14 DE DEZEMBRO DE 1966 845
tição e com a sensatez de quem passou já por muito e muitos serviu. E porque assim é, e porque se conta que os próprios Ministros vivem por vezes na angústia da redacção do articulado das leis que têm por - e são - necessárias, as leis saem, sem dúvida, perfeitas na sua forma e claras nas suas intenções, mas vão aplicar-se e falham no pormenor, exactamente porque não foram ouvidas - por falta de confiança ou por inexistentes - as pessoas que poderiam prèviamente ter dito uma palavra de aviso. Também por vezes pode haver excesso de confiança, e não se ouvindo as pessoas que se deveriam ouvir, gera-se nestas um ressentimento natural que é um passo para o seu desinteresse futuro. E assim se vem a cair num círculo vicioso.
Cada um de VV. Ex.ªs terá pressentido e sentido já isto que acabo de dizer, na intenção apenas de chamar a atenção do Governo para a urgência, para além das palavras, da reestruturação dos quadros do funcionalismo público, tendo em vista a organização racional dos serviços, até para maior economia, e o acréscimo da sua produtividade, que se impõe nesta corrida de alinhamento em que estamos empenhados há anos. Eu atrever-me-ia a insistir em menos funcionários e mais bem pagos, com chefes capazes e interessados apenas nas suas funções. Hoje o que se vê é uma multidão de assalariados e no meio deles, esbracejando como perdidos, umas escassas dúzias de funcionários dedicados até ao sacrifício que começam a perguntar-se se vale a pena.
Srs. Deputados: Quando necessito de alguma coisa de qualquer repartição, não peço a ninguém que vá por mim, vou eu mesmo, como qualquer cidadão anónimo, nunca invocando a minha qualidade de Deputado para as prioridades ou para as deferências, e fico-me nas bichas, e sou atendido pelos guichets. Até aqui dentro assim faço. Não falo, pois, de cor, nem carrego nas tintas. Falo pela minha experiência de homem da rua. E também digo que, quando se quer a conclusão urgente de qualquer estudo, se deve dar às pessoas dele encarregadas a possibilidade, a obrigatoriedade de apenas a esse estudo dedicarem as suas horas de trabalho. Constituir comissões com pessoas que têm naturalmente a sua ou as suas ocupações, e sem delas as afastarem para que se possam entregar apenas ao estudo de que as encarregaram, é de início provocar conscientemente demoras, fazer protelar a solução de problemas, que acaba por ser encontrada de afogadilho, quando não é já possível fazer esperar mais, e quase sempre da responsabilidade de um só, daquele que levou mais a sério a incumbência ou mais tempo livre tinha para a ela se dedicar.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: A demora da reforma administrativa está a causar evidentes prejuízos à Nação, e a sua necessidade é tão sentida pelos próprios serviços que nalguns se têm feito, entretanto, reformazinhas que mais acentuam a desorganização. Ouve-se dizer que nem em vinte anos os serviços do Estado se recomporão da sangria a que têm estado a ser sujeitos, com a saída de alguns dos seus funcionários mais qualificados para as empresas privadas. Os serviços foram, para essas empresas, uma espécie de viveiro donde saíram os exemplares mais apetecíveis, mais adultos, mais evoluídos. Reconstituir um viveiro leva muitos anos, exige bons tratadores, e se se exagera na demora do início da tarefa até os bons tratadores desaparecem, para não falar das espécies a criar. Se há estruturas que têm de assentar em pilares sólidos, as que tratam do homem, melhor, as que são feitas de homens, mais necessitam desses pilares, porque os homens não se montam peça a peça, é cada um deles um todo que é necessário educar dê acordo com aptidões e reacções que raramente são as mesmas de indivíduo para indivíduo, em que é necessário criar hábitos - uma das finalidades da educação e não a menos morosa de se conseguir.
E porque assim é, porque as massas humanas se não preparam com a mesma facilidade e rapidez das argamassas, é que outro dos problemas, que sem dúvida tem vindo a merecer do Governo o mais atento cuidado, é o do ensino, «como natural suporte do esforço de crescimento programado e, principalmente, como condição básica do desenvolvimento económico e social da Nação a longo prazo», assim se diz na justificação ao artigo 17.º da proposta. Não bastam, porém, os bem elaborados programas do ensino das várias matérias, nem os bem construídos e bem apetrechados edifícios. «O equipamento escolar constitui, na verdade, necessidade iniludível e nele se tem feito um esforço digno de relevo» - acentua o relatório. O aluno encontra sem dúvida, nas escolas, condições boas de aprendizagem, tem à sua disposição material capaz para aprender, experimentando com as suas próprias mãos. Tem a sua vida rodeada de comodidades, com lares e cantinas, prémios e auxílios, mas não basta. Faltam-lhe professores e mestres. Diz o relatório em apreciação que estudos efectuados no Ministério das Finanças asseguram eficiente impulso à formação e aperfeiçoamento de técnicos, referindo-se ainda a um sistema de estímulos tributários para valorização do capital humano.
Ora, também nesta matéria, importa caminhar depressa. Os apelos das Universidades e dos estabelecimentos de ensino secundário são persistentes e angustiantes. Estão a tornar-se crónicos nas inaugurações dos anos académicos, começam a tornar-se desânimo em liceus ê escolas técnicas. Nestas, se a falta de professores qualificados é notória e perturbadora, a de mestres é verdadeiramente decepcionante, pois não é possível sem mestres capazes preparar para serviço da Nação, para ocorrer ao grande esforço de industrialização que o País está a fazer, os operários necessários e sabedores. O Ministério das Corporações, deitando mão do problema, preparou e impulsionou centros de preparação acelerada de mão-de-obra, para reconversão de muita, mas também para aperfeiçoamento de outra. Mas como será realmente possível prender bons técnicos ao ensino, se a um mestre efectivo de serralharia, electricidade, electromecânica de precisão, fundição ou tecelagem, mecânica de automóveis ou outras especializações se paga o vencimento mensal de 2400$, que corresponde a 80$ diários, agora acrescidos do subsídio de custo de vida, e só ao fim de dez anos se lhe paga mais 500$? E é pagando a um contramestre efectivo, para as mesmas tarefas do mestre, o vencimento de 2000$ mensais que se pretende ter os melhores? Qualquer contínuo de banco ganha isso. Não admira, pois, que ao lado dos 23 contramestres do quadro tenha havido, em 1964-1965, 276 eventuais, na maioria rapazes saídos das escolas, enquanto não encontram caminho melhor, o que dá uma flutuação de permanência indesejável. Em auxiliares de trabalhos manuais e do quadro havia no mesmo ano 14 indivíduos, enquanto os eventuais eram 200. Os trabalhos manuais são uma das bases de pesquisa para os cursos profissionais. Cada auxiliar dos indicados ganha 1500$ mensais, tanto como um contínuo de 1.ª classe das mesmas escolas.
Isto é verdadeiramente deprimente e quanto se não faça para o melhorar, como investimento, embora a longo prazo, altamente reprodutivo, é largamente contribuir para aquilo que todos não desejamos - o colapso da nossa industrialização por falta de mão-de-obra qualificada. Os alunos das nossas escolas técnicas, apesar dos belos edifícios e dos bem fornecidos parques de maquinaria, não