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2898 DIÁRIO DÁS SESSÕES N.° 144

O assunto que V. Ex.ª acaba de abordar, referente à eliminação de privilégios de algumas empresas relativamente à inserção das respectivas cambiais no fundo da província, foi um assunto que eu senti que seria uma das maiores aspirações das pessoas responsáveis pela administração de Angola.

Creio que o apoio que V. Ex.ª dá ás medidas preconizadas no recente decreto-lei poderá ter o apoio decidido de todas as pessoas que vivem em Angola, mas também o apoio decidido de alguns Deputados, entre os quais eu tenho a honra de me encontrar, manifestando desde já a V. Ex.ª que sinto que esse problema deverá ser resolvido no mais curto prazo de tempo possível. Porquanto, se é necessário que se façam sacrifícios, eles devem ser repartidos com justiça por todos os portugueses, e não poderá, de forma alguma, deixar-se de lado algumas empresas que têm tido privilégios, que dispõem de fundos cambiais que são realmente necessários para o equilíbrio cambial da província e para o seu desenvolvimento.

Sobre um outro ponto, que V. Ex.ª referiu um pouco mais atrás, relativo ás restrições decretadas, salvo erro, em Novembro deste ano — restrições essas que tinham sido também feitas em Novembro do ano passado —, eu só queria dar também a V. Ex.ª um apontamento de um pormenor que conheço.

O Governo promulgou, salvo erro, um decreto-lei proibindo ou limitando a importação de algumas mercadorias da província e dando um espaço de poucos dias para que esse decreto-lei vigorasse plenamente.

Pretendia informar que não considero este o melhor meio de resolver estes problemas, porquanto havia exportações de industriais e comerciantes portugueses, mas sobretudo de industriais, que tinham sido encomendadas pelas províncias havia largos meses, o que ocasionou que ficassem mercadorias em poder da indústria metropolitana que não têm venda noutros mercados conhecidos, ou noutros mercados possíveis, a curto prazo, o que ocasionou investimentos e prejuízos de largos milhares de contos, prejuízos esses que poderiam ser evitados se as medidas tivessem sido anunciadas com mais antecipação.

O Orador: — Muito obrigado, Sr. Deputado, pela ilustração com que V. Ex.ª quis trazer às minhas considerações, sobretudo dada a sua qualificação profissional, altamente reconhecida neste país. E estou inteiramente de acordo, sobretudo quanto às restrições e ao diminuto prazo em que foram estabelecidas. É sempre situação delicada tocar em situações criadas à luz de direitos adquiridos. E se o desequilíbrio da balança cambial de Angola e a situação daí derivante me preocupa, incomoda-me muito mais que se não tutelem os direitos de quem, investindo os seus capitais, o fez à sombra da lei que lho consentia.

Eu sei que o Governo atalhou aos prejuízos mais gritantes e posso assegurar, por conhecimento pessoal, que várias situações foram resolvidas a contento dos interessados. Conheço alguns casos, que não vale a pena aqui mencionar, a quem, apesar desses dispositivos, o Governo teve o cuidado de não prejudicar, autorizando que as mercadorias fossem realmente exportadas.

O Sr. Pontífice de Sousa: — Mas foram só alguns. Posso dizer a V. Ex.a que muitos interessados continuam com prejuízos de largos milhares de contos por isso não ter sido resolvido com mais oportunidade.

O Sr. Camilo de Mendonça: — V. Ex.a dá-me licença?

O Orador: — Faça favor.

O Sr. Camilo de Mendonça: — Eu estou a ouvir com o maior interesse as considerações de V. Ex.ª

É doloroso chegar-se a uma situação em que tenham de estabelecer-se restrições, mas quando o interesse público as impõe não há outro remédio.

Há uma coisa que constitui motivo emocional e político e até económico e financeiro, que é a tal liberdade de algumas empresais disporem de divisas.

Há uma coisa que eu não entendo bem: tal facto resulta de contratos que, bem ou mal, foram celebrados e porventura então com pouca possibilidade de serem diferentes . . .

O Orador: — Eu lá para a frente já falarei a V. Ex.a nesses contratos. Mas adiantar-me-ei já perguntando a V. Ex.a até que ponto se pode sacrificar toda a Nação a privilégios concedidos há largos anos e quando Deus quer sob corrosivas condicionalismos, isto salvo o devido respeito por quem as celebrou.

O Sr. Camilo de Mendonça: — Se me dá licença, eu retomo as minhas considerações. Como dizia, tal facto resulta de contratos em que só um forte interesse público justifica interferir. Quando existir tal interesse, não há que hesitar, mesmo havendo contrato, embora com o cuidado de não lançar a desconfiança sobre nós.

Mas o mesmo rigor se põe, com igual direito, quando se trata de exportações ou importações. Não compreendo que pareça bem, em termos de justiça de actuação administrativa, interferir em contratos e se rejeite quando se trata de restringir importações. O problema no seu aspecto moral é igual.

O Orador: — O problema é totalmente diferente, Sr. Deputado. V. Ex.a lançou aqui uma confusão tremenda.

Uma coisa é o indivíduo que produziu, investiu e gastou em certa perspectiva e tem o produto pronto para ser exportado, não o podendo fazer porque o condicionalismo preexistente foi abruptamente alterado. Vamos a um caso concreto: uma empresa de litografia, por exemplo, que conheço de perto, tinha impressas embalagens pana cigarros de certas e determinadas marcas para exportar sob antiga encomenda para uma fábrica de Angola. E, pelo tal condicionalismo posterior à encomenda e à sua execução, ficou impedida de o fazer, não podendo vendê-las absolutamente a ninguém, a não ser à empresa que as encomendara. Que fazer então às embalagens? Deitá-las fora, então, com prejuízo total para a economia da Nação? Pois tratava-se de produto que só podia ser consumido pelo detentor da marca, e, impedida a posterior exportação, tinham de ir para o caixote do lixo. E é muito diferente esta situação da de uma empresa que está regaladamente alcandorada nos seus regimes especiais e com os seus lautos conselhos de administração sentados em Lisboa nos seus luxuosos escritórios e acalentadores aquecimentos, enquanto as cambiais se têm esvaído por largas dezenas de anos, com grave prejuízo paira a província de Angola. E a isso exactamente que o Governo agora pretende pôr cobro, e até se for necessário, entendo eu à luz da sagrada razão social, se não puderem ser revistos os contratos, então que se nacionalizem as empresas.

O Sr. Mota Amaral: — Muito bem.