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1744 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 87

E são eles, é essa boa gente, que ó povo, que no seu regresso acentuam e vincam bem que o ultramar não é um peso para a Nação e menos aquele vazadouro público, para onde só vão e foram os meninos mal comportados, os falhados e os inconvenientes.

Que o ultramar não é propriedade de meia dúzia que explora os suas riquezas à custa do sacrifício de milhares e com sobranceiro desprezo por valores humanos e direitos amesquinhados a outrem. Que não se expoliou nada, nem a ninguém.

Não! Angola é outra coisa. Angola é uma terra onde se irmanam empresários, camponeses e trabalhadores, lutando lado a lado, sem distinção de cores ou credos, conjugando-se em esforços numa luta que é 'de todos, promiscuindo-se em suor e sangue, unindo-se em preces, virados à construção de um novo mundo e de uma verdadeira tenra de promissão.

Gerações e gerações ali nasceram e ali se ramificaram. Gente que tudo ali tem, e que ficaria à míngua se um dia tivesse de a abandonar. Todos com milhares de raízes bem ligadas a terra, indestrutíveis, que estão para estar, para permanecer, com vontade ou sem vontade seja de quem for, a ocupar., a edificar, a criar riqueza à Nação.

Do terrorismo, que só eclodiu em 1961, mas que se pressentia de há muito - a história julgará com severidade a responsabilidade que na sua eclosão e acobertamento a cada um coube -, nem tudo foi negativo: Redescobriu-se Angola e iniciou-se uma gloriosa arrancada, desencadeando-se um surto de progresso. Saíram à luz do dia muitos problemas, que se arrastavam, ora mornos, ora até escondidos em gabinetes e repartições, numa afirmação d.e que a Nação se revivia ao apogeu das suas raízes históricas, e, finalmente, repito, os milhares de portugueses chamados a defender a integridade do território nacional, uma vez {regressados ao continente, foram e são outros tantos milhares de arautos das promessas e das realidades ultramarinas.

E milhares deles lá desejariam ficar. E desejar-se-iam tantos até que chegasse o dia que ninguém tivesse mais o desejo de os contar pela cor.

E tão poucos ficam dos tantos que se desejam e o desejam!

Uma carência de infra-estruturas não lhes possibilita trabalho. Isto numa terra quase inexplorada, com nada menos que l 246 700 km2, catorze vezes e meia superior ao continente e com uma escassíssima densidade populacional.

Não há ocupações? Não há empregos? Porquê?

Todo um drama a resolver, toda uma planificação a ser encarada a curto prazo pela ingente e urgente necessidade de o fazer.

Portugal, que tem só uma das suas parcelas geograficamente situada na Europa, vê todas as suas perspectivas e todo o seu futuro postos noutros continentes, no rumo que o infante D. Henrique, com a sua face severa e o seu dedo austero, lhe apontou além-Atlântico.

Saibamos nós estar à altura do momento actual, encarando com realismo a origem que é também o destino histórico desta Nação.

É por isso que o problema central que trago hoje a esta Assembleia me é do maior gosto e me é do maior prazer, porque o seu exemplo é incentivo de trabalho e convite aos trilhos em que o povo português deve prosseguir sem desfalecimentos.

Infelizmente, o problema perderá em validade por ser tratado pela minha descolorida voz. Mas entendo-o como dever, dada a qualidade em que aqui estou. Pois alguém teria de fazê-lo, já que os organismos oficiais da informação se preocupam mais com deambulações poéticas e edições de obras históricas do que com a divulgação realística do Portugal de hoje, e no apontar do caminho recto, sólido e firme do futuro a todos os portugueses, num convite a aceitarem o desafio que lhes é feito.

Não será novidade, suponho, o conhecimento, ainda que nebuloso, da existência de um plano de trabalhos a que se vem dando vulgarmente o nome de «Esquema Cunene» ou «Plano do Cunene».

Pois, por esquema do Cunene compreende-se nem mais nem menos que o estudo exaustivo do aproveitamento de uma extensa área que, apesar de ser uma pequena parcela de Angola, mesmo assim, sempre é superior à superfície metropolitana.

Desejo sublinhar, para lhe dar o devido relevo, que todo o esquema foi estruturado por uma equipa polivalente de técnicos portugueses, que, sob a orientação e chefia desse devotado e indómito trabalhador que é o engenheiro Bettencourb Moreno, exaustivamente a ele se entregou de alma e coração, planificou o aproveitamento integral de toda uma enorme bacia hidrográfica, esgotando-se no estudo de todos os seus possíveis e promissores aproveitamentos, e não só à luz das realidades actuais, mas ainda com os olhos postos nas perspectivas do futuro.

Gomo se sabe, o rio Cunene constitui, em parte do seu curso, uma parcela das fronteiras de Angola.

Para o início dos trabalhos houve, assim, que encetar e ultimar intermináveis negociações internacionais que possibilitassem levar a bom termo a execução do plano. Dessas negociações saiu francamente favorecido o País. Injustiça seria, e injustiça grande, não relevar aqui a intransigente defesa dos interesses da Nação em que se empenhou a equipa formada pelo Ministro do Ultramar, Prof. Silva Cunha, e o então Subsecretário do Fomento Ultramarino, Dr. Rui Patrício, sob a orientação sempre serena, sempre lúcida e sempre arguta do Doutor Oliveira Salazar.

Ora, a bacia do Cunene significa uma extensa área que se mostra insuficiente em recursos aquíferos. A diminuta perspectiva de rentabilidade torna difícil a sua ocupação, exactamente à luz, também, da escassa densidade pluviométrica e da irregularidade dos poucos cursos de água que a atravessam.

O Gabinete do Cunene, enfrentando o problema, delimitou-se em dois parâmetros fundamentais: por um lado, garantir suficiência e permanência de abastecimento de água e, por outro, aproveitar, onde isso fosse possível e viável, da força dos caudais, transformando-os em fontes de energia eléctrica.

Perante isto, orientaram-se os técnicos pela construção de grandes albufeiras, aproveitando os pontos onde a pluviosidade é mais elevada, nas cabeceiras dos rios, procurando exactamente fazer a regularização dos caudais, do que resultará logo e imediatamente o aproveitamento de meio milhão de hectares de terras para fins agrícolas e pecuários, propiciando também um aumento de produção de energia eléctrica, a servir de apoio e contributo & valorização de todo o Sul de Angola.

Foi assim que se planificaram nada menos nada mais que vinte e oito aproveitamentos, num total, dos quais onze se destinam a regularizar caudais e cinco têm como principal finalidade a rega e a valorização pecuária, pelo sistema de abeberamento em regiões onde havia e há abundância de pastos, mas onde a ocupação se tornava praticamente impossível, exactamente por carências de água, e isto acarretava também uma notável irregularidade demográfica e um indesejável e pernicioso nomadismo das populações.