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3058 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 123

a definir ou a confirmar as bases gerais por onde elas hão-de ser procuradas, como julgo melhor competir, de modo geral, a esta Câmara, não creio que aqui perturbemos o trabalho de quem tem a responsabilidade de decidir, já que nos guia apenas o desejo de colaborar.
E também o é alargar, por esta forma, à audiência da Nação, um tema de que ela terá por vezes andado arredada e que também por essa razão não terá logrado ainda o desenvolvimento que o Sr. Ministro da Educação Nacional justamente anseia dar-lhe.
Pelo que me respeita, é nessa firme convicção que nele participo, voltando assim, e mais uma vez, a debruçar-me sobre o tema predilecto das minhas bem modestas e desvaliosas intervenções nesta sala.
Como posição prévia a definir, em relação à alínea do anúncio do aviso prévio em que vou demorar-me, hei-de anotar que, em assuntos desta natureza, nos quais me não é lícito dar opinião que não se limite a tocá-los senão em generalidades ao alcance de um profano, o objectivo que julgo primacial na educação é o de colocar o homem, pelo adequado desenvolvimento do seu espírito, na plenitude da sua personalidade.
O homem, pelo simples facto de o ser, traz consigo, como um direito natural, o direito à instrução, o direito de exigir à comunidade que o integra o retire da ignorância, nos precisos termos em que lhe exige o retire da miséria. A justiça social faz-se de pão e de luz - nem só de pão vive o homem.
«Deriva da natureza humana o direito de participar da cultura e, portanto, de receber uma instrução de base e uma formação técnica e profissional conforme o grau de desenvolvimento intelectual de cada comunidade» - ensinou e definiu o Santo Padre João XXIII, na salutar encíclica Pacem in Terris, e o Sr. Presidente do Conselho, como tantas vezes aqui tenho lembrado, proclamava há 30 anos:

Mais longe iremos ainda quando pudermos não só anunciar nos discursos ou inscrever nas leis, mas efectivar na prática, os dois maiores direitos que, em nosso parecer, ao homem podem ser assegurados - o direito ao trabalho e o direito à instrução.

O direito à instrução traduz-se na reivindicação natural das condições indispensáveis ao completo desenvolvimento das potencialidades intelectuais de que Deus tenha dotado cada um dos seus filhos.
A finalidade primeira da instrução aparece assim como a valorização do homem enquanto homem, o seu enriquecimento espiritual, a sua promoção a estádios cada vez mais elevados do entendimento e da compreensão do Mundo e da vida, na maravilhosa e inesgotável riqueza dos problemas que levanta a sua efémera mas gloriosa passagem pela história, na transcendência da sua origem e do seu destino.
Esse objectivo, fundamentalmente espiritualista, é, sem dúvida, o tema maior da educação. Não será, porém, o único.
Como seu corolário imediato, pode sustentar-se que todo o homem, porque vive e se realiza numa sociedade de que a economia é factor essencial, tem o direito de alcançar a plena expressão da sua capacidade, recebendo a formação profissional que lhe permita desenvolvê-la em toda a sua dimensão, como elemento útil nas forças produtivas da comunidade de que é membro.
Daqui se infere ainda que na definição e realização da sua política social cabe ao Estado o dever de aproveitar na sua economia todos os humanos recursos potenciais da Nação, isto é, cabe ao Estado assegurar, pela instrução levada a todos, a formação e o desenvolvimento de quadros profissionais qualificados em todos os misteres - dos mais simples aos mais exigentes e complexos, que de si garantam um volume de riqueza suficiente para as necessidades totais do País.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Numa sociedade como a do nosso tempo, voltada à conquista do bem-estar para todos, em que tamanha influência detém o espírito humano evoluído, logo se alcança a primordial função do ensino profissional, visto agora não como simples aprendizado de uma arte ou de um ofício, mas como aquisição de uma cultura e de uma formação de base que, precisamente por ser científica, permita compreender, na sua natureza e finalidade de simples meio, a acção técnica e permita que a capacidade de trabalho de cada qual se desloque de um sector para outro sem grave embaraço. Aí se formou o técnico dentro do homem.
A educação profissional vê-se assim como uma escola de formação polivalente, na qual a cultura e a técnica se ordenam a uma visão humanista da vida, a uma integração do homem como cidadão e trabalhador na sociedade contemporânea.
Esta conclusão nos domínios da teoria comprovam-na os factos por esses continentes além: os países de maior e melhor nível de vida são precisamente os de maior índice de educação e formação profissional; as nações de vida mais modesta, sejam quais forem as suas riquezas naturais, são as de mais fraco desenvolvimento educacional e profissional.
Aliás, é hoje uma verdade aceita sem discussão, é hoje artigo de fé, o decisivo papel da instrução no crescimento económico. Por quantos têm comentado o facto, citarei o Ministro Leite Pinto: «O desenvolvimento económico é um problema de instrução de todos os homens, a vários níveis».
Não vou deter-me agora na análise que consentem os parâmetros da nossa educação quando vista sob o signo de ser dada a todos em vários níveis. Espero poder ainda voltar a este ponto.
O ensino profissional, nos seus diferentes ramos, afigura-se-me a solução mais adequada para ministrar à grande maioria da juventude portuguesa ainda sem instrução secundária a formação cultural e profissional indispensável do homem do nosso tempo.
Mas se assim é, logo ocorre perguntar - pelo que lhe respeita, que situação detemos?
Teremos sido das primeiras nações da Europa a iniciar a sua sistematização, e bem vale apenas recordar o caminho andado desde então.
Sem preocupações de rigor histórico, poderá talvez asseverar-se que o ensino técnico, no seu conceito vulgar, terá começado entre nós, de forma embrionária, é certo, com a Aula do Comércio, criada pelo marquês de Pombal e solenemente inaugurada, em Lisboa, em 12 de Dezembro de 1756, por el-rei D. José I.
A dar consistência e seguimento a tão louvável iniciativa, viria a ser publicado, pouco depois, o alvará de 19 de Maio de 1759, a promulgar a organização do ensino comercial.
No início da segunda metade do século XVIII, Portugal assumia assim o papel de precursor, antecipando-se, por essa forma, a muitas nações do velho mundo, cujos planos de instrução desconheciam ainda o ordenamento daquele ramo de ensino.
Certo é que breve iria fenecer o espírito inovador que nos colocara na senda dos pioneiros.