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DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 84 654

que se sublima até ao sacrifício voluntário da própria vida.

4. O ilustre general L. A. de Carvalho Viegas publicou na Revista Militar¹ um largo estudo sobre as origens e modalidades do nosso foro militar, para chegar a conclusão idêntica à do projecto de lei em apreciação.
O que atrás escrevemos poderia servir apenas de prefácio ao interessante trabalho, se não fosse nosso dever fazer a revisão de suas informações e deduções e completá-las quanto nos fosse possível, sem ter em mente determinada conclusão, visto que a nossa tarefa é oferecer todos os elementos aproveitáveis, com o sentido de contribuir para o esclarecimento de tão discutido assunto.
Parece-nos que, antes do desastre de Alcácer-Quibir, em que foi ceifada a flor da nobreza de Portugal, se sentiu a necessidade de organizar um exército de base popular, para tanto se publicando o Regimento do 10 de Dezembro de 1571, que organizou em todo o País as Ordenanças, com seus capitães-mores, sargentos-mores e oficiais eleitos pelos municípios, excepto onde houvesse senhores das terras ou alcaides mores, porque ai eram estes de direito os capitães-mores, e regulamentou as esquadras, bandeiras e alardos em que os homens de guerra se agrupavam, com aperfeiçoamentos depois introduzidos pela provisão de 15 de Maio de 1574.
A disciplina era mantida pelos comandos e a justiça era distribuída conforme as ordenações do reino e os forais dos concelhos. Não se pode dizer que houvesse foro privativo, tal como hoje o concebemos, mas u justiça não estava ausente das formações militares.
O Governo de então, enleado pelos acontecimentos que conduziram em 1580 à posso da Coroa por D. Filipe I, não teria tempo de armar e adestrar esta força, que de permanente só tinha os quadros, aliás não remunerados. Cremos que foi, no entanto, esta orgânica extensão da teia militar, juntamente à irritante Carta Régia de Filipe III de 31 de Dezembro de 1639, com rigorosas instruções para a recruta de uma grande leva de gente para ir servir em Espanha, que proporcionou ao nosso D. João IV o rápido levantamento de um exercito nacional, a que longa guerra ia impor o carácter de permanente e tornar necessária a outorga de justiça própria.

Instauração e evolução do foro militar no regime absoluto

5. É provável que durante os Governos filipinos se difundisse entre nós, através dos fidalgos, letrados e mercadores que frequentavam a Corte de Madrid, o conhecimento das Ordenanzas de D. João de Áustria e do duque de Alba para. os exércitos do seu comando e, sobretudo, as Ordenanzas de 1587 para o exército espanhol da Flandres, atribuídas ao príncipe de Parma, e portanto podemos admitir, como o Sr. General Carvalho Viegas, que delas veio a sugestão para os primeiros diplomas judiciais militares publicados por D. João IV, após a Restauração.
Com efeito, em 11 de Dezembro de 1640 foi instituído um conselho de guerra junto da Corte, composto de dez membros, uni promotor de justiça e um secretário, tendo um Ministro ou juiz letrado como assessor; mas foi o alvará de 22 de Dezembro de 1643 que definiu as regras de competência e processo desse tribunal, prevendo até que nos casos mais graves a ele assistissem mais dois letrados e prescrevendo a sua reunião em dois dias de cada semana.
Em França só em 1655 foram decretadas por Luís XIV as Ordenanças aperfeiçoadas de que todavia não encontramos a influencia na nossa posterior legislação do século XVII, pelo que a criação e organização bastante perfeita do nosso primeiro tribunal militar se pode dizer filha do espírito nacional.
A par subsistia larga competência disciplinar dos governadores das armas e dos comandantes dos exércitos em operações, sem prejuízo dos privilégios dos nobres e dos cavaleiros das três ordens militares, que haviam de prolongar-se até ao século XIX.

6. Com a estagnação da guerra e a paz não foi dissolvido o exército.
E como os crimes de furto praticados pelos incorporados irritavam as populações, enodoando as fardas, foi estabelecido em 25 de Janeiro de 1660, e depois esclarecido e renovado em 31 da Julho de 1664, que os réus de crimes de furto, mesmo de pequeno valor, eram excluídos do foro militar e relegados às justiças ordinárias.
Não tardou, porém, o foro militar a voltar a ter competência sobre todos os crimes praticados por militares, o que ficou definitivamente estabelecido pelo Regimento das Armas de l de Julho de 1678, «para acabar com as grandes contendas entre os cabos da milícia, seus auditores e os ministros da jurisdição ordinária».
É de notar, todavia, que foi estabelecido, quanto aos soldados e graduações não superiores a cabos de esquadra, que «o privilégio do foro militar só pertence nos que estão na fronteira, ainda quando dela se ausentem com licença» e disposição idêntica foi aplicada mais tarde, quando as tropas regressaram a quartéis, apenas aos que ficaram pertencendo aos efectivos permanentes.

7. Chamado o conde de Lippe a Portugal, procedeu à reorganização do Exército e redigiu o Regulamento de Infantaria 3, que com os- seus vinte e nove artigos - conhecidos por artigos de guerra do conde de Lippe- constituiu o primeiro esboço de um código de justiça militar entre nós, em que, assegurando o foro privativo, se estabeleciam regras processuais uniformes.
Confirmando esta orientarão, foi publicado o alvará de Outubro seguinte, afirmando que a jurisdição dos tribunais militares é privativa de qualquer outra, por mais privilegiada que seja, e submetendo-lhe os cavaleiros das ordens militares, embora ai ida com a regalia de que, aquando os culpados têm hábito de qualquer ordem, intervém nos conselhos ura número de cavaleiros igual ao dos oficiais de patente».
Só pode avaliar-se o alcance e a energia desta disposição quando se atente em que as três ordens militares de cavalaria gozavam o privilégio de ter um juiz geral dos cavaleiros e cada uma delas um juiz dos cavaleiros, segundo os seus estatutos, os quais podiam meter na cadeia os presos, como quaisquer outros juizes, e ser assistidos nas audiências pelos alcaides e meirinhos da cidade, tendo usufruído de atenções durante os Governos filipinos.
Tão furte era a tradição dos seus privilégios que já em 1801 o alvará de 12 de Agosto mandou que no Brasil os cavaleiros de Cristo, A vis e Santiago fossem julgados pelos desembargadores e ouvidores gerais do crime, disposição esta que a Carta Régia de Novembro de 1808, § 17, tornou extensiva aos cavaleiros da Ordem da Torre e Espada, criada per D. João VI.