30 DE MARÇO DE 1957 499
a desprezar quanto ao potencial se pode ir agora intensivamente aproveitando, no fito exactamente de alargar as possibilidades que a essa política, por natureza e por princípio, cabe, evidentemente, restringir.
Pelo contrário, se marcarmos como etapa nova e imediata do regime a aplicação à nossa ainda debilitada economia dos processos e dos meios que a experiência já creditou em tantos povos; se considerarmos como um dos fins principais do nosso esforço imediato a reorganização de todo o nosso sistema económico, de maneira a obter das possibilidades que actualmente se nos oferecem a forma de rapidamente ir aumentando o nível de vida do País; se criarmos no espírito de todos a necessidade duma devotada cooperação à solução de um tão magno problema, com juventude, ousadia, consciência e novidade, capaz de levar Portugal, entre as diversas nações, a posições que nos orgulhem por antítese, como aquela em que ainda nos colocam as estatísticas internacionais dos consumos médios, a traduzir uma vida materialmente desequilibrada e uma carência donde é preciso sair; se soubermos despertar em todos os portugueses a consciência dos meios de que dispomos para conquistar economicamente a nossa terra ao nível e da forma que se impõe, teremos dado não só um grande passo em frente, mas, sobretudo, o passo que é preciso para aliciar novos entusiasmos e vontades, pelo espírito revolucionário do que se pode conter nessas novas soluções.
E então poderão de novo surgir dedicações e sacrifícios nos actos de cada um, poderá exigir-se particular compreensão e acatamento para as consequências transitórias de medidas do mais largo alcance para o futuro nacional: poderemos juntar todos entusiasticamente para essa nova etapa, prontos a defendê-la de intromissões que a perturbem ou retardem, se não duvidarmos um momento de que ela nos levará ao lugar de particular destaque que teremos e podemos ter na comunidade civilizada mundial.
E não será trabalho que depois se arrume, mas trabalho que sempre e sempre se imporá continuar: de facto, não param outros países e outros povos na marcha sempre crescente do nível de vida que procuram, e de tal forma ale que às vezes chegamos a temer se, por rápida que possa ser a nossa marcha, não ficaremos ainda durante largo tempo, em relação a uns tantos, na posição relativa da diferença que agora nos preocupa.
Por isso não podemos esperar.
O que se impõe, portanto, é não parar nem hesitar, para que essa diferença, que temos de admitir que perdure, ao menos se apoie, pela parte que nos toca, naquela posição de dignidade e de presença que possa constituir ponto de referência e de comparação elogiosa para a grande maioria das nações.
Como é evidente, o baixo nível de consumos que encontramos ainda e em média para a nossa população tem graves repercussões também no campo económico-social e ajuda a explicar até essa espécie de ciclo vicioso em que vive a nossa economia, pelo desequilíbrio existente e dominante que, consequentemente, se verifica entre a produção e o consumo.
A produção adapta-se dentro de um período não demasiado longo a uma razão de proporcionalidade directa dos mercados capazes de a absorver; sem mercados não há produção que subsista ao fim de certo tempo, a não ser mediante artificialismos, que ao fim e ao cabo a oneram e ,consequentemente ,oneram também o País.
Uma população que tenha um nível de vida baixo e que se possa obrigar, em grande parte, a sacrificar o óptimo alimentar para poder viver dentro duma relativa satisfação de outras necessidades indispensáveis tem fatalmente não só de se desinteressar pelo supérfluo, mas até de considerar como tal grande parte das coisas que, muito embora próprias do grau da civilização em que vivemos, não se lhe apresentam com uma indispensabilidade imediata e directa.
E o pior é que, muitas vezes também. s a própria saúde que sofre por carência de higiene, de conforto e de cuidados.
É evidente, assim, que um país onde o poder de compra de uma grande parte da população se encontra abaixo daquela média que seria de desejar -como é o nosso caso- não se pode constituir como mercado que garanta uma média satisfatória para a sua produção também.
Pena é que muitos julguem que o caso não se apresenta desta forma, dado viverem -quantas vezes! - ofuscados, ou com a visão perturbada, por pequenos surtos daquilo que poderíamos denominar de «localizações de consumos razoáveis»; tal diríamos das conclusões precipitadamente tiradas do movimento dos automóveis no centro da capital a determinadas horas, ou pela estrada fora, rumo ao Estoril ou ao Guincho numa tarde soalhenta de domingo primaveril.
O erro está em pretender extrapolar essa impressão de alto grau de civilização e de conforto pelo nível de vida que enganadoramente traduz ao resto do continente português; de facto, em 1954, o número de veículos automóveis por mil habitantes era entre nós de 14,5.
Inferior a este valor encontrávamos, por exemplo, a Espanha com 8,2 e a Checoslováquia com 13,6. Logo acima destes tínhamos a Áustria com 22,2, a Itália com 25, a Finlândia com 28,9, a Holanda com 33,7. E faremos ainda os 43,4 da Alemanha Ocidental, os 67,9 da Bélgica, os 72,4 da França, os 80 da Inglaterra e os 92,3 da Suécia, etc.
De resto, se quisermos admitir números que poderíamos apelidar de internacionais, veríamos que em 1953 o consumo de gasolina em Portugal -incluindo a da aviação e excluindo a dos bunkers - andou pelos 17 kg/hab.; abaixo, portanto, do da Grécia e da Itália, que orçaram pelos 23 kg/hab. Dos países membros da O. E. C. E. só a Turquia, aliás, se apresentou com um consumo per capita inferior ao nosso.
Todos sabemos, por exemplo, o esforço enorme que em Portugal se tem feito no que respeita à produção da energia eléctrica; conseguimos neste campo da maior importância para a economia nacional uma série de inegáveis sucessos, correctores, sobretudo na metrópole, duma inconcebível pulverização, dum rendimento precário e duma dependência nociva da fontes de produção estrangeira. É consolarlor de facto, sentirmos o progresso realizado, mas não tão grande, contudo, que nos tire ainda de consumos específicos que continuam a ser muito baixos em relação à Europa e ao mundo civilizado. Não creio, devo, porém, dizê-lo que o esforço feito nesta última meia dúzia de anos pudesse ter sido, na realidade, muito maior do que foi; o erro veio um pouco mais de trás.
Mesmo que tenhamos atingido, ou ultrapassado até, no ano que findou os 250 ou 26O KWh/hab.. não pode-mos esquecer que no relatório do Plano de Fomento para 1953-1958 se apresentava, além da Espanha como país mais próximo do nosso, a Irlanda, com 247 kWh/hab. Mas este número referia-se a 1949 e, como sabemos, é lei geralmente verificada a duplicação dos consumos totais de dez em dez anos. Para que valores terão passado agora aqueles que então se referiam há sete anos atrás e se apresentavam de 450 para a Itália, de 598 para a Holanda, de 728 para a França, de 949 para a Bélgica, de 976 para a Inglaterra, de