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2930 DIÁRIO DAS SESSÕES N.° 145

ses, têm o mesmo preço, e que, portanto, se obriga o talhante a definir o critério da selecção na entrega, e que seguramente não é viável o critério dos compadres, mais se radica a opinião de que a tabela contém vários factores que levariam inevitavelmente ao seu desrespeito.

Para mais, não podemos deixar de considerar que um lucro de 5,4 por cento possível na comercialização da carne não é viável, obrigando também este facto a artifícios que no fundo acabam por constituir outras tantas fraudes à tabela, a não ser que as estivas usadas não estejam certas, e dai todo o sistema falseado em si mesmo.

Dados estes apontamentos, que evidenciam a impossibilidade de esperar o cumprimento de uma tabela do tipo da consentida, não só dado o seu carácter estático perante as determinações dinâmicas do despacho, mas também porque continham outros defeitos de fundo, vejamos mais alguns reflexos da situação que vimos analisando:

Seguramente, já todos VV. Ex.as notaram que sempre me tenho referido à tabela, chamando-lhe consentida. De facto assim é conhecida, porque não é legal no sentido exacto do termo. Nunca foi publicada no Diário do Governo, como impõe o Decreto n.º 41 204, de 21 de Julho de 1957, e daqui o resultado de que oficialmente o preço legal da venda da carne é o da tabela publicada em 24 de Maio de 1965, cujos preços são inferiores e não permitem de forma alguma comercializar o gado aos preços que foram garantidos em 1969. Contudo, quando há uma fraude, e já vimos que há casos em que são inevitáveis para se poder persistir, o tribunal só tem como base legal a tabela de 1965, e é à face dela que julga o delito cometido.

Não pretendo defender os que abusam da complexidade da situação criada para auferirem lucros ilícitos, mas confesso que não me parece sério o manter-se um sistema que coloca todos numa posição falsa perante a lei. Como resultado de tudo o que venho expondo não será para estranhar que se tenha, a pouco e pouco, gerado um clima de dúvida que não podia deixar de dar os seus frutos. Para mais, as declarações feitas em Outubro de 1970, aquando da publicação do último regime cerealífico, foram de molde a concretizar essas dúvidas, e não a debelá-las. Quem estivesse atento ao problema saberia que estavam criadas as condições básicas para fazer ruir o que se vinha construindo.

Como referi, primeiro foi o leite a dar sinal, e nem mesmo assim se entendeu o que se estava a passar.

No ano de 1970, por efeito do balanço adquirido, e apesar do extraordinário aumento do consumo de carne, bastou-nos uma importação de 4590 t de carne de bovino para satisfazer o consumo.

Talvez por isso não se acreditasse no que estava já em marcha e veio a condicionar a situação em que nos encontramos. Perante uma subida de preços na oferta, determinada pelo crescente custo dos factores de produção, em muito agora agravados pela prolongada estiagem e tendo também raízes na retracção da produção, dada a insegurança que foi criada, em nome da defesa do consumidor e do combate à inflação, determinou-se e pôs-se em movimento um esquema de actuação conducente ao cumprimento da tabela consentida de 1969.

Como não podia deixar de ser, em face do que se passou, verificou-se uma imediata paragem em todo o mercado de gado vacum.

Aliás, neste momento e por virtude do tempo, o que há mais para entrega é novilho, e esse já vimos que nem a lavoura o pode vender aos preços propostos em 1969, nem o comerciante lhe interessa comprar, uma vez obrigado ao cumprimento da tabela.

Desencadeou-se, pois, uma importação, logo seguida de distribuição de carne congelada em ritmo crescente. Passou-se ràpidamente das 50 t por dia para as 150 t por dia e vamos a caminho das 200 t.

Procurou-se carne onde a havia: Brasil, Dinamarca, Roménia, Irlanda e Alemanha Oriental. De Setembro para cá cifram-se as importações em 19 680 t, incluindo já 3000 t do Brasil, firmadas há poucos dias.

O dispêndio de divisas ultrapassa já os 550 000 contos, e o prejuízo, suportado pelo Fundo de Abastecimento referente a esta importação, atinge valores da ordem dos 130 000 contos.

Entrou-se francamente na política já condenada antes de 1965, lançando-se mão de importações para evitar o crescimento natural dos preços interiores, e entregando essa carne com subsídio que permite preços de mercado muito inferiores aos de verdadeiro custo.

O caminho da importação seria um recurso inevitável se, depois de estabelecidas tabelas e garantias que cobrissem os preços de custo de produção, não houvesse entrega de carne suficiente para abastecer o País, mas, antes de tomar essas medidas, enveredar por ele constitui deliberadamente uma actuação de opção que conduz à perda total de confiança da produção nacional, o que levará ao seu completo desmantelamento.

Por isso não me parece, como aliás foi demonstrado antes de 1965, que seja um caminho a tomar no verdadeiro interesse dos consumidores, que ao fim e ao cabo serão os que terão de pagar estas operações.

Bastará pensar que as 19 680 t agora importadas, com um dispêndio de mais de 550 000 contos, correspondem ao consumo do País de dois meses e meio, para se ver onde nos poderá levar uma política que, a não ser atalhada, nos pode conduzir a carências quase totais todo o ano. Para que valores de exportação de divisas iríamos?

Por outro lado não se compreende como havendo dinheiro para perder — a perca em cada quilograma importado cifra-se no valor de 6$63 por quilograma —, não se aumentou primeiro o subsídio dado à carne de produção nacional, que é de 5$50 por quilograma em Lisboa e no Porto, que representam 25 por cento do consumo no continente e de 4$50 por quilograma para os restantes 75 por cento, o que conduz a um subsídio médio ponderado de 4$75 por quilograma. Comparado este com o subsídio de 6$63 por quilograma concedido à carne importada, traduz um desfavor de quase 40 por cento.

Outra referência há a fazer quanto aos subsídios. Creio que agora se torna evidente que este subsídio do Fundo de Abastecimento é dado ao consumidor nacional, e que, portanto, fácil será compreender que também o que vinha sendo atribuído à carne de origem nacional era igualmente um subsídio ao consumidor, e não à produção, como tanta vez se tem procurado fazer crer.

Sr. Presidente: A lavoura, como actividade económica que é, não pode aceitar determinações que a obrigam a produzir abaixo de custos de produção, pois não é uma instituição de beneficência como alguns ainda parece pensarem. I

Não tem a lavoura nada a opor à política que determina que os preços de venda de carne de bovino sejam em Portugal, e em enorme distância, os mais baixos da Europa, mas não pode aceitar que a factura dessa política lhe seja endossada — e no fundo é o que se está fazendo quando a obrigam a vender a preços que permitam a tabela de 1969. Para mais, neste campo, está a produção numa posição em que não se lhe podem assacar as culpas de preços elevados, como facilmente se conclui da comparação com os termos que hoje andam muito em voga.