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24 DE MARÇO DE 1955 655

8. Em tempo de guerra os tribunais militares funcionavam, nos termos das respectivas Ordenanças, pela forma expedita que as circunstancias impunham; mas em tempo de paz os réus podiam «nomear advogados que os assistam e aconselhem nos seus interrogatórios e aleguem a sua defesa» (Decreto de 5 de Outubro de 1778).
E, conquanto a Carta Régia de 21 de Outubro de 1757 houvesse qualificado de «crime de lesa-majestade de primeira cabeça» a confederação ou ajuntamento, vozes sediciosas e tumultos, para os amotinados se oporem às leis e ordens ou resistirem aos ministros e oficiais encarregados da execução delas, entregando-os à justiça ordinária, e fosse mantida a disposição do alvará de 21 de Novembro de 1763 que inibia os tribunais militares de se ocuparem de qualquer causa eivei, por maior que fosse a graduação do militar nela interessado, marcando assim nitidamente a especialidade do foro militar, certo foi que veio depois a necessidade ou a conveniência de entregar aos tribunais militares o conhecimento e julgamento da «resistência oposta por paisanos aos oficiais das ordenanças, em actos das suas diligências, ou que embaracem as conduções de recrutas ou qualquer outro objecto, porque em todos estes casos serão julgados como forma militar».
Mais longe foi outro diploma1 ao sujeitar a conselho de guerra os casos de «resistência aos oficiais e oficiais inferiores e soldados da tropa em actos da sua diligência, indo munidos de ordem escrita de seus superiores, que deverão apresentar».
O aviso de 2 de Dezembro de 1815 veio, porém, declarar que tal disposição é só compreensiva das diligências militares do oficio das Ordenanças, «pois, assim como os militares só perdiam o privilégio do sen foro quando resistiam à justiça em matéria ou coisa do seu oficio, assim não deviam os paisanos ficar privados do seu foro civil ou criminal quando resistiam às Ordenanças em objectos que lhes não eram próprios, como prender facínoras ou outras diligências em que entravam como auxiliadores, à .excepção de irem prender um paisano que resistisse às ordens do seu chefe, ou outros casos semelhantes i.

9. A este tempo já nos conselhos de guerra da Marinha, organizados nos termos do Decreto de 15 de Novembro de 1783, foram mandadas seguir as normas observadas nos das tropas de terra.
E outra ordem4 estabeleceu que nos regimentos de milícias se fizessem conselhos de guerra em tudo semelhantes aos das tropas regulares.
Mais tarde foi regulamentado que nestes conselhos servisse de auditor o juiz de fora da sede do regimento e que o general nomeasse para vogais os oficiais das milícias ou das tropas de linha que lhe parecessem.

10. Com este desenvolvimento da justiça militar cresceu também a necessidade de compilar e modernizar as disposições legais respectivas.
No sector civil acontecera o mesmo.
Por Decreto de 31 de Março de 1778 fora nomeada uma comissão de quinze jurisconsultos para proceder à revisão das Ordenações e das leis extravagantes e dispersas que nelas devessem ser incorporadas. Nada fez.
Em 23 de Março de 1783 foi nomeado para proceder a esse trabalho o Doutor Pascoal José de Melo Freire, que, quatro anos depois, apresentou um Projecto de Código de Direito Público e Criminal, obra notável para aquela época. Nomeada outra comissão revisora em 3 de Fevereiro de 1789, também dessa vez o código não se publicou.
Só em 21 de Março de 1802 foi criada uma junta encarregada de elaborar um código de justiça militar. Parece que alguma coisa teria feito, pois que em 13 de Janeiro de 1804 a encarregaram de fazer um código militar da Marinha.
Nenhum destes trabalhos, se só concluíram, veio a ser convertido em lei, e não admira. A época era agitada por ideias novas, que se reflectiam no próprio campo do direito; uns as queriam, outros as repudiavam.
E assim aconteceu que, perturbada a nossa paz pelas invasões napoleónicas e germinadas as sementes de dissídios internos que viriam a culminar na guerra civil, pôde ainda publicar-se um Regulamento para a Reorganização do Exército Português, de 21 de Fevereiro de 1810, o qual, quanto a foro militar, inseriu apenas o artigo XXX, limitando-se a declarar «que ele pertence a todos os indivíduos que nesta data o usam, segundo as leis estabelecidas, sendo dele exceptuados apenas os crimes de lesa-majestade e ficando anuladas as excepções feitas posteriormente ao alvará de 25 de Outubro de 1763».
Regressou-se puramente à época pombalina.

O foro militar no regime monárquico constitucional

11. Em Setembro de 1820 eclodiu o primeiro movimento liberal, que impôs um Governo imbuído do espírito novo que já em França produzira as Constituições de 1791 e 1793 e em Espanha a de 1812, chamada de Cádis.
Em semelhantes moldes foi elaborado um projecto de Constituição, em cujo artigo 11.º se estatuía:

A lei é igual para todos. Não se devem, portanto, tolerar nem os privilégios do foro nas causas eiveis ou crimes nem comissões especiais.

Logo se boquejou que este preceito atingiria o foro militar, provocando alarme os oficiais das tropas. Talvez por isso ele veio a ser apresentado às Cortes Constituintes com um acrescentamento:

Esta disposição não compreende as causas que por sua natureza pertencerem a juízos particulares, na conformidade das leis que marcarem essa natureza.

Assim se habilitou o Governo a fazer com que a «Regência do Reino, em nome de El-Rei D. João VI», para atalhar o descontentamento que se procurava alastrar, no Exército, publicasse em Ordem do Dia n.º 66, de 8 de Abril do 1821, «a declaração de que o foro militar ficava ileso e subsistindo em todas as causas militares e só extinto naqueles dos crimes civis que o militar cometer como cidadão, e que a lei que regular este objecto designar como tais, assim em tempo de guerra como de paz, como mostra o referido undécimo artigo: e que a medida da extinção do foro, já adoptada em todas as nações da Europa, foi agora empregada em todas as classes da Nação Portuguesa, ainda nas que gozavam mais subidos privilégios e sem as excepções indicadas para os militares que, apesar da distinta classe a que pertencem, não devem prezar menos a qualidade de cidadão, que nasce com o homem e o faz considerar membro da grande família do Estado».