18 DE MASCO DE 1965 4553
prazos da Zambézia, depois transformado no latifúndio de plantação e comércio, nos fins do século passado, ainda existente e radicado, e de que as últimas concessionárias algodoeiras serão até 30 de Junho deste ano o último detestável rebento, e a tendência geral para um espírito de estabilização e cristalização das situações sociais e económicas criadas e existentes devido às comodidades financeiras que os serviços transitários para o exterior têm oferecido à Administração, ao grande Comércio importador e ao pequeno comércio retalhista.
Trata-se de uma cadeia de actividades seguras e sem isco, com os pagamentos externos garantidos pelas divisas que entram, da exportação, da emigração e dos serviços de transportes. São os dois últimos rendimentos que garantem à província o seu clássico desafogo em coberturas externas. Nos áureos tempos do ouro, eram as pistas de Sena, o marfim e os escravos que aguentavam a vida económica da província. Desde os fins do século passado são os caminhos de ferro, os emigrantes para o Rand e a Rodésia, e os chamados génios coloniais, inicialmente apenas de Quelimane, e agora também de Moçambique, Porto Amélia e Inhambane, em especial.
A agricultura de povoamento tem sido um malogro, ou mais exactamente uma aventura em que só se metem os lunáticos.
O pior é que se não vê jeito de modificar a situação, e por isso Moçambique é uma província despovoada de brancos, que são por excelência os transformadores da vida social, os impulsionadores da vida económica os únicos agentes possíveis do progresso do Negro. É dogmático que sem brancos o Negro não evolui em África porque não tem a escola da iniciativa, capital acumulado em técnica adquirida para a produção e o comércio da produção, dinheiro líquido ou crédito para o motor económico.
Creio firmemente que se se quer efectivamente fazer progredir o Negro, como se quer, a base de arranque está na expansão acelerada do povoamento europeu misturado e conjugado com o reordenamento agrário do povoamento negro numa organização cooperativa da agricultura e da pecuária com seu crédito eficiente e alguma técnica indispensável, pelo menos alguma elementar orientação técnica e uma eficiente comercialização. O que tudo se consegue a partir do desenvolvimento comunitário, que é um mito em Moçambique, e com a planificação e execução do povoamento à escala nacional, segundo uma política nacional, como recentemente aqui defendi.
A meu ver está Moçambique numa situação de crise. Não é uma crise disto ou daquilo, mas uma crise geral, uma crise de crescimento, que só pode ser resolvida numa perspectiva de conjunto, por medidas gerais e globais que tornem possível a alteração das estruturas clássicas e arcaicas - as estruturas económicas, as estruturas sociais e as estruturas administrativas. Mas sem nos esquecermos de que se não vira tudo de um dia para o outro nem a província está toda num homogéneo amadurecimento para a alteração de estruturas, pelo que há a necessidade de forçar certas implantações por enquadramento.
Não é avaliável o que seria Moçambique se pudesse estar em relação à vizinhança na posição de Angola em relação ao Congo, e a uma igual distância. Mas decerto entregue a si própria teria hoje outros alicerces.
Assim, apenas Lourenço Marques e a Beira se desenvolveram, e mesmo assim não há paralelo entre a actual dimensão económico-social destes dois pólos, com forças de crescimento internas e próprias, e a que tinham quando dependiam inteiramente ou quase do Interland estrangeiro que servem. Por isso temos todos de lamentar que o portentoso distrito da Zambézia (que eu prefiro sempre designar por Quelimane, seu nome tradicional, porque Zambézia é toda a vasta região de um e de outro lado do grande rio) tenha permanecido latifundiário, tenha permanecido em prazos e se não povoasse com pequenas e médias plantações, em vez de quase tudo se reduzir a três ou quatro tentaculares empresas de tipo classicamente colonial e detestável. Era o que há 76 anos queria fazer o grande Augusto de Castilho. Talvez houvesse hoje um autêntico porto em Quelimane e também uma autêntica cidade em Quelimane.
A interdependência das várias perspectivas é iniludível. Sem povoamento branco a persistência de economia colonial de grande plantação é um facto irremovível, e os caminhos de ferro continuarão a ser o cancro de Moçambique, porque a província vive essencialmente deles e para eles. Donde resulta que fazer vingar qualquer coisa diferente é heroicamente trágico e tão impossível de realizar como simples de conceber.
A mentalidade estreita com que tem sido conduzida a vida económico-social de Moçambique está patente na inconstância das soluções para o problema das comunicações anteriormente à recente prevalência das estradas, nos casos típicos das linhas férreas de Quelimane e de Moçambique. Nunca houve uma lúcida política de transportes porque faltaram as pressões do povoamento, da agricultura e das minas. Ainda sou do tempo em que Moçambique era apenas a orla do litoral. No entanto, já no actual regime houve dinheiro em Moçambique para uma vasta obra de fomento e povoamento que se não fez em tempo.
A falta de visão é patente, por exemplo, na carência de povoamento ao longo da linha de Moçambique.
A falta de iniciativa na província é de facto enorme, mas isso deve-se a um tipo de mentalidade arreigada e secular, de que já falei, aos defeitos consideráveis da rede de comercialização dos produtos na mão de meia dúzia de exportadores poderosos que também são produtores ou formam cartel, e ao regime de quase-monopólio em que se encontra o crédito, e que é um monopólio de facto nas mãos do Banco Ultramarino.
A província debate-se com problemas graves que resultam, a meu ver, desta complexa fase de passagem em que se encontra, caracterizada pela abolição da sociedade colonial que não desapareceu, evidentemente, do dia 6 para o dia 7 de Setembro de 1961, da abolição da economia colonial, que também não desapareceu com o novo Código do Trabalho, da abolição da administração colonial, que também não desapareceu com os inoperantes retoques que se deram na lei orgânica. De facto, em Moçambique tudo continuou como se as medidas legislativas decretadas pela metrópole tivessem sido tomadas para inglês ver.
Atitude tanto mais cómoda quanto é certo que está absolutamente assente em Moçambique que na província não há dinheiro para nada e portanto nada se pode fazer enquanto a metrópole não mandar para lá alguns bons milhões, ou aparecerem os investidores com eles no bolso.
Arrancar o dinheiro da terra, desenvolver a agricultura indígena, dar a terra a quem a cultive, estruturar a propriedade indígena em regime de propriedade perfeita e tributá-la, pagar bem, comprar a pronto, são coisas que Moçambique considera os impossíveis trabalhos de Hércules, que se vão fazendo, mas lentamente de mais.
Moçambique continua muito confiada no advento messiânico dos capitais estrangeiros. Embora me pareça que são mais as vozes do que as nozes, e conheça casos de capitais volantes que foram recusados por comportarem encargos impossíveis, parece haver de facto grandes ofertas e existirem já grandes entradas ou pelo menos grandes contractos nesse sentido. É decerto pela minha deficiente