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5 DE DEZEMBRO DE 1964 4031

E o outro é o de que a carne em Portugal vai deixando de ser o que longamente foi, e se a tornava mais barata também a tornava pior: um subproduto da lavoura, pois o abastecimento dos talhos baseava-se nos bois abatidos aos efectivos de trabalho, bois velhos e cansados, de carne magra e dura, mas de preço acessível.

Se a lavoura europeia moderna tende a ser, ao contrário, um subproduto da pecuária, novos riscos ameaçam esta, todavia. Praticada em grande parte em explorações familiares, o trabalho fatigante, monótomo e inevitável do trato do gado encontra cada vez maiores repugnâncias, pois não concede feriados nem consente descansos; e assim, gradualmente, os efectivos vão diminuindo, sem compensação bastante nas estabulações cada vez mais automatizadas das explorações maiores.

O Sr. Pinto de Mesquita: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faz favor.

O Sr. Pinto de Mesquita: - Era só para dizer que as carnes nessas condições terão de ser mais caras naturalmente.

O Orador: - Digo que elas são mais baratas artificialmente.

O Sr. Pinto de Mesquita: - Diz indirectamente a mesma coisa.

O Orador: - Destarte, a carne tende a escassear no Mundo e a encarecer; e são os próprios progressos da vida moderna, tão frequentemente vencida nos combates com a biologia, que reforçam a tendência.

Bom será assim que façamos fomento pecuário; mas, atenção! Se não fizermos a política desse fomento, tanto valerá inscrever nos programas 290 000 tontos como 290 réis.

Ninguém criará gado para perder dinheiro, e os preços vigentes internamente não oferecem outra promessa. Olhai, olhai só a crise do leite; quem me dera poder não ter acertado no anúncio que desta fiz a VV. Ex.ª ainda há dois anos!

Que se fez nos últimos tempos, quando as condições psicológicas e a própria elevação do nível de vida tinham tornado a conjuntura adequada à actualização dos preços nacionais? Pois continuou a mandar-se vir carne do estrangeiro como sempre, mas, novidade, pegou-se nela também como arma para, em apoio da Intendência-Geral dos Abastecimentos, por esse País além atacar a hidra da valorização da carne onde quer que levantava cabeça.

De há um ano a esta parte importaram-se d« América do Sul, da Inglaterra e da França quase 9000 t de carne. Salvos uns carregamentos, mais baratos, ao que se diz, por haverem sido rejeitados pela França (este país exporta e importa ao sabor das possibilidades e das conveniências, mas cada vez o saldo é menor, se não se tornou já negativo), que suspeitou de febre aftosa nos animais, esta carne chega-nos cá a preços tais que, para a venda em Lisboa, o Fundo de Abastecimento teve de pôr de seu 7$37 por quilo, aproximadamente, até Maio último, e depois, em vista da elevação dos preços para o público, cerca de 5$ Tudo a carne para fora acrescem as despesas de transporte e outras. Pois, daquelas 90001, ficaram cerca de 8COO t em Lisboa, Porto, Cascais e Oeiras; o resto foi distribuído por 34 localidades, em partidas que chegaram a ser tão mínimas, como 54 kg para Gondomar ou 51 kg para Aguiar da Beira - quanto terão sido encarecidas pelas despesas sobre remessas tão pequenas! - decerto para figurarem simulacros de abastecimento em apoio à acção das fiscalizações de preços.

Assim se desmoralizou a produção nacional, e continua duvidoso o .abastecimento com produto externo.

Ë uma política, não estou hoje aqui para a discutir em si; mas o Governo e o País têm de decidir se é esta que preferem, para então mandarem riscar dos programas de fomento os 290 000 contos que lá se tornarão inúteis.

Fico-me, Sr. Presidente, por esta nota, que, parecendo .porventura incidental, ilustra um bom tema de conclusão.

Esforcei-me, ao longo de todas estas considerações, por encarar os problemas agrícolas somente em termos de fomento; procurei não me repetir, aludindo a dificuldades que tenho por de mais sabidas, senão no mínimo indispensável para no ressalto tirar alguma conclusão pertinente ao Plano e aos seus caminhos e processos; procurei mais ainda: não me servir da oportunidade para retomar teses já afirmadas sabre a política das preços, de que me é sempre doloroso falar, para perturbar os governantes que a sustentam e os consumidores que a aproveitam.

Mas é de primeira evidência- que todo o fomento económico, para teu- sentido e dar resultado, pressupõe a produção de bens ou serviços em condições remuneradoras, isto é tais que o valor do produto exceda o do trabalho e matérias-primas aplicados. De outro modo alguém ou alguma coisa há-de ficar diminuído para cobrir a diferença, e o fomento perder-se-á em efeito negativo.

Se a produção agrícola não puder processar-se nessas condições remuneradoras, faltará o estímulo para a continuar e dissipar-se-ão o capital dos empresários ou os dinheiros, da comunidade em suporte dos prejuízos.

Não consta do projecto de- Plano o exame do equilíbrio mais desejável entre as duas alternativas, nem das declarações governamentais outra coisa do que a admissão de providências de circunstância para as equilibrar ao sabor dos acontecimentos.

Mas é claro que mas condições de quase serviço público, ou de actividade dominada, em que vive a agricultura, não importará menos ao seu fomento a política dos preços do que a dos investimentos, e que aquela pode anular os frutos desta.

Que isto nunca esqueça é o meu voto final.

Tenho dito.

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Agostinho Gomes: - Sr. Presidente: Os malditos «ventos da história» têm varrido, nestes últimos dias, os vastos territórios do Congo ex-belga em rajadas de furacão, ceifando vidas, mutilando corpos, aviltando almas.

Os relatos que nos chegam, através das agências noticiosas, dessa tragédia imensa, são dolorosamente suficientes para mais uma vez reconhecermos, ou antes, reconhecerem os povos ainda não desprovidos, por completo, da consciência dos valores espirituais da civilização em que vivemos, que Portugal tem soberana razão na sua firmeza tenaz de impedir que tais ventos rasguem caminho por territórios da Pátria.

Estamos em África a defender dos assaltos, que de fora nos vêm, o que nosso é, mas igualmente defendemos os próprios interesses das populações africanas. Somos realistas para nós, sem deixarmos de o ser também para os outros. Aqueles que agarrados a ideais de utopia, incons-