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DIÁRIO DAS SESSÕES N.° 195
trabalhadores agrícolas, em ordem à sua integração no regime das caixas sindicais de previdência —, vimos encontrar a mesma linha de orientação e coerência ao pretender que estes organismos realizem de forma mais adequada os seus fins institucionais, adaptando-se aos novos condicionalismos da nossa vida rural.
Assim, a reorganização das estruturas das Casas do Povo, realizada numa linha de coerência com os princípios corporativos que orientam a nossa economia, corresponde a um imperativo de ordem nacional, com vista à valorização humana de uma população que é ainda hoje o suporte mais importante da nossa economia e que importa defender, para que se não acentuem desequilíbrios perigosos já existentes.
Nestes trinta anos profundas transformações se deram no mundo rural português e um profundo mal-estar se estabeleceu, de modo a fazer sentir a necessidade de uma política de revigoramento total da nossa agricultura.
Porém, numa agricultura como a nossa, assente numa propriedade fraccionada até à pulverização nalgumas regiões do País, com um baixíssimo índice de produtividade, como consequência do baixo nível cultural do trabalhador do campo e da rotina de processos, assente na ignorância e aversão por novos métodos e novas culturas, e da inexistência de empresas familiares com viabilidade económica, não é possível lançar as bases de uma política agrícola sem o justo receio de que não passe de mais um sonho, a esfumar-se no acordar das realidades.
A uma assimetria sectorial acentuada, que, arrastando consigo, para além do normal transplantar, os trabalhadores rurais para os sectores secundário e terciário, arrastamento benéfico quando corresponde às exigências normais de um desenvolvimento económico, arrasta igualmente e em avalancha uma população que se vai aglomerar junto dos centros urbanos, num verdadeiro «urbanismo mórbido», já que ao deslocamento geográfico não corresponde um deslocamento profissional, acresce ainda uma assimetria dentro do próprio sector, fomentadora dos maiores desequilíbrios, que tornam difícil realizar qualquer iniciativa com vista a melhorar as suas próprias condições.
Assim, a agricultura assiste impotente à saída de toda a sua mão-de-obra mais válida, quer pela mobilização da juventude que, servindo em África na defesa da soberania da Nação, regressa com horizontes mais vastos e procura melhores situações, quer pelo forte contingente de emigração para o estrangeiro, numa verdadeira sangria do seu capital humano, o mais valioso de qualquer sector.
A esta sangria de população, que nem sequer é — e infelizmente não ó — imposta por uma mecanização, que se impõe com vista a uma maior produtividade, há que pôr-se por todos os meios um tampão que obste ao escoamento das populações, de tal forma que está transformando num deserto largas faixas de território nacional, destruindo ao mesmo tempo todo o vasto repositório das mais belas tradições portuguesas e dos caracteres da raça, que se transmitem em ancestralidade e que correm o risco de serem pouco menos do que motivos de museus etnográficos.
Impõe-se, pois, uma política de ordenamento rural e urbano que permita suster na sua região um caudal humano que em torrente se lança nas grandes cidades, com todas as consequências de ordem económica, política, social e religiosa.
Ora é neste campo, creio eu, que podemos situar com êxito as funções de cooperação social das Casas do Povo, que se definem na base I da proposta de lei, dado que têm em vista o desenvolvimento integral das comunidades e a promoção cultural, moral e profissional dos seus associados.
Na medida em que o desenvolvimento do sector agrário deve ser promovido pelos próprios interessados, a presente proposta de lei, ao repor no verdadeiro plano os fins de cooperação social, o alargamento da previdência e a regulamentação de uma função representativa a nível nacional, está criando as condições de consciencialização para uma acção do próprio sector dos trabalhadores agrícolas da qual é lícito aguardar os melhores resultados.
A expressão «cooperação social» alcança aqui o seu verdadeiro significado, como característica essencial dos fins das Casas do Povo, do desenvolvimento da comunidade e da promoção social das populações rurais, pela elevação do nível económico, profissional, moral e cultural dos seus membros mais desprotegidos: trabalhadores rurais de modestas categorias e produtores agrícolas em situação equiparável.
No magnífico e bem elaborado parecer da Câmara Corporativa sobre este capítulo da cooperação social, finalidade principal das Casas do Povo, aquele a que se dá maior relevo na proposta, esta Câmara faz uma cuidadosa apreciação das actividades a realizar, designadamente nas suas modalidades de promoção cultural e formação profissional, em ordem a uma eficaz promoção social dos trabalhadores rurais e a sua integração no progresso da economia agrária.
Aqui gostaria de fazer dois pequenos apontamentos: o primeiro no campo da formação profissional, para afirmar uma vez mais nesta Câmara a necessidade de uma íntima e eficiente colaboração entre os Ministérios das Corporações e da Educação Nacional.
No relatório do Parecer das Contas Gerais do Estado de 1967, neste capítulo da agricultura, encontramos na p. x uma referência à necessidade deste esforço de coordenação quando se diz: «Há certamente organismos e esforços a mais, mal situados nalguns casos, e falta, sem dúvida, uma coordenação eficaz que una tantas e tão boas intenções».
Tem o Ministério da Educação Nacional, através da sua Direcção-geral do Ensino Técnico Profissional, desenvolvido um notável esforço ¦ no sentido da formação agrícola das populações rurais, criando e mantendo cursos de aprendizagem agrícola, cujo número vem diminuindo todos os anos por falta de interesse e por falta de apoio.
Assim, no ano lectivo de 1965-1966 havia a funcionar 250 cursos, com cerca de 3500 alunos. Nos anos lectivos seguintes o movimento foi como segue:
Em 1966-1967 funcionaram apenas 230 cursos;
Em 1967-1968 funcionaram apenas 175 cursos;
Em 1968-1969 funcionaram apenas 153 cursos, com pouco mais de 1500 alunos.
Estes cursos, assentando na 4.ª classe da instrução primária, constituíam uma extensão da escolaridade obrigatória e constam de uma parte de cultura geral e outra parte profissional. Ora foi sempre na realização da parte profissional que estes cursos encontraram dificuldades, por falta de apoio dos organismos representativos da lavoura.
Estabelecida agora a escolaridade obrigatória para seis anos, importa desde já começar a pensar no esquema de articulação destes cursos com a escolaridade obrigatória, para evitar perdas de tempo a resolver um problema que é urgente, ou para se não entrar no campo das improvisações perigosas e provocadoras de desinteresse.
Os alunos depois da 6.ª classe, com 12 ou 13 anos de idade, estão já dentro de um nível psicológico de interesses, que lhes permite melhor assimilar uma formação