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420 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 185

doutrinários e de elaboração legislativa que conheço relativamente aos problemas da vida agrária.
Quanto ao caso da Idanha, focado no referido relatório, não me considere- suficientemente elucidado para concluir se já pode ter-se como certa a incapacidade dos proprietários para tirarem da obra de rega o rendimento devido e promoverem a cultura intensiva que se pretendeu.
Não estou influenciado, pois, concretamente por este caso. O que me leva a defender a manutenção daqueles enérgicos poderes dados à Junta é o aspecto social na generalidade, embora reconheça que deva melhorar-me a legislação, indicando até à frente algumas ideias a esse respeito. Com a hidráulica agrícola pretendemos, sem dúvida, o aumento da produtividade da terra, mas também, em grau não menor, alo por ser em grande parte condição daquela, a fixação das pequenas empresas familiares autónomas.
Quer dizer: a beneficiação das terras deve ser inseparável da colonização. precisamente como meio dos melhores para se atingir a desproletarização de que falávamos.
O problema não deve, pois, ser encarado apenas nem predominantemente sob o aspecto da produtividade, mas sob o aspecto social.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Melo Machado: - É que, se não estou em erro, a Lei n.º 1 916 estabelece que a propriedade pode ser expropriada desde que o proprietário não a utilize. O que às vezes causa preocupações é que se exproprie o terreno que está a ser utilizado.

O Orador: - Quando se faz fomento pretende-se fundamentalmente, como dizia, que as novas riquezas criadas sejam verdadeiramente distribuídas pelo menor número. Ora a beneficiação só por si, não seguida de colonização, dificilmente atingirá este alvo.
Não é só o caso da Idanha que parece mostrar isto. É também, Sr. Presidente, o de Alcácer. Bem sei que decorreram a vida poucos anos sobre a inauguração da bela obra de rega a que, em boa hora, foi posto o nome de Salazar.
Mas, pelo que se tem visto, por ora, os trabalhadores da região muito pouco ganharam com ela: ao que me informam, apenas ligeira melhoria de salário. Do copioso rendimento da obra não ... se vêem, por ora, resultados palpáveis no aspecto racial.
Ora, Sr. Presidente, não é para tão pouco que a Revolução Nacional se empenha em obras destas. Não é assim que se consegue a necessária desproletarizacão.

O Sr. Amaral Neto: - No aumento da riqueza que trouxe a rega não houve vantagem imediata só para o lavrador.
O volume de salários e o número de dias de trabalho que se têm pago tom aumentado muito.

O Orador: - Mas eu não nego; eu acabo de dizer a V. Ex.ª que houve melhoria de salário e admito que haja maior estabilidade no emprego; o que acho é que esses resultados são insignificantes em face do que se espera de obras como aquela.

O Sr. Carlos Mantero: - Precisamente o que quer dizer o Sr. Deputado Amaral Neto é que o número do salários pagos aumentou consideràvelmente.
Se o que impressiona a opinião conservadora é a ideia da expropriação, da facilidade de expropriar a propriedade plena e o receio de que se generalize a ideia de pouco valor dos títulos históricos de propriedade, lembrava-me então de que se poderia introduzir uma alteração na lei permitindo a alternativa entre a expropriação da propriedade plena e a do simples domínio útil. Esta solução pelo aforamento diminuiria enormemente os encargos financeiros, não chocaria tanto, penso eu, a mentalidade conservadora e permitiria igualmente que a colonização fé exercesse com possibilidades equiparáveis. Durante o longo período em que, nos fornos gerais, não podia, dar-se a remição do foro o proprietário lá conservaria os sons títulos históricos. Podiam tocar até no prazo do artigo 1 054.º do Código Civil.
Deixo esta ideia à alta consideração do Governo.
Está claro que na fixação do foro teria de intervir a Junta. Para o fixar, disporia do conceito de renda justa. No caso, seria a renda justa do capital-terra.
Sobre o conceito de renda justa têm sido feitas também entre aos notáveis especulações científicas o já está a tardar, Sr. Presidente, a passagem dos resultados desses trabalhos às realizações práticas.
Não posso alongar-me neste ponto; por isso farei apenas uma citação do Prof. Henrique de Barros, que me parece muito expressiva, sobre a matéria:
Legisla-se e intervém-se (quiçá demasiadamente) na formação dos preços, regulam-se e fiscal usam-se vencimentos e salários, mas nada de semelhante se tem feito no aspecto das rendas das propriedades rústicas. Dir-se-ia que invisível, mas eficiente, tabu protege este domínio contra as incursões das contemporâneas tendências de equidade social, já vitoriosas ou a caminho de o serem em tantos outros sectores da actividade económica.

Se preferíssemos a enfiteuse, não só no domínio que acabo de focar, mas em outros em que ela continua a ser largamente utilizável, não iríamos mais do que retomar a, nossa melhor tradição em matéria de colonização e a lição dos nossos melhores escritores,

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Não posso aqui demorar-me na matéria, mas não queria deixar de citar o que Oliveira Martins escreveu no seu famoso projecto de fomento rural, apresentado à Câmara dos Deputados em 28 de Abril de 1887 (mais uma nobre tentativa para introduzir justiça na agricultura que falhou, talvez por efeito do tal tabu de que fala o Prof. Henrique de Barros, tabu que já vem da noite dos tempos!):

O foro, esse grande moralizador da terra, na frase do Herculano, está vivo ainda no coração das nossas populações.

Em parêntese direi ainda, Sr. Presidente, que quando se medita nesta problemática, que só nos impõe cada vez mais imperativamente, relativa necessidade de introduzir-se justiça na exploração da terra, não raro nos tomam o desânimo e o cepticismo.
Pelos séculos fora nos aparecem os malefícios de tal tabu, murchando esbeltas iniciativas, fulminando ou corrompendo os reformadores, restabelecendo, como que uma inamovível fatalidade, a injustiça, o privilégio, o abuso da terra e do trabalho humano! Destaca-se até nós, num clarão de tragédia, o destino dolorosamente belo dos Gracos da Roma republicana!
Por outro lado, não podemos arredar-nos da ideia de que, ao domínio agrário, tudo há-de trazer alguma tonalidade conservadora para ter frutos duradouros, até pela forçosa influência da quotidiana contemplação dos ritmos lentos do mundo vegetal a penetrar almas e instituições.