3618 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 144
Esta atitude, porém, não tem sido extensiva, ao ultramar, onde raramente se exibem as variadas e sempre apreciadas danças regionais do continente, a não ser aquelas que modernizadas ou estilizadas se integram nos programas das revistas de teatro que por vezes nos visitam ou as que, com certo esforço e persistência, algumas associações regionais, como a Casa do Minho em Lourenço Marques, procuram organizar entre os seus associados.
Seria interessante que os verdadeiros e típicos ranchos folclóricos das diferentes províncias do continente pudessem ir, de quando em quando, ao ultramar, levando até lá os seus puros cantares e danças, ao mesmo tempo que de lá trariam algum conhecimento.
Não só agradaria aos nacionais, como também seria um excelente motivo turístico para os estrangeiros.
Quanto ao artesanato, embora alguns Srs. Deputados, entre os quais mais largamente o Prof. Nunes de Oliveira, já se tenham dele ocupado neste aviso prévio, não deixarei de tecer também acerca dele algumas considerações.
É o artesanato um património cultural que se vai a pouco e pouco perdendo pelo desaparecimento das pessoas idosas que o transmitiam aos mais novos, que hoje, mercê das influências citadinas, do incremento da indústria e ainda da própria educação, o vão abandonando e menosprezando.
Há, portanto, que preservá-lo, quer pela educação, levando os jovens a praticá-lo, quer ainda estimulando o artesão adulto por meio de uma remuneração justa pelo seu trabalho.
Mas torna-se imprescindível, antes de mais, que se criem não só o gosto, mas uma séria e eficaz divulgação do artesanato, quer entre os nacionais, quer entre os estrangeiros. Ainda que no País alguma coisa se tenha feito nesse sentido, o artesanato em Portugal não atingiu ainda o lugar que de direito lhe compete no turismo português.
A arte popular portuguesa, tão variada e rica nas suas manifestações, não é ainda verdadeiramente conhecida e apreciada. Desde o Minho ao Algarve, da Madeira aos Açores e às províncias ultramarinas se pode observar quanto o País é rico em artesanato, indústria que noutros países tem merecido tal atenção que se criaram para ela verdadeiros institutos nacionais de artesanato e até mesmo Ministérios de Artesanato. Entre nós, ela encontra-se repartida por vários organismos que vão dando o seu esforço na divulgação das várias manifestações da arte popular, sem que contudo, esta tenha obtido ainda u expansão que merece à escala nacional.
Há que promover uma mais intensa e larga campanha de expansão do artesanato português, problema que está entregue principalmente ao Fundo de Fomento de Exportação e ao S. N. I. Esperemos que estes dois organismos, ao tentarem resolvê-lo, não deixem de ter em conta também o artesanato do ultramar, tão característico e belo nus suas diversas formas, mas que é ainda hoje quase desconhecido na metrópole por não ter sido devidamente aproveitado. No entanto, é avidamente procurado pelos estrangeiros que visitam o ultramar.
O importante e valioso papel da mulher no artesanato, constituindo o seu contributo a mais poderosa mão-de-obra, não pode deixar também de merecer a nossa atenção.
O artesanato feminino é, muitas vezes, constituído por trabalhos que, em algumas aldeias e vilas, as mulheres fazem em casa, em pequenos intervalos, enquanto a panela ferve ao lume e as demais lides domésticas o permitem. E um trabalho quase maquinal, feito com os mesmos gestos das gerações passadas e com o apego que toda a mulher rural põe nas ocupações caseiras.
É uma indústria simples, que vai desde a tecelagem manual, em rústicos teares, aos palitos trabalhados, às mantas de retalhos e outros, e que merece ser devidamente amparada, pois que, além de ser uma pequena fonte de receita na parca vida económica do lar rural, é também um motivo de atracção turística para o estrangeiro que, vindo de países altamente industrializados, encontra nestes artefactos regionais uma típica e curiosa lembrança do País, na pureza e simplicidade das suas tradições.
A Obra das Mães pela Educação Nacional mantém, pelo País, centros de educação familiar rural onde as raparigas rurais aprendem com as mestras os trabalhos característicos das suas regiões. E uma louvável iniciativa que merece ser apoiada na medida em que esse ensino contribui para preservar o cunho artístico acentuadamente regional e português desses trabalhos, pois que, no artesanato, há que defender a autenticidade no aspecto artístico, ainda que, em muitos artefactos, o aspecto tecnológico deva ser modificado ou melhorado.
Tanto os trabalhos caseiros como os que são feitos sob a orientação de mestras deveriam ser garantidos, de qualquer maneira, na sua qualidade e autenticidade para que ganhassem a confiança do turista. Também a essas mulheres e raparigas que se dedicam aos trabalhos de artesanato deveria ser-lhes facilitada a matéria-prima ou os produtos necessários k sua manufactura, como, por exemplo, as anuirias, assegurando-se-lhes também & colocação .dos seus produtos, o que seria um estímulo.
Para um maior desenvolvimento do artesanato rural seria de desejar a criação de pequenas exposições de carácter permanente nos principais centros turísticos das diferentes regiões onde os próprios artífices fizessem demonstrações do seu trabalho, o que, certamente, atrairia a curiosidade do turista e despertaria o interesse em adquiri-los.
Qualquer que seja o organismo que se venha u ocupar do artesanato u escala nacional, não poderá deixar de atender e receber a cooperação dos organismos locais e regionais.
Para essa cooperação e coordenação muito poderão contribuir as Casas do Povo.
No ultramar torna-se necessário criar escolas ou centros regionais de artesanato que encaminhem as raparigas e os rapazes para esse género de trabalhos e orientem os adultos na sua primitiva arte sem que, contudo, lhes tirem a sua característica feição africana. São obras de madeira, de pau-preto, de marfim, de missangas ou de palha, facilmente vendáveis e, como já disse, muito procuradas e apreciadas pelos estrangeiros.
Seria interessante e oportuno que se promovesse um intercâmbio folclórico e artesanal entre a metrópole e o ultramar, o que muito contribuiria paru um melhor conhecimento da arte popular portuguesa em toda a sua dimensão.
Para terminar, apraz-me registar perante a Câmara que há dias aportou a Lourenço Marques o grande transatlântico Brasil, levando em cruzeiro de férias por portos da América do Sul, África, Mediterrâneo e Europa muitos turistas norte-americanos (segundo os jornais, 406 milionários), que tiveram a oportunidade de visitar a capital de Moçambique e foram até ao Kruger Park, ria África do Sul. Haverá que preparar os motivos e recordações que os turistas possam desfrutar e guardar numa curta estada ou passagem pela província. Além da Namaacha. a que já me .referi, temos a pouca distância da cidade a Catembe e a ilha da Inhaca. Esta última, á entrada da baía de. Lourenço Marques, com uma área de 45 km2, oferece, pela localização, clima e recursos naturais, as melhores condições para o turismo. Bastaria que aí