23 DE ABRIL DE 1960 727
temos de reconhecer que o velho continente perdeu a sua tradicional hegemonia no Mundo e que conheceu no nosso século períodos angustiosos de incertezas e de dificuldades.
Ainda mal refeita de uma primeira guerra, que tão fundas cicatrizes deixara na alma e na economia dos povos, eis que, decorridos pouco mais de vinte anos após o seu termo, um novo cataclismo a abala, com profundas e gravíssimas repercussões em todos os aspectos da vida do Mundo.
Acabou a guerra, mas não se fez a paz; a Leste desceu uma cortina do ferro, que diminuiu a Europa no seu valor político e na sua própria expressão geográfica, e, a Oeste - e separado pelo mar -, um continente novo e progressivo - os Estados Unidos da América- procurava, ante a ameaça crescente do bloco oriental, salvaguardar e defender os princípios essenciais da civilização e da liberdade.
A velha Europa, fonte eterna de energia e de génio, criadora operosa de nações, estava, por si só, impossibilitada de o fazer.
A guerra destruiu valores e riquezas enormes, custou a perda, de mais de 6 milhões de vidas, os gastos orçamentais e os danos materiais subiram a cifras astronómicas e alguns países, como a Grã-Bretanha, tiveram de alienar grande parto dos seus haveres externos para fazer face aos encargos necessários à sua defesa.
A situação de penúria em que ficou o velho continente influenciou directamente o seu comércio e a sua balança de pagamentos, os seus níveis do consumo e de produtividade, as finanças públicas e a moeda.
Um conjunto de nações depauperadas era o melhor veículo para todas as doutrinas de dissolução, e à própria sanidade do grande bloco americano não convinha uma Europa debilitada e que, pela insuficiência da sua produção, penúria de divisas e fracos índices de consumo e de produtividade, viesse a ser afinal, um factor constante de perturbação.
Havia-se quebrado o ritmo de um circuito monetário que permitia à Europa, com as vendas dos seus produtos acabados, pagar aos países de além-mar as matérias-primas que tinha necessidade de comprar-lhes, e as nações extra-europeias que haviam escapado à destruição dos bombardeamentos encontravam-se em condições de procurar novos rumos de expansão e desenvolvimento.
Ao contrário, muitas das grandes nações europeias, diminuídas na sua riqueza e feridas na sua própria alma, tinham de ser cautelosas, só comprando na medida em que pudessem vender, protegendo e defendendo tenazmente a sua produção para assegurarem, assim, o trabalho e o emprego.
Voltou-se, por isso, aos tratados bilaterais, ao sistema dos contingentes, às práticas discriminatórias, às restrições cambiais o monetárias.
Mas em breve se reconheceu, de um e do outro lado do Atlântico, o como já por mais de uma voz foi escrito e notado, que a melhor solução para fazer face ao desequilíbrio económico europeu não era nem limitar e diminuir as importações, nem recorrer a uma política de alta de preços ou de redução de rendimentos, que só teria como consequência o agravamento do mal-estar geral. Os estadistas mais proeminentes e os economistas mais autorizados todos eram unânimes em preconizar um aumento intensivo da produtividade, isto é, aumento de produção através do menores custos, como indispensável à obtenção de um maior progresso económico e do equilíbrio social indispensável à própria sobrevivência europeia.
O quadro da vida da Europa nos últimos doze anos é dominado por um conjunto de esforços tendentes à criação e ao fortalecimento de instituições destinadas a fomentar a sua reconstrução económica, através de uma larga, política de entendimento e cooperação.
Veio da América o impulso inicial, mas as nações europeias que pagaram a alto preço as suas desavenças e querelas tomaram-no nas mãos e souberam mostrar-se à altura das suas responsabilidades.
Assina-se em 1948 a convenção instituindo a Organização Europeia de Cooperação Económica, quo, antes de tudo, elabora um programa destinado a libertar progressivamente a Europa Ocidental da necessidade da ajuda exterior.
Preconiza-se a estabilidade monetária, o equilíbrio das finanças públicas, o estabelecimento de um regime de pagamentos multilaterais, a intensificação de trocas recíprocas de bens e de serviços.
Mercê de um estorço conjunto e colaborante foi possível a esse organismo de cooperação lançar as bases de uma política do liberalização progressiva de trocas que, apesar das dificuldades e dos retrocessos por vezos verificados, imprimiu uma notável expansão ao comércio europeu e, ao mesmo tempo, permitiu negociar acordos de compensação e pagamentos que levaram, em 1950, à criação dessa vasta câmara de compensação de câmbios que era a União Europeia de Pagamentos e, depois, com o termo desta, ao Acordo Monetário Europeu.
Não é o momento azado para recordar toda a acção decorrida nesse período que vai desde os momentos difíceis do European Recovery Program até às horas mais desafogadas em que a maior parto das nações do Ocidente europeu pôde regressar a um sistema condicionado de convertibilidade monetária.
E seja-nos licito fazer um parêntesis nas nossas considerações. Quando se lêem as numerosíssimas publicações sobre economia europeia posterior à guerra, os estudos de teóricos e mestres, as conclusões de técnicos e peritos, os votos das conferências, os relatórios da banca, todos são unanimes em afirmar a impossibilidade de as nações europeias encontrarem formas razoáveis de estabilidade económica e social enquanto não se adoptarem determinadas regras de sanidade financeira e monetária. E quando se lêem os conselhos sobre o equilíbrio dos gastos públicos, o combate à, inflação, à função da dívida flutuante, ao papel emissor dos bancos centrais, grande orgulho devemos sentir em pertencermos a um país que se manteve inalteravelmente fiel às boas regras da gestão financeira, realizando uma obra que o impôs ao respeito alheio. Mercê disso, nunca fomos elemento de perturbação nas organizações internacionais, estivemos sempre na primeira linha das liberalizações das trocas e dos pagamentos.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - E há pouco mais de um ano, e quando muitas nações europeias voltaram à convertibilidade, embora condicionada, da moeda, pudemos aderir facilmente às fórmulas adoptadas, não só para evitar os vícios e as pressões especulativas inerentes à inconvertibilidade, mas também por estar assegurada a solvabilidade exterior da nossa moeda e haver necessidade de manter a confiança há muito e solidamente ganha pelo escudo nos mercados internacionais.
Sr. Presidente: a política de cooperação europeia deu frutuosos resultados. Entre 1948 e 1954 dobrou o movimento de trocas entre as nações que faziam parte da O. E. C. E. e melhorou sensivelmente o seu comércio com os outros países do Mundo. No mesmo período o déficit comercial europeu foi reduzido para metade, apresentando a balança de pagamentos do conjunto daquelas nações um saldo total positivo da ordem dos 600 milhões de dólares.