido surto de política económica a Nação tire todos os benefícios que se esperam.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Também é a hora em que a Nação se lança, com o empenho que há muito se esperava, na luta sem tréguas ao analfabetismo e, com o grande impulso dado ao ensino técnico, põe as condições essenciais da dignificação do trabalhador português. Plano de Fomento e Plano de Educação serão assim as bases, se a política social não claudicar, daquela necessária desproletarização de que falávamos.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Carlos Mantero: - Sr. Presidente: alegra-me verificar que o Governo fez um grande e honesto esforço para apresentar ao País e submeter à Assembleia Nacional um plano de acção económica convenientemente coordenado, por forma a imprimir-lhe larga medida de exequibilidade.
Planear é a função mais nobre do Estado, por oposição ao cansado dirigismo, socializante nos seus propósitos ou consequências, perturbador da ordem económica, com a sua intromissão constante na vida das actividades privadas, atentatório das liberdades individuais, vicioso desvio da função pública, com todos os inconvenientes de ordem administrativa, moral e política.
Quando na anterior sessão legislativa intervim no debate sobre o Condicionamento industrial, defendi a tese de que a função característica do Estado moderno é o planeamento, e não a simples administração ou dirigismo, e quando tive que falar sobre o povoamento e emigração insisti na necessidade de se planear para o conjunto dos nossos territórios, atendendo a todas as faces materiais e humanas do poliedro económico-político.
Por isso estou muito à vontade ao felicitar o Governo pelo trabalho que agora submeteu à nossa apreciação.
Considerado no seu conjunto, o Plano envolve agora o investimento de 13.700:000 contos, distribuídos em partes sensivelmente iguais entre a metrópole e o ultramar, pois podemos considerar como dizendo principalmente respeito ao fomento ultramarino o navio para a carreira de África e a subscrição da metrópole para o Banco de Fomento do Ultramar.
Serão, assim, aplicados na metrópole 6.940:000 contos e 6.360:000 contos no ultramar.
Estes simples números definem melhor do que qualquer passagem do relatório da proposta a importância que o Governo atribui na sua política ao desenvolvimento do Portugal ultramarino.
O ultramar tomou, por fim, o lugar que lhe compete na política oficial da Nação, em pé de igualdade com a metrópole.
Apoio o Governo na política de intensos investimentos no ultramar, porque creio que eles contribuirão mais do que qualquer outra coisa para a elevação do nível de vida geral, para o povoamento africano e, por consequência, para o fortalecimento interno e vigor expansivo do mundo português.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - As verbas atribuídas às grandes divisões do Plano indicam a relação de importância em que o Governo situa os diversos sectores nele abrangidos.