15 DE DEZEMBRO DE 1964 4183
da habitação e estabelecer com ele um programa geral de construção de casas de diversas modalidades, em que a Previdência poderia ter acção útil, dados os seus recursos financeiros e a circunstância de, com a sua intervenção, se tornar possível uma planificação mais generalizada, com todas as vantagens que daí derivariam: ajustamento equilibrado das rendas e prestações mensais das casas dos vários regimes; conciliação dos critérios da atribuição das moradias; compensação de encargos entre todos os agrupamentos de fogos das diversas modalidades; distribuição das famílias de modo mais natural e conveniente; redução dos dispêndios e responsabilidades para o Estado e para o Município ...
O esforço, repito, é, apesar disto, notabilíssimo. Bem merecem, pois, do Porto e do País os homens que a tornaram realidade, entre os quais é de justiça salientar os nomes do Ministro Arantes e Oliveira e do Eng.º José Machado Vaz.
O Sr. António Santos da Cunha: -Muito bem!
O Orador: - De resto, as lições dela decorrentes foram preciosas, em especial no que respeita a Lisboa. Defendi, em tempos, que à Previdência fosse consentido cooperar na solução do problema da habitação da capital, finalidade a que ela se dispunha afectar mais de 1 milhão de contos. Para tanto seria indispensável conceder às caixas interessadas na construção de milhares de moradias, sobretudo no Restelo e nos Olivais, grandes facilidades para aquisição de terrenos. Isto permitiria, na verdade, larga aplicação, também em Lisboa e seus subúrbios, do princípio da compensação de rendas entre as diferentes classes e tipos de casas, embora para o efeito tivesse de partir-se de uma programação muito vasta a executar em curto, espaço de tempo. Ó mérito desta solução estaria não apenas no contributo para o desaparecimento das "barracas", mas, sobretudo, na possibilidade de destruição daquilo a que já se chamou "espírito de barraca" ou de "ilha" - que é o próprio espírito de segregação social.
Vozes: -Muito bem !
O Orador: - Bem eloquente e desoladora é a lição dos factos! Alguns bairros destinados às classes pobres, apesar de erguidos há poucos anos, constituem já clara demonstração de que não basta construir casas para que as questões sociais e morais da habitação se resolvam. Transferir as famílias que vivem em precárias condições de alojamento para casas higiénicas e arejadas é, sem dúvida, obra meritória. Se, todavia, com essa mudança se transplanta uma mentalidade gerada em anos de segregação, então teremos casas mais decentes e apresentáveis, mas, na essência das coisas e no fundo das almas, elas continuarão a ser, em extensão ou em altura, abrigo de vidas em penumbra, quê nem talvez uma intensa acção educativa seja capaz de melhorar.
Em vez de famílias, estratificadas por grupos sociais, há que propiciar a instalação de famílias em ambientes caracterizados por um nível razoável de educação e por uma estrutura favorável à convivência na diversidade das classes.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Alcance social do plano habitacional para Lisboa estabelecido em 18 de Agosto de 1954 e das providencias legislativas, de 27 de Abril de 1960, sobre a construção de casas para os servidores do Estado.-Esta ideia haveria de coincidir, em grande parte, com o espírito do Decreto-Lei n.º 42 454, de 18 de Agosto de 1959, cuja elaboração interessou vivamente o Sr. Presidente do Conselho e também o Sr. Ministro da Presidência de então, Dr. Teotónio Pereira.
Conjugando todos os recursos disponíveis para o investimento em habitações, este decreto-lei visou a criação de novas unidades urbanas integradas no planeamento geral da cidade, através das quais se executaria vasto plano de acção social, se estabeleceriam condições mais apropriadas para orientar a fixação das famílias vindas da província e se minorariam os males do urbanismo.
Importa agora referir a publicação do importante Decreto-Lei n.º 42951, de 27 de Abril de 1960, relativo à aplicação das reservas da Caixa Nacional de Previdência na resolução do problema do alojamento dos funcionários do Estado e dos corpos administrativos. Através deste diploma, criou-se o condicionalismo indispensável à concretização das realizações enunciadas na Lei n.º 2090, de 21 de Dezembro de 1957, possibilitando-se tanto a compra como a edificação de casas para funcionários, na dupla modalidade de arrendamento e de propriedade resolúvel.
Este decreto-lei, que se deve à nobre clarividência do Ministro Pinto Barbosa, tem de ser saudado, pelas suas altas finalidades sociais e pelas perspectivas que veio rasgar, como marco notável no domínio da protecção aos servidores públicos, sem prejuízo de se discordar de alguns métodos que perfilhou.
Penso que se vai aproximando a altura de proceder ao exame dos efeitos dos dois diplomas (Decretos-Leis n.º 42 544 e 42 951) e de aproveitar, com vista a uma revisão legislativa, os ensinamentos recolhidos. Da minha parte, atrevo-me a exprimir algumas dúvidas, as quais, por certo, não serão mal interpretadas, visto partirem de quem se honra de ter oferecido devotado, se bem que modesto, contributo para a sua preparação, especialmente do primeiro daqueles diplomas.
Seria, por exemplo, conveniente se preenchesse a lacuna resultante de não se ter previsto, no Decreto-Lei n.º 42 544, a possibilidade de os terrenos das novas áreas urbanizadas serem reservados para a edificação de moradias no regime de empréstimos da Lei n.º 2092, de 9 de Abril de 1958.
A atribuição de tais terrenos poderia ser feita pelo competente Ministério, de harmonia com os critérios em vigor para a atribuição de casas económicas. Completar-se-ia, assim, o preceituado no artigo 31.º do Decreto-Lei n.º 44 645, de 25 de Outubro de 1962, segundo o qual os beneficiários que pretendam construir casas ao abrigo daquela lei poderão adquirir terrenos directamente às câmaras ou às juntas de freguesia, sem dependência de hasta pública.
Note-se que entre as modalidades adoptadas para a zona dos Olivais figuram, predominante ou exclusivamente, aquelas em que a intervenção dos moradores se verifica apenas no momento de se proceder à atribuição das casas. Ora os empréstimos para a auto-construção asseguram uma mais larga independência e colocam mais directamente os interessados em contacto com a resolução do seu próprio problema. Este sistema de crédito imobiliário supera, em todos os seus aspectos, o dos bairros, agrupamentos ou blocos residenciais do Estado, ou de quaisquer outros organismos ou instituições, precisamente porque afasta as complicações administrativas, poupa esforços e dispêndios às entidades oficiais e propicia maior interesse e amor da família pela sua casa - sua verdadeiramente, porque erguida, desde os alicerces, com a sua intervenção.