19 DE MARÇO DE 1953 909
alcançar o alto ideal sintetizado na divisa espartana: Mens sana in corpore sano.
Eu bem sei que a experiência alheia não é para desprezar, até porque muitas vezes dispõe de meios que nós não possuímos, mas o que devemos ter sempre presente ó que Portugal é dos portugueses, que somos um povo com características próprias e que nos problemas espirituais e morais o norte está bem vincado nas almas lusíadas por muitos séculos de história e não se muda com a facilidade com que se altera o rumo duma nau.
Ora a educação física é, como procurei demonstrar no inicio das minhas considerações, acima de tudo um problema de espírito.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Como tal, a meu ver, exige uma unidade de acção, que só o Governo e um só organismo podem comandar.
É impressionante, porém, dirão os discordantes, que em nenhum outro estado se siga tal caminho. Na verdade assim é.
Pode dizer-se que em todos os países o problema da educação física compreende dois âmbitos totalmente distintos: o oficial e o da iniciativa particular.
O primeiro engloba a preparação da juventude, das forças armadas e das organizações paramilitares; o segundo as actividades praticadas em clubes do ginástica e desportos, reunidos normalmente em associações e federações.
Mesmo nos países em que mais se evidencia ou evidenciou o predomínio do Estado - isto é, uma clara tendência ultracentralizadora - tem-se verificado aquela diferenciação, quer no campo do estudo, quer no da acção.
Isso se baseia certamente no facto de a educação física da juventude ser obra de formação, o que só tem viabilidade se se exercer no período do crescimento e desenvolvimento corpóreo, enquanto as actividades clubistas, aplicando as qualidades que se pressupõem adquiridas antes, têm um fim utilitário imediato no sentido recreativo, exibicionista e de obtenção de records.
A legislação sobre educação física da juventude ó vasta em todos os países, diferenciando-se na extensão da obrigatoriedade, no número de lições semanais, na exigência ou não de exame nas várias classes, no que respeita ao ensino especial dos alunos que não podem participar das lições normais, no desportismo obrigatório e facultativo, nos programas, na preparação dos professores, etc.
É curioso registar que em todos os países, explicitamente ou não, se procura evitar o perigo que advém de estimular demasiadamente o espirito de competição, assim como do exagerado amor ao desporto.
Muitos países chegam até a adoptar medidas especiais para este efeito.
Aponto, por julgar um exemplo interessante, o que se passa no Haiti. O vencedor não tem, ali, direito aos trofeus. Eles pertencem à classe ou escola, conservando-se o anonimato de quem os alcançou.
Salvo raras excepções -alguns estados da América do Norte e Irlanda-, considera-se em toda a parte a educação física da juventude como um ramo obrigatório, no mesmo plano que nos ramos intelectuais. Em alguns países, organizações extra-escolares, de carácter oficial ou privado, preenchem as lacunas eventuais da escola.
Pelo que respeita à educação física para adultos, seria interessante registar o que se passa nos vários países, especialmente na Suécia, Suíça e Bélgica, por apresentarem curiosas características, mas o tempo falta e já vou sendo demasiadamente longo. Aliás, já falei nas linhas gerais a tal respeito.
Em Portugal tem-se verificado também a distinção entre as actividades da educação física de iniciativa particular e oficial, ocupando, todavia, a F. N. A. T. uma situação intermédia, aproximando-se da actividade clubista pelo seu cunho recreativo e competitivo, mas atendendo também ao benefício que as práticas físicas podem prestar às condições do trabalhador e do trabalho profissional que executa. É, pois, um campo privativo com finalidades específicas.
O que se pretende agora com a proposta de lei em discussão?
Que a 2.ª subsecção da 1.ª secção da Junta Nacional da Educação funcione como órgão de estudo e coordenador da educação física, sendo a Direcção-Geral da Educação Física, Desportos e Saúde Escolar o organismo dirigente que superintende em toda a educação física ministrada em instituições de natureza civil, do Estado ou particulares, fiscalizando, orientando e difundindo a sua prática.
Julgo que se dá um passo acertado em tão importante ramo da educação nacional e estou convencido de que é esta a única forma de seguir a sã doutrina definida nas minhas considerações iniciais.
É possível, não digo que não, que num futuro mais ou menos longínquo possamos entrar, francamente, ato mesmo no caminho duma ampla liberdade de conduta.
De momento, todavia, não é de aconselhar. Já fomos muito atingidos pela vaga do materialismo que assola o Mundo.
Tenho ouvido defender o critério do meio termo. Também não me parece acertado.
Seria transportar para a educação nacional o conceito moderno de direito internacional a que chamam «mentalidade colaborante». Não creio que os assuntos de educação comportem tal conceito.
Pena é que o diploma, seja tão pouco explicito e não surja, alveolado num estatuto geral da educação, que pedi quando se discutiu a reforma do ensino técnico.
Oxalá que a regulamentação o a execução possam traduzir o alto pensamento «Io legislador.
Pordoe-se-me a franqueza: pelo que respeita à regulamentação, só receio o fantasma da economia (mas já estou, já estamos todos, habituados a enfrentá-lo), pois em Portugal legisla-se bem; a execução causa-me mais sérias apreensões. Mais do que em ginásios, piscinas, campos de jogos e estádios; mais do que em aparelhagem up to date e no valor e número do recordmen, é indispensável, é forçoso, pensar nos executantes do alto pensamento que informa, o diploma em discussão.
Não há falta do homens em Portugal, como tantas vezes se houve dizer por aí. Olhem em frente, que os vêem!
De entre esses executantes têm de assumir especiais responsabilidades os que se classificam como professores.
Nós, os chefes do família, nós, os pais, desejamos que não se esqueça, o significado que no nosso país se leu sempre à palavra «professor».
Fora do lar é o representante do pai, e muitas vezes a sua influência deve fazer-se sentir nos lares dos seus alunos. Este é o velho conceito português.
Está muito esquecido e muito adulterado.
Há que corrigir a rota e continuar a marcha.
Antes de terminar, peço licença a V. Ex.ª, Sr. Presidente, para apresentar algumas ligeiras propostas do alteração, as quais, não modificando a estrutura do diploma, o tornam, cuido eu, mais preciso e mais em conformidade com as realidades.
Assim, na base I, ao fazer-se referência aos delegados militares, não se fala no Subsecretariado da Aeronáutica, que hoje é um ramo das forças armadas independente do Exército e da Marinha.