O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

6 DE MARÇO DE 1969 3367

trabalhar com percentagens superiores e calculadas com base no preço de venda?
Como deverão, pois, proceder os mesmos comerciantes com as restantes despesas a que também são obrigados para o exercício normal da sua actividade, como as de armazenagem, mostruário, publicidade, embalagens, portes, cobranças, impressos, material de consumo corrente, correios, telégrafos, telefones, seguros, água, electricidade, conservação, expediente, rendas, remunerações a pessoal, financeiras, de contencioso, fiscais e parafiscais, amortizações, representação, dívidas incobráveis, prejuízos em existências, livros e revistas e ainda tantas outras impossíveis de enumerar por variarem de caso para caso?
Quanto ao comércio retalhista, tem problemas idênticos, pois é também obrigado a suportar encargos da mesma natureza, ainda com a agravante de ser geralmente reduzido o seu volume de negócios, o que lhe ocasiona maior percentagem de encargos.
Com efeito, parece ser no retalhista que as desvalorizações de existência têm maior expressão e acuidade, pelo contacto mais próximo com o consumidor. Este gosta de andar ao sabor da moda, que evolui continuamente, existindo, pois, para alguns comerciantes a necessidade de saldar os seus artigos no final das estações, por preços muitas vezes inferiores ao custo.
Têm, portanto, de fazer a marcação dos produtos que vendem a preços compensadores dos prejuízos que poderão ter com aqueles que não conseguem vender na época mais conveniente.
E estes prejuízos já estão previstos actualmente na legislação fiscal.
Os saldos pressupõem prejuízos, e julgo que ninguém se sentirá com autoridade moral para os condenar - mas neles está implícita uma orientação empresarial que tem de fundamentar-se na fixação de preços de venda com margens que permitam fazer os descontos a que o consumidor está habituado e, mais tarde, os saldos - pois de outra forma seria o prejuízo certo e a ruína a curto prazo.
Estas margens não significam especulação, como acabará por ser reconhecido, nem roubo, nem crime - como foram classificadas por um órgão de informação que tem o dever de ser responsável, o que causou a mais viva repulsa às pessoas e entidades que têm alguma noção do que é o comércio e das dificuldades com que luta.
Há que restabelecer a verdade com toda a urgência, pois não pode continuar a circular, nem mesmo ficar impune, o libelo de ladrão que se procurou lançar sobre uma classe que abrange mais de 200 000 comerciantes e um número superior de famílias, grande percentagem das quais é obrigada a viver com modéstia, em virtude dos precários lucros que aufere, e que mais não são do que uma remuneração justa para o trabalho diário, não entrando em linha de conta com o capital investido.
Há, pois, que ponderar devidamente o problema, em profundidade e extensão, a fim de compatibilizar as necessidades vitais do comerciante com os interesses do consumidor.
O comércio não é uniforme. Há quem consiga administrar os seus estabelecimentos com encargos reduzidos, até porque a concorrência não consente, por vezes, que o comerciante possa ter empregados.
No notável estudo sobre problemas de distribuição publicado em 1964 pelo Doutor Cruz Vidal, refere-se que, quanto ao sector alimentar, num total de 1339 armazenistas, 415, ou sejam 31 por cento, não possuíam empregados; e nesse mesmo estudo o ilustre economista pergunta mais adiante: como poderão dispor de empregados empresas que não ganham o suficiente para lhes pagar?
Há ainda outros comerciantes que poderão eventualmente trabalhar sem despesas significativas - como sejam os vendedores de praças ou feiras, alguns estabelecimentos localizados em pequenos núcleos populacionais, em que o comércio é exercido pelo agregado familiar, e outros casos similares.
Mas também há o comércio evoluído e especializado por ramos de actividade ou por tipos de clientela.
Todos exercem uma actividade útil à Nação e todos devem ser defendidos pela lei, a par dos consumidores.
Entretanto, os encargos que uns suportam são indiscutìvelmente diferentes dos outros.
Exemplificarei ainda que nalguns ramos se pode fazer grande volume de vendas com pequenas existências, enquanto noutros se passa o inverso.
Alguns sectores trabalham com prazos de venda limitados, enquanto noutros esses prazos se situam entre seis meses a um ano, resultando encargos financeiros que podem estimar-se entre 2 e 3 por cento sobre o montante de vendas.
Lembro-me de referir aqui o facto de a matéria colectável do imposto de transacções ser o preço ilíquido praticado à saída do armazém, a que apenas se pode deduzir o desconto de pronto pagamento até ao limite de 3 por cento.
Porém, no caso de os retalhistas fazerem directamente importações, o valor tributável é o valor aduaneiro, acrescido dos direitos e ainda de 40 por cento sobre esse valor global.
Parece-me, pois, que estes 40 por cento, ou, melhor, os 37 por cento, são a margem estimada pela lei fiscal para encargos e lucro do armazenista, mais do dobro, portanto, dos 17 por cento estabelecidos pelo Decreto-Lei n.º 41 204.
Temos, portanto, assim, já dois critérios legais, mas não há dúvida nenhuma de que, desta vez, a lei fiscal se aproximou mais das realidades económicas.

O Sr. Antão Santos da Cunha: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Antão Santos da Cunha: - Queria, antes de mais, prestar as minhas homenagens a V. Ex.ª pela coragem demonstrada em trazer à Assembleia este problema. Nem sempre isso acontece, pois nos deixamos dominar por climas emocionais, por ambientes de suspeição, e os problemas ficam mal esclarecidos e pior resolvidos. O que vou dizer-lhe reveste-se da maior independência. Não se trata de atacar departamentos oficiais, sectores governativos ou as pessoas que respondem por uns e outros. Em cada reparo ou crítica logo se vê malquerença ou intuitos reservados. Quando assim se pensa, dão-se provas de menoridade política e cívica. Temos de ultrapassar resolutamente esse clima. O depoimento que V. Ex.ª está a fazer com profundidade e objectividade merece os agradecimentos da Câmara, ou, pelo menos, os meus. De algum modo se poderá dizer que V. Ex.ª, ao referir-se à maneira como se lançou a campanha contra a alta de preços - cuja necessidade ninguém põe em causa -, veio proclamar que o «rei vai nu». E a nudez do rei, neste caso, resulta do seguinte:
Não está definida a posição do comércio no quadro da economia portuguesa; não estão actualizados os dispositivos legais aplicáveis; a Inspecção-Geral das Actividades Económicas - sem embargo da competência de alguns dos seus funcionários, entre os quais conto verdadeiros amigos - não está preparada, nem possui quadros qualificados para tão complexa missão. Assim, não é possível