848 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 47
a que nos vemos obrigados em face da guerra e fazer face às grandes tarefas que temos na nossa frente e ainda estão longe de serem realizadas: a educação e a cobertura sanitária das populações.
Suponho que os defeitos básicos do elemento humano da nossa economia se encerram em dois, como o grande mandamento: o primeiro é que muita gente não compreende as novas exigências que se criaram nesta irreversível caminhada de progresso e a ela fecha os olhos, e o segundo é que os verdadeiros criadores de riqueza não encontram quem as compreenda. De maneira que os programas que se anunciam e as dificuldades que bem se conhecem, e que dia a dia aumentam em proporções assustadoras, ou não encontram quem lhes veja a solução, ou, se encontram, não têm quem dê apoio efectivo a essa solução. Há queixas quanto à falta de apoio e até de dificuldades postas.
Devemos ser francos: o agricultor, comerciante ou industrial que pretenda sair da rotina, que o mesmo é dizer que procure sair do marasmo, sente logo as pernas peadas ao primeiro passo.
O chamado «apoio oficial» está a traduzir-se em mera figura de oratória, quando não se canaliza por critérios errados, que revelam impreparação e falta de conhecimento das realidades nacionais. Há, certamente, muitos problemas complexos, cujo equacionamento se não poderá fazer com dados inabaláveis e de efeito garantido; é também certo que em muitas actividades a atenção dos responsáveis da coisa pública há-de proceder por via empírica, como se faz nos laboratórios, e de maneira ainda mais acentuada, uma vez que o «doente» aqui tem de viver com aquilo mesmo que se experimenta ...
Tudo isso é assim. Mas o que verdadeiramente mais emperra a iniciativa dos homens de acção é a falta de coragem de quem deve apoiá-los, seja a franquear-lhes o mais possível o terreno que se propõem arrotear, seja a fornecer-lhes meios materiais de efectivarem os seus propósitos.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Ninguém ignora - volto a repetir, como «o fiz na última sessão - que a economia portuguesa atravessa um momento de crise, e parece ter chegado a altura de chamar a atenção do País sobre este facto grave, porque a cada português toca certamente uma parcela na tarefa da recuperação. O consumidor anónimo tem que se inteirar melhor do que deve preferir e da realidade dos seus gastos; o produtor há-de melhorar aquilo que fabrica, conjugando a qualidade e o preço em ordem à expansão, interna e externa, do seu produto, e os governantes terão de vigiar para que o interesse de todos se harmonize, harmonizando-se com o interesse da Nação.
Todo este intróito é feito de referências vagas, porque o número e a complexidade dos problemas assim o impõem. No entanto, resolvi trazer aqui, como exemplo, e apenas a título de exemplo, pois o mal é geral, mais uma vez e aquelas que forem precisas até que providências sejam tomadas, o que se está passando no sector da têxtil algodoeira. E se insisto em voltar a falar desta indústria - como exemplo, noto de novo - é porque, como já aqui disse, conheço todo o drama que ela está vivendo.
Em certa altura, e como é inevitável, a indústria chegou a um ponto que exigia, para sobreviver, que se modernizasse, - e para isso foi solicitada -, e que se modernizasse com a reestruturação da maquinaria e dos processos em ordem a conseguir preços mais baixos e produtos mais rentáveis e de mais fácil colocação no mercado. Ora, como reagiram os industriais nesta encruzilhada?
Uns tantos renunciaram a programas novos e preferiram ficar a envelhecer e a decair, nos seus métodos gastos, nos seus processos estafados, nas suas actividades ultrapassadas. Não quiseram a aventura dos caminhos que a vida lhes indicava, e não tardou que se vissem bloqueados pelo seu próprio imobilismo. Ultrapassados, morreram ou agonizam. Outros tantos lançaram-se, com mais ou menos entusiasmo, no caminho da renovação. Tinham compreendido a hora que se vivia e que se vive. E a hora era que só o reapetrechamento da sua indústria poderia dar-lhes a possibilidade de competirem com as avançadas indústrias congéneres do Mundo e que só essa competição vitoriosa daria, a eles industriais, a necessária compensação e daria ao País a dimensão económica que se aspira. Já referi na última intervenção o despacho do Sr. Ministro da Economia de 8 de Novembro, que reconhece o esforço feito e a necessidade que temos de colocar a têxtil algodoeira em condições de ombrear com os mercados estranhos. Os primeiros, os que renunciaram, não compreenderam; estes segundos, os que lutaram e lutam pela actualização progressiva das suas actividades, compreenderam. No entanto, a pergunta faz-se: estão eles a encontrar quem os compreenda?
Sr. Presidente: Todos devemos pensar bem sèriamente nestes problemas e não desistir de proclamar bem alto a verdade e envidar todos os esforços para que a obra de fomento se não perca, ou em iniciativas condenadas ao malogro, mas às quais muitas vezes, pelo carácter espectacular, se não hesita em conceder apoio maciço, ou empreendimentos que desgraçadamente - eu ia a dizer criminosamente - se deixam estiolar por falta de apoio.
O reapetrechamento de uma indústria desta magnitude e projecção não é geralmente tarefa que se contenha nas possibilidades do empresário, a não ser que ele desfrutasse de privilégios especiais, que, nesse caso, para o locupletarem a ele estariam a empobrecer o País. Exige-se avultado capital que ele não possui. Ora o crédito não se inventou para valer aos aflitos. Criou-se, principalmente, e preferentemente, para estimular os que empreendem, para fomentar a riqueza. Mas neste caso o crédito não acompanhou o programa desses industriais operosos e inteligentes. Se eles não dispunham de elevado capital, também não podiam contar com crédito a longo prazo, tanto nas instituições estaduais como nas instituições privadas. Há que criar novas instituições que possam assegurar crédito a longo prazo eficiente.
E porque é que este sector da indústria portuguesa não terá a ajuda de que precisa nas instituições de crédito? Será que não interessa ao País uma indústria que sempre foi tradicionalmente exportadora? Será que não interessa ao País o fomento de uma indústria que não demanda grandes dispêndios em técnica de fabrico e que está, portanto, dentro das actividades que podem ser acarinhadas pela Administração mesmo dentro de programas de austeridade impostos por circunstâncias anormais da vida nacional? Será que interessa mais ao País o fomento de indústrias que se dedicam exclusivamente ao fabrico de bens de consumo interno? Compreenda quem quiser, e parece que ninguém pode ter dúvidas quanto às respostas a dar a estas perguntas.
Com efeito, meus senhores, os industriais que tiveram a coragem de se reapetrecharem não encontraram apoio financeiro condizente com essa evolução. A banca comercial tinha, e tem, normalmente atingidos os limites da responsabilidade na concessão desse crédito; e os referidos