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758-(34) DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 42

incumbe provar a culpa do autor da lesão (artigos 483.º e 487.º).

Prevê, tcdavia, casos de responsabilidade subjectiva em que o lesado está dispensado do ónus de provar a culpa do agente, cabendo antes a este o encargo da prova de que empregou todas as diligências e cautelas exigidas pelas circunstâncias com o fim de prevenir o dano. São justamente os casos de danos causados por coisas perigosas ou relativamente às quais haja o dever de custódia ou por actividades perigosas.

Preceitua, com efeito, o artigo 494.º:

1. Quem tiver em seu poder coisa móvel ou imóvel, com o dever de a vigiar e adoptar em relação a ela as cautelas convenientes, responde pelos danos que a coisa causar, salvo se provar que nenhuma culpa teve no acidente ou, sendo a coisa perigosa, que empregou todas as cautelas exigidas pelas circunstâncias paia evitar os danos causados.

2. Quem causar dano a ou trem no exercício de uma actividade, perigosa por sua própria natureza ou pela natureza dos meios utilizados, é obrigado a repará-lo, .excepto se mostrar que empregou todas as providências exigidas pelas circunstâncias com o fim de o prevenir.

Quer dizer: nos casos contemplados nesta disposição, estabelece-se a inversão ao ónus da prova, na orientação do direito italiano, acompanhada de uma ampliação do conteúdo de dever de diligência, exigindo um grau de diligência superior ao da média ordinária (10º).

O lesado terá de provar apenas o nexo causal entre o prejuízo e a actividade do agente.

Não se vai ainda para a responsabilidade objectiva, adoptando-se uma solução intermédia - responsabilidade subjectiva, com inversão do ónus da prova.

A razão está em que nas hipóteses referidas o perigo que as coisas ou actividades representam para terceiros não é sempre acompanhado de uma vantagem especial de quem as guarda ou as exerce, pelo que seria excessiva uma responsabilidade objectiva, devendo tão-sòmente presumir-se a culpa do agente.

Ao lado da responsabilidade subjectiva, o projecto definitivo do Código Civil prevê casos de responsabilidade objectiva ou pelo risco (artigos 501.º e seguintes), entre os quais estão os danos causados por animais (101).

Preceitua D artigo 502.º:

1. Quem no seu próprio interesse utilizar quaisquer animais responde pelos danos que eles causarem, desde que os danos resultem do perigo especial que envolve a sua utilização.

2. Responde também pelos danos que os animais venham a causar aquele que assumiu o encargo da sua vigilância, salvo se provar que não houve culpa da sua parte.

O projecto do Código Civil não prevê, em especial, a responsabilidade civil pelo exercício da caça, tendo sido intenção do legislador submetê-la ao regime geral sobre tal matéria.

Isso poderá concluir-se de vários passos dos trabalhos preparatórios do novo Código Civil (102).

E, na verdade, pode pensar-se não serem necessários preceitos especiais para a responsabilidade em causa, dado que o regime geral poderá reputar-se suficiente (105).

Com efeito, o perigo mais relevante do exercício da caça está na utilização das armas de fogo. Mas o seu emprego, já porque constitui uma actividade perigosa, já porque elas são em si mesmas coisas perigosas, está previsto no transcrito artigo 494.º do projecto, pelo que os danos dele resultantes caem dentro do regime de inversão do ónus da prova.

Quanto aos danos causados pelos animais de que o caçador se serve, a responsabilidade correspondente será objectiva, nos termos do também transcrito artigo 502.º

Por outro lado, o projecto do código prevê a responsabilidade do comitente, independentemente de culpa, pelos danos que o comissário causar, desde que sobre este recaia também a obrigação de indemnizar (artigo 492.º).

Por sua vez, o artigo 491.º prevê a responsabilidade dos pais e outras pessoas encarregadas da vigilância de outrem.

Por outro lado, ainda, os artigos 490.º e 499.º regulam os casos de pluralidade de causadores do dano, estabelecendo a responsabilidade solidária de todos, com direito de regresso entre os responsáveis, e o artigo 500.º regula a prescrição do direito de indemnização.

Em face do exposto, poderia ser-se levado a admitir que o regime consagrado no futuro Código Civil sobre a responsabilidade civil em geral abrange suficientemente a responsabilidade pelos danos de caça.

Todavia, a Câmara, por maioria de votos, propende para que a responsabilidade pelos danos resultantes da caça com arma de fogo deverá reger-se pelos princípios da responsabilidade objectiva, com base no risco.

Por um lado, porque o exercício da caça com arma de fogo é uma actividade extremamente perigosa; por outro lado - e isto é particularmente importante -, porque o caçador obtém com o exercício da caça uma especial satisfação, quando menos de ordem lúdica, que plenamente se deve equiparar a outro qualquer interesse.

Cuida-se, assim, que não haverá matéria em que mais se justifique a responsabilidade objectiva do que a presente, estando ainda a tempo o legislador do novo Código Civil de reconsiderar sobre o problema.

2) Danos da caça

72. Como estruturar a responsabilidade civil resultante dos danos causados pelas espécies cinegéticas de um prédio nos terrenos vizinhos?

No direito romano não havia um direito de indemnização dos danos causados pela caça, pois não havia nele o direito exclusivo de ocupação dos animais bravios, pelo que qualquer pessoa os podia matar, evitando, assim, o dano.

(102) Prof. Vaz Serra, Fundamento da Responsabilidade Civil, separata do n.º 90 do Boletim do Ministério da Justiça, p. 14, 27, 34 e seguintes, e Responsabilidade Civil, separata do n.º 85 do Boletim do Ministério da Justiça, p. 366.

(101) São extensivas aos casos de responsabilidade pelo risco, na parte aplicável e na falta de preceitos legais em contrário, as disposições que regulam a responsabilidade por actos ilícitos (artigo 501.º).

Vaz Serra, Responsabilidade Civil, separata dos n.0" 86-93 do Boletim do Ministério da Justiça, p. 171, e Responsabilidade Civil, separata do n.º 85 do Boletim do Ministério da Justiça, pp. 366 a 371. Neste local referem-se actos do caçador como exemplos de aplicação dos princípios gerais expostos.