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21 DE MARÇO DE 1964 3765

e o caminho de ferro. Há tudo à roda, para dali se governar e fazer Moçambique, pelo que a província aguarda esta decisão corajosa, que é a única capaz de galvanizar as esperanças e realizar os sonhos daquela gente portentosa do Norte, tão carecida de amparo quanto farta de palavras.
Outro problema, com incidência gravosa nas contas, diz respeito à economia dos serviços públicos, isto é, à sua organização, funcionamento e aproveitamento. Não direi que para 7 milhões de habitantes haja na província funcionários a mais, mas para os milhões que utilizam marginalmente os serviços da Administração há decerto um excesso de burocracia. Em compensação, faltam quadros técnicos, na saúde, na instrução, na agricultura, na veterinária e na agrimensura para assistência directa, imediata e eficaz à população. Bem sei que o mal é mundial, mas com esse mal dos outros podemos nós. O nosso é que precisa remédio. Esperemos que o Governo saiba tirar o conveniente partido da restauração das secretarias provinciais, acabar com a pulverização de serviços e a multiplicação de dirigentes. Uma secretaria provincial é uma unidade funcional de serviços em que o secretário provincial estabelece a conexão entre os interesses políticos e as formas técnicas.
Uma das situações mais inquietantes respeita aos serviços de agricultura e veterinária, que estão num impasse comprometedor, tão comprometedor que o Sr. Eng.º Araújo Correia se limita a assinalar que os serviços de agricultura despenderam 25 676 contos, mais 30 do que em 1961. Mais adiante, aludindo ao papel preponderante da pecuária, agricultura e florestas, escreve, como toda a gente pensa, que "o problema que se pode dizer fundamental consiste em estabelecer métodos práticos de assistência técnica ao indígena, que ainda hoje pratica exploração rudimentar". De facto, é inadiável conduzir a agricultura indígena a fornecer rendosos excedentes ao mercado e integrá-la num vivo circuito capitalista.
Quanto à pecuária, o nosso ilustre Deputado Manuel João Correia, que tanto quer a Moçambique e à sua gente, não deixará por certo de actuar na Cooperativa dos Criadores de Gado, onde, pelos seus altos merecimentos, tem lugar de relevo, no sentido de nela se integrar o criador indígena, com todas as vantagens que daí advirão para a província, os criadores, a cooperativa com seu comércio e indústria e o convívio das pessoas e dos interesses, que é uma necessária força de estabilidade. Não há bem que se não consiga quando se quer, e a hora exige que as actividades privadas exerçam em África uma acção pública.

O Sr. Manuel João Correia: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faz favor.

O Sr. Manuel João Correia: - Não se pode integrar aquilo que não existe. Não há indígenas em Moçambique.

O Orador: - É um termo técnico.

O Sr. Manuel João Correia: - Mas, volto a dizer, não há indígenas em Moçambique e todos podem ser sócios da cooperativa.

O Orador: - Está certo, mas V. Ex.ª sabe que há que se fazer um esforço no sentido de os fazer integrar.
Uma das instantes necessidades de Moçambique é dar à província uma forma agrária que não tem. A primeira coisa a fazer para, isso, penso eu, é o povoamento rural com base na definição da propriedade privada. Como se sabe, no regime de indigenato, legalmente extinto em 1961, dispunham os indígenas de reservas agrárias que podiam cultivar livremente, e faziam-no muitas vezes em cultura itinerante. A itinerância agrícola não resulta apenas das técnicas rudimentares, porque é também fruto de factores psicológicos e religiosos. De qualquer forma, os direitos da cidadania impõem ao cidadão um comportamento e uma actividade disciplinados segundo regras, sob pena de se cair no choque desordenado dos interesses e das pessoas. No indigenato podia haver a propriedade pela ocupação momentânea; fora dele a propriedade tem de ser fixa e permanente, hereditária, e desempenhar a sua função social, económica e pública de valor.
Há, portanto, que repartir fixamente a terra em Moçambique, e aproveitar o ensejo para instituir o casal de família, a actividade comunitária, o crédito rural, os aglomerados urbanos e a economia de mercado. Pode partir-se de pequenos reajustamentos, em planeamentos regionais, com "pequenos esquemas de produção para o consumo interno nos moldes de alguns que parece terem produzido bons resultados", como recomenda o Sr. Eng.0 Araújo Correia.
Não fazer isto a tempo, e já, é deixar ao futuro um problema de terras, de consequências imprevisíveis. As dificuldades serão naturalmente maiores no litoral e em pequenas zonas valorizadas pelas culturas de exportação introduzidas pelos antigos colonos a partir do século XVII. Ligado a este problema está o do povoamento intercalar sistemático do território, a partir do litoral para o interior, segundo linhas de circulação e penetração económica. O caminho de ferro de Moçambique em direcção a Vila Cabral é desde já uma faixa à espera de gente e de actividades, que devem escalonar-se a partir da costa e infiltrar-se para ambos os lados. Há na província várias linhas de penetração a aproveitar que podem servir a diversos planeamentos regionais. O que não pode fazer-se é a execução de planeamentos interiores sem uma continuidade de apoio e de ligação a partir do litoral. A Angónia isolada é inviável, como Vila Cabral isolada também o é.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Tudo isto pressupõe, claro, comunicações básicas e transportes económicos, e, portanto, apenas algumas estradas asfálticas de penetração que tornem baratos os transportes. Que eu me recorde, o Governo não nos tem dito nada mais sobre política de transportes, senão que quer fazer estradas e pontes. Notam-se nos números das contas públicas esforços louváveis nesse sentido, e diga-se que o problema é de tal monta que bastará a construção de1 algumas estradas capitais para poder baixar de uns 20 por cento, pelo menos, o preço da vida corrente no interior mais afastado do litoral. Insere-se aqui o delicado problema das tarifas do caminho de ferro de Moçambique, que, além de servir bastante mal, como eu próprio verifiquei, serve caro, isto é, serve a preços que os produtos não comportam para colocação em distantíssimos mercados. Mesmo assim o prejuízo da exploração é grande.
Quanto aos fretes marítimos, há também na província um clamor geral, e estou certo de que, para beneficiar a economia do Norte, ou o Estado terá de fazer baixar os fretes à custa dos impostos gerais, no caso de neles não haver contas de grande capitão, ou terá de centralizar a cabotagem em Nacala e na Beira, para não terem os pequenos navios, que demandam pequenos portos mal