O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

2832 DIÁRIO DAS SESSÕES N.° 141

O Sr. Presidente: — V. Ex.a está a fazer uma pergunta à Mesa, ou está . . .

O Sr. Miller Guerra: — V. Ex.a dá-me licença? Eu estou a falar — se V. Ex.a entende que isso é secundário, então calo-me.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado: E evidente que a Mesa tem de ter um critério sobre a concessão da palavra. Se V. Ex.a e os outros Srs. Deputados mo permitem, a Mesa não dividirá esse critério com VV. Ex.as enquanto a Assembleia não se pronunciar em votação, porque a verdade é que cada um de VV. Ex.as tende a considerar sempre de muita urgência a sua própria intervenção.

Vozes: — Muito bem, muito bem!

O Sr. Meneses Falcão: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ainda a propósito das oportunas e úteis peregrinações pelo ultramar, pretendo fazer um depoimento que nada acrescenta ou tira à brilhante exposição aqui feita pelo Sr. Deputado Ávila de Azevedo, mas será recado de um mensageiro que sente obrigação de dizer o que viu para dar conta da sua missão.

Há muitas maneiras de ver. A que domina o meu testemunho neste momento está subordinada a uma interpretação muito pessoal, sem quebra de fidelidade ás imagens que se oferecem a toda a gente.

Quem não consegue dispensar neste mundo os valores morais e espirituais para encontrar uma razão de viver facilmente admite que as pátrias têm a alma no cerne desses valores e que são eles as mais sólidas fronteiras entre os povos.

No domínio deste pensamento, não será difícil aceitar e acarinhar a ideia de que as nações podem ser multirraciais e pluricontinentais.

Celtas, Iberos, Fenícios, Gregos ou Romanos; Balantas, Bailundos ou Macuas; temperados com o génio lusitano, portugueses somos enquanto aceitarmos a mensagem de Ourique e soubermos honrar as gotas de sangue generoso que traçaram a rota da ponta de Sagres ás costas do Malabar.

Portugueses somos enquanto sentirmos dentro de nós o dever sagrado da fidelidade à nobreza do sacrifício dos Gamas e dos Albuquerques, à força evangelizadora simbolizada na cruz das caravelas.

Há-de tocar-nos profundamente esta conclusão se soubermos encaminhar a corrente do pensamento para uma meditação serena ás portas da praça forte de Luanda ou debruçados na fortaleza da ilha de Moçambique.

Tal meditação terá de fugir ao som perturbador das trombetas do universalismo pagão, aos artifícios do comércio internacional ou mesmo aos desvios, desatentos ou maldosos, na interpretação das decisões conciliares.

Caia sobre estas palavras a acusação da sensibilidade doentia, idealismo ou espiritualidade ultrapassada, que nem por isso elas perdem inspiração no berço donde partiu o sopro de vida para uma realidade palpável: O mundo que os Portugueses criaram.

Criação que nas costas do Indico se chama Moçambique e possui, no presente, testemunhos de glória que em nada desmerecem das grandezas do passado.

Quem não quiser enternecer-se perante os padrões quinhentistas, na busca de grandeza e sentido para a obstinação de que nos acusam, percorra toda a província e veja onde põe os pés.

Desligue-se do passado, se quiser acomodar-se a essa frieza, mas observe o presente com os olhos da alma e encontrará as melhores virtudes teologais a construir um mundo moderno, onde não falta a frutificação de potencialidades económicas, o caminho do progresso, com as armas da técnica, a promoção do homem através da comparticipação nos recursos sacrificadamente conquistados pelo homem.

Nem sempre esta comparticipação será a mais criteriosa e justa; muitas vezes o factor rendimento a impor a sua crueza, algumas vezes uma distância fria, embora tendente a ser cada vez menor.

Nem sempre se encontra resposta para interrogações que fazemos ou nos fazem: Por que há casos — embora isolados — de doentes à porta de hospitais aguardando vez? Por que não são comercializados noutros moldes os produtos pecuários de certas zonas?

Importará menos responder do que eliminar a razão das perguntas.

A grande e maravilhosa cidade de Lourenço Marques, que cresce à média de um prédio de três andares por dia e recebe no seu porto dois mil navios por ano, não será um espelho da província, mas é mostruário de um cosmopolitismo que nos transporta ao ambiente europeu.

Sem conseguir libertar-se de influências estranhas na superfície da sua movimentação, sustenta-se pelo lusitanismo das suas raízes, com legítimo orgulho pelos serviços que presta, de parceria com a Beira e Nacala, a toda a África austral.

O viajante que vai em busca de elementos de estudo e informação com sentido político coloca, naturalmente, em segundo plano os encantos turísticos que se lhe deparam e — com o devido respeito pelas pegadas de Mouzinho — sobre o Limpopo com a ansiedade de quem procura uma realidade sonhada.

A transplantação metropolitana que encontra e a naturalidade com que se processa a confraternização e entreajuda com os povos autóctones sensibiliza e amarra o mais desatento; mas a perseverança e dedicação de quem deu forma e vida a celeiro tão gigantesco desperta admiração e reconhecimento perante estas generosas dádivas à África, que não valem hoje menos do que as de ontem e são o mais vivo testemunho da isenção que nos contestam.

O que se faz em Trigo de Morais, Vila Cabral, Vila Junqueiro, Dondo e muitos outros lugares escolhidos numa imensidão territorial nem sempre utilizável requer mais trabalho do que a simples operação de apanhar castanha de caju; mas não são os '200 000 ou 300 000 europeus radicados em toda a província os únicos interessados no rendimento. São também milhões de africanos.

Todos os portugueses ali residentes, brancos ou de cor, sabem que é assim., e daí a razão por que não esmorecem numa luta que os chama ao campo, à oficina, à escola e ás zonas de infiltração subversiva, com a consciência de quem disputa, o pão, a honra e a segurança. Insinua-se que o surto de progresso que está a verificar-se em Moçambique — com manifestações de extraordinária fé e confiança no Norte — é inspiração provocada pela generalizada arrancada de Angola, frente à agitação vinda do exterior.

Que só agora a rede de estradas, as barragens, as maquinarias em acção.

Admitindo, embora, que alguns tenham sido sacudidos e acordados para uma consciencialização da hora que passa, não esqueçamos que também é recente a possibilidade de recurso a meios técnicos, até há pouco fora do nosso alcance.

Importa saber onde está maior esforço da dedicação à causa pública: se a remover milhões de metros cúbicos de terra a pá e picareta para transformar pântanos em