15 DE DEZEMBRO DE 1956 189
nas obras portentosas onde dá efectivo e elevado cumprimento à sua divisa sublime de e fazer felizes as crianças da nossa terra», desde o preventório e das colónias de férias à beira-mar ou em clima de meia altitude até às múltiplas casas da criança, centros floridos de requintado gosto, instilando educação, instrução e nobreza nos que não nasceram meninos, e ainda contempla e acolhe os tuberculosos, os leprosos, os loucos e os muitos a quem a doença ou o sofrimento encurtaram os horizontes de felicidade da vida, dá público e inequívoco testemunho da inteligência cheia de privilégio do homem que a concebeu e realizou, tornando-a verdadeiramente eficiente, numa prodigiosa actividade que o tempo revigora cada vez mais e que causa assombro por se saber repartida com o apostolado da medicina, exercido em guisa de sacerdócio e, até há pouco, com as preocupações da cátedra universitária, que tanto honrou e dignificou, transmitindo a sucessivas gerações os primados da sua vastíssima cultura e a sua indefectível submissão aos comandos da verdade e do bem. Não admira, pois, Sr. Presidente, que o Governo da Nação, em acto cheio de justiça, houvesse concedido ao Sr. Prof. Doutor Bissaia Barreto o mais alto galardão da benemerência e que os seus numerosíssimos admiradores, obedecendo a um irreprimível sentimento de venerada gratidão, nas inesquecíveis solenidades do princípio deste mês realizadas em Coimbra sob as prestigiosas presidências de V. Ex.» e do Sr. Ministro do Interior, lhe tivessem significado o mais alto apreço por tão bem ter ele sabido s querido fazer o bem.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Ao evocar nesta tribuna a figura benemérita do Sr. Prof. Doutor Bissaia Barreto sei, Sr. Presidente, que cumpro, embora modesta e apagadamente, o dever indeclinável de reverenciar a bondade, a inteligência e a abnegação.
Sr. Presidente: ouve-se com larga frequência referenciar o baixo teor de vida das nossas populações rurais e apontar, com maior ou menor propriedade, o conjunto das causas peculiares desse fenómeno complexo, por ser somatório de muitos outros fenómenos, e que não se encontra ainda perfeitamente conhecido no conjunto vastíssimo dos seus impressionantes, elementos.
A razão está só, em grande medida, em ainda não se ter feito o inventário concelhio das necessidades primárias dos povos - e não pode deixar de tomar-se o concelho como unidade geográfica onde mais importa lutar- para, apurado um conjunto, se abarcarem as faltas que mais afligem os povos.
Luta-se, por isso, com grande deficiência de conhecimentos em tal matéria, donde derivam certas conclusões e medidas em que, muitas vezes, pouco acautelado fica o alto interesse local e nacional dos muitos problemas a resolver.
Não raro se verificam atardamentos ou paragens de que ninguém tira proveito, mas têm o triste condão de comprometer os grandes anseios dos povos e atingir o desejado dinamismo das suas administrações.
O facto tem repercussões locais altamente desfavoráveis.
Não vivem hoje as gentes, como outrora, conhecendo apenas quanto se contém nos limites mais ou menos vastos dos seus mundos. O conjunto dos muitos elementos de divulgação que o engenho humano criou desvenda com espantosa facilidade o valor das condições de vida nas diversas latitudes, criando naturalmente, para aquelas que se apresentam teórica ou praticamente como melhores, o desejo justíssimo de se tornarem conhecidas e experimentadas; a facilidade dos meios de transporte viabiliza tão natural emulação.
Ora, essas melhores condições de vida, se efectivamente experimentadas, prendem aqueles que lhes conheceram as vantagens, e então, por virtude desse natural fenómeno de atracção, que é lei da vida, desenraízam-se as populações dos seus locais de origem, que ficam, por isso mesmo, sofrendo cada vez mais os temíveis efeitos dessa «erosão humana», como, com inteira propriedade, já se apelidou o fenómeno.
E que, com todo o largo cortejo de aliciamentos, a vida citadina - seja no País, seja no estrangeiro - desvenda-se como verdadeiro eldorado, perante aqueles que, em largos anos de privação, mal se habituaram a vida de baixíssimo teor sempre sofrida, e oferece-lhes outra vida em que há mais remunerado e mais abundante trabalho ou facilidade de ocupação lucrativa, acesso mais franco nos benefícios da civilização, socorro mais pronto na doença e a própria emulação da proeminência social, porque viver-se na cidade é já, em larga medida, uma qualidade de sobreposição ...
Estes factores de tão grande influência orientam a corrente emigratória ou para a cidade ou para as terras da estranja e fortalecem-na largamente, deixando as vilas e as aldeias em ardorosa luta com a falta de braços para os trabalhos dos seus campos e para o fomento das suas restantes e imprescindíveis riquezas.
As regiões donde saíram, perante o êxodo cada vez mais notório e volumoso, ficam naturalmente empobrecidas, e esse empobrecimento tem evidentes reflexos na própria riqueza da Nação, que, a maior parte das vezes, não tira do vasto capital humano que se estabiliza nas cidades remuneração que chegue para compensar as perdas do abalo demográfico além sentido, encontrando-se até perante os graves problemas gerados pela abundante concentração.
Ora estes males merecem um combate eficiente, realizado através de política apropriada, à criação de aceitáveis condições de vida nas povoações de mais reconhecida importância, erguida» ao longo de todo o território nacional. E não deve ferir susceptibilidades o facto de se falar em povoações de reconhecida importância, quando se pede vida de teor aceitável para todos. E que não pode deixar de considerar-se que a dispersão de meios, de que já não se dispõe com abundância, cria o perigo de anular inteiramente os benefícios que poderiam fornecer se utilizados em doses convenientes para os males a debelar, e não fornece qualquer vantagem.
Por outro lado, há que reconhecer a dificuldade de servir múltiplos núcleos habitacionais de poucos fogos, dispersos em locais cujo aliciamento escapa ao domínio da nossa compreensão, por apresentarem nulas ou muito precárias condições de vida, havendo, como há, tantas zonas em que o povoamento seria muitíssimo mais fácil, pelas favoráveis condições económicas observáveis.
A existência desses núcleos não a saberá talvez explicar qualquer pessoa, muito embora viva a regar a terra com o suor da fronte, amando-a entranhadamente; o fenómeno, porém, aceita-se como chamamento de fatalidade ou actuação de filtro de subtis fragrâncias, apenas perceptíveis pelas almas e pelos corações daqueles que nós nunca compreenderemos .
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Sr. Presidente: ouviu a Câmara o relato impressionante do panorama de carência e de desconsolado viver de muitos povos das nossas vilas e aldeias, feito pelos ilustres Deputados que me antecederam nesta tribuna, intervindo na discussão da proposta de lei que nos ocupa.