O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

16 DE DEZEMBRO DE 1971 2975

O panorama- industrial está contudo longe de ser este, e não me parece que o condicionalismo actual permita esperar-se que as necessárias mudanças surjam por reacção intrínseca do sector. Vivemos por demasiado tempo em mercado insuficientemente concorrencial, focalizados sobretudo por substituição de importações, com salários baixos, exportando quase exclusivamente produtos naturais, com pequena incorporação de trabalho e nenhuma de tecnologia avançada. Este universo fofo em que a indústria tem vivido desagrega-se ràpidamente pela eminência da abertura das fronteiras económicas e pela pressão salarial, a que se junta ainda, actualmente, o espectro de uma recessão generalizada e certamente intensa. Tudo isto cria um clima de expectativa e de receio muito compreensíveis, sobretudo nas empresas independentes, de estrutura familiar, e por isso mais vulneráveis, que não é, naturalmente, nada propícia a iniciativas industriais de relevo.

A nossa taxa de formação bruta de capital fixo tem sido das mais baixas da Europa e ainda por cima incidindo sobre um nível de rendimento por cabeça muito mais baixo, pelo que o nosso volume de investimento por habitante é muito inferior ao dos países europeus desenvolvidos. Sem forte aceleração do investimento, o nosso atraso relativamente a esses países não cessará de se acentuar.

Por outro lado, informa-se no preâmbulo da proposta de que a liquidez monetária tem vindo a crescer por várias razões, entre as quais avulta a das transferências do estrangeiro, que não têm parado de aumentar. Encontramo-nos assim em situação um pouco a modos de círculo vicioso: para conter o aumento de preços e acelerar o progresso económico necessitamos de aumentar os investimentos. Existem disponibilidades acumuladas nos estabelecimentos de crédito, mas não há dinamismo suficiente na iniciativa privada para canalizar para investimentos produtivos esses capitais disponíveis, correndo-se o risco de eles se encaminharem para o consumo e exercerem ainda maiores pressões sobre os preços.

A proposta de lei de meios que estamos apreciando refere textualmente a este propósito que «a experiência tem mostrado que frequentemente a actividade privada não corresponde da forma desejada aos incentivos criados pelo Governo, mostrando-se por vezes refractária à promoção de empreendimentos que seriam de grande interesse para o progresso económico e social do País». E por isso o Governo encara a possibilidade de, a título supletivo, intervir directamente no sector produtivo, do mesmo modo que já o fazia nas Leis de Meios de 1970 e 1971. Na primeira delas acentuava-se até que a indicação, desse facto se revestia «da maior relevância».

Aprovo inteiramente esta intenção do Governo, mas não me tenho apercebido de que neste capítulo a acção desenvolvida até agora corresponda ao grau de consciência que se tem do problema e da sua urgência.

E quando me refiro à intervenção do Estado na actividade produtiva não quero sifinificar apenas a criação de empresas públicas, mas sobretudo a colaboração de capitais públicos e particulares em actividades industriais. A presença do Estado é elemento fortemente catalizador da confiança e faria acorrer muitas disponibilidades, agora pouco ou nada produtivas, para o crescimento económico ou até constituindo travões ao desenvolvimento. É o caso da compra, pelos emigrantes, de pequenas propriedades rústicas, o que, em grande parte, faz manter o seu valor de venda muito acima do seu valor económico. Não constituirá forte dever para o Estado obstar a esses investimentos ruinosos e encaminhar os capitais dos emigrantes, ganhos com tanto sacrifício, para o desenvolvimento económico e consequente criação de emprego e aumento do nível de vida! Afinal são essas as condições básicas para assegurar o regresso desses portugueses que em terra estrangeira procuram níveis de rendimento que aqui não podem ainda obter.

Esta intervenção do Estado na actividade produtora, em óptica de economia de mercado, tem já largas provas em países, como a Itália, onde constituiu um elemento de arranque poderoso, e que, em grande parte, explica o milagre económico italiano do pós-guerra. E a provar que essas iniciativas encontram acolhimento muito favorável nos capitais privados, está o facto de os investimentos do holding do Estado italiano (IRI) serem em 95 por cento assegurados por autofinanciamento e recursos exteriores e apenas em 5 por cento por fundos públicos.

Que o Governo, na linha da proposta de lei de meios para 1972, se decida a empreender forte e coordenada acção de intervenção na actividade produtiva, em colaboração e como catalizador de capitais particulares, é o meu voto.

Vozes: — Muito bem, muito bem!

O orador foi cumprimentado.

O Sr. Correia da Cunha: — Sr. Presidente e Srs. Deputados: Encontra-se neste momento em termo de discussão um documento importante para a vida do País. Não possui, por certo, a envergadura de um plano de fomento, que obriga a uma visão mais larga; mas enquanto foi possível governar, durante muitos anos, sem planos de fomento, seria impensável fazê-lo, neste momento, sem o cumprimento do preceito constitucional que obriga o Governo a submeter a esta Assembleia, para apreciação, a proposta de lei de autorização das receitas e despesas para o próximo ano. Nesta proposta, de índole essencialmente conjuntural, o Governo compromete-se a prosseguir determinada política económica e social. Para o efeito bem de arrecadar receitas, em obediência a certas orientações a imprimia: à política fiscal e -orçamental; e tem de definir prioridades para dar cabimento ás despesas de uma forma equilibrada.

Porque se trata de uma lei de meios, a sua apresentação é tradicionalmente feita pelo Ministro das Finanças; mas perante a Câmara, e em meu entender, ele aparece como autêntico porta-voz do Governo, a justificar uma política global, e não apenas uma política financeira. As deficiências que porventura marquem a proposta de uma forma negativa não poderão, pois, encontrar justificação na circunstância de ser apenas um membro do Governo a trabalhar na sua elaboração.

O que se passa nesta matéria afigura-se-me uma aberração quase incompreensível. A vida económica do País é orientada a médio prazo, e anualmente comandada pelos planos de fomento e programas anuais de execução. Nos primeiros definem-se as orientações de política económica a médio prazo, orientações que se traduzem anualmente em medidas de política bem concretas e devidamente orçamentadas.

As orientações de contexto estão, por consequência, dadas e naturalmente aceites por todos; quando muito actualizam-se com a revisão do plano. Por isso as considero dispensáveis, nos termos em que se apresentam habitualmente nesta proposta de lei.

Isto significa que não me parece razoável manter por mais tempo, sem íntima conexão, estes dois instrumentos de trabalho, estas duas vias de reflexão.

Que se poderia esperar, então, de uma lei de meios? Exactamente aquilo que a Assembleia vem recomendando insistentemente, pelo menos há dois anos: uma enu