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2096 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 104

de muitas preocupações tem trazido a várias pessoas, certamente por razões que Consideram muito válidas. Mas quem ler com atenção a proposta de revisão verifica, e isso é claramente confirmado no parecer da Câmara Corporativa, que essa autonomia é meramente administrativa e financeira, pois não tem poder constituinte. A autonomia legislativa não atinge a unidade da Nação, uma vez que os órgãos da soberania da República têm o direito de anular os diplomas das províncias ultramarinas que contrariem a unidade ou ofendam as normas constitucionais.

Não há aqui alteração ao que presentemente vigora, não há aqui inovação, mas há, sim, continuidade.

Efectivamente, o artigo 2.º do Estatuto Político-Administrativo da Província de Moçambique, aprovado pelo Decreto n.º 45 375, de 22 de Novembro de 1963, diz:

A província de Moçambique é pessoa colectiva de direito .público e goza de autonomia administrativa financeira), de harmonia com a Constituição Política, Lei Orgânica do Ultramar e o presente Estatuto.

E, por outro lado, o n.º II da base XXVI da Lei Orgânica do Ultramar Português define a competência legislativa do Conselho Legislativo da província. A Lei Orgânica do Ultramar assegura, portanto, às províncias ultramarinas uma descentralização administrativa e política limitada e pelo n.º I da base LIII uma autonomia financeira sujeita à superintendência e fiscalização do Governo. Os princípios autonomistas foram conferidos às províncias ultramarinas pela Lei n.º 2066, de 27 de Junho de 1953, e pelas alterações que esta sofreu em 1955 e 1963, isto é, a Assembleia Nacional reconheceu já em 1953, e reforçou-o em 1955 e 1963, como necessário para o desenvolvimento harmónico do País que se fizesse essa descentralização. O que isto não está é claramente expresso na Constituição, e ate talvez se pudesse dizer que uma parte do País tem estado a ser dirigida por uma lei resultante do desenvolvimento de princípios que foram inconstitucionais e cairíamos então na posição de poder vir a discutir a legalidade do muito que foi feito nestes dezoito anos passados.

Hoje, passados quase oito anos após a última revisão da Lei Orgânica, em que os princípios de descentralização foram reforçados, podemos verificar se houve benefício ou prejuízo com essa descentralização, podemos verificar se da aparente inconstitucionalidade constante do artigo 2.º dos Estatutos Político-Administrativos onde se fala de autonomia administrativa, o País sofreu na unidade da sua soberania ou se se manifestaram algures desejos de desintegração. Pois verificamos, sim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que o progresso é notório a partir daí e verificamos1 também quanto infundados eram os receios que se levantaram com o retorno ao princípio autonomista.

Que podia então fazer agora o Governo ao apresentar uma proposta de lei de revisão da Constituição? Deixar tudo como está, sem que na Constituição esteja claramente expresso o que consta de outra legislação e pela qual uma parte do País é governada? Ou, pelo contrário, anular essa legislação que não é fundamental, recuando novamente na evolução político-social do ultramar, considerando um prejuízo para o País a experiência destes anos férteis de progresso? Ou fazer, tal como fez, isto é, apresentar uma proposta de lei de revisão como a que apresentou, em que corajosamente se definem os princípios a que a Nação se deve subordinar e que, quanto ao ultramar, silo os princípios autonomistas que a Assembleia Nacional considerou necessários ao votar a Lei Orgânica do Ultramar? E, em face disto, deveremos ficar com o pensamento de que foi grande o risco corrido pela Assembleia Nacional ao aprovar esses princípios autonomistas da Lei Orgânica do Ultramar? Julgo que não, pois a limitação ao poder legislativo das províncias ultramarinas ficou claramente, expressa no n.º III da base X da Lei n.º 2066 e no n.º II da base X da Lei n.º 2119, atribuindo-se esse poder limitador ao Ministro do Ultramar. Pois exactamente agora que se transferem para a Constituição, através da proposta de lei n.º 14/X, os princípios de autonomia das províncias que constam da Lei Orgânica do Ultramar, teve o Governo o cuidado de igualmente transferir para a proposta de lei o tal poder limitador da competência legislativa das províncias, com a diferença aliás louvável, de deixar de ser da competência do Ministro do Ultramar, para passar a ser, como disse já, da competência dos órgãos de soberania da República. O Governo, ao transferir para os órgãos de soberania da República poderes que até aqui eram exclusivos do Ministro do Ultramar, ao propor o alargamento dos poderes da Assembleia Nacional quanto ao Portugal ultramarino, não faz mais do que reforçar a unidade existente, pois o integra mais no seio da Nação. Necessariamente que para haver coerência na proposta do Governo, já que eram aumentados os poderes da Assembleia quanto ao ultramar, teria de haver na proposta a previsão de aumento do número de Deputados ultramarinos. Esta previsão de maior representação das províncias ultramarinas na Assembleia Nacional, que o Governo considera, e bem, como justa, também tem de entender-se como desejo do Governo de reforçar mais a integração das províncias ultramarinas no todo nacional. E esse aumento de representantes do ultramar nesta Assembleia é absolutamente necessário! Não significa isto que nós, os Deputados eleitos pelos círculos ultramarinos, não possamos defender aqui os interesses e anseios das populações que nos elegeram ou da totalidade das populações do ultramar. Naturalmente que o podemos fazer, e fazemos, e, naturalmente também, VV. Ex.ªs, Srs. Deputados, defendem igualmente os interesses dessas populações, já que todos somos aqui Deputados da Nação. Mas se isso é verdadeiro, e é, quanto ao ultramar, também o é relativamente ao Portugal europeu. Significa isto que, com o desenvolvimento sócio-economico que está a (processar-se no ultramar, breve será o ano em que novamente a Assembleia terá de rever o número de Deputados que agora ao ultramar forem atribuídos, já que as populações que representamos atingem cerca de 15 milhões de pessoas. Mas isso, naturalmente, só será motivo para nos congratularmos, pois significa que se conseguiu equilibrar mais, e cada vez mais, o ainda existente desequilíbrio de civilizações das populações, que constituem no seu conjunto a alma da Nação.

A responsabilidade que nesta Legislatura cada um de nós tem é grande, mas talvez se julgue que é maior para os que, como eu, pelo ultramar foram eleitos. Mas sabía-mo-lo nós quando fomos propostos e sabia-o a população quando nos elegeu. Ao aceitarmos a candidatura assumimos a responsabilidade de sermos Deputados da Nação, com delegação dos eleitores para aqui, na Assembleia, decidirmos dos seus destinos, dos destinos dos Portugueses, entre os quais orgulhosamente nos consideramos. Foi um voto de confiança que a população nos concedeu 1 Mas nem sempre, porém, os homens se mantêm afectos às mesmas ideias, através do tempo, porque a evolução do seu pensamento pode conduzi-los a desvios de orientação, subordinando-os àquilo que julgam ser uma nova verdade, distanciada, ou pelo menos diferente, daquela que inicialmente possuíam. E essa evolução do pensamento, que tem nos problemas nacionais motivação fácil, tão vastos e profundos eles são, pode, naturalmente ou orientada