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3 DE MARÇO DE 1973 4723

cessiva venda, é fácil e ocupa pouco espaço para o seu transporte internacional e intercontinental a partir do centro produtor.
Disseram os jornais que se vêm ocupando largamente do assunto, que urnas contendo cadáveres embalsamados e caixotes com milhares de latas de chocolate, entre as quais se disfarçavam algumas com heroína, eram utilizados para transporte do tóxico de Marselha até à América do Norte ou do Sul. E nessa rede terrível de distribuição, em luta com a repressão policial e com as concorrências internas de grupo, os gangsters começam por servir-se de jovens que iniciam e a quem distribuem gratuitamente as primeiras drogas, até conseguirem que eles atinjam rapidamente a fase do desejo irreprimível e passem a pequenos vendedores, para, com o lucro, comprarem o tóxico de que necessitam.
Vejamos agora algumas características da personalidade do toxicómano e as incidências sociais dos grupos em que se integra.
O toxicónamo social vive à margem da sociedade familiar e comunitária, donde se evadiu, e reúne-se, em pequenos grupos. Acaba por ser um politoxicómano, utilizando sucessiva e simultaneamente várias drogas e reincidindo quase sempre que é desintoxicado por tratamento.
A existência da toxicomania social contemporânea na sociedade ocidental resulta de dois factores: um extrínseco - a possibilidade de obter-se a droga com seus efeitos individuais e de grupo; outro intrínseco, ou melhor, um conjunto de elementos intrínsecos isolados ou associados - predisposição, atitude psico-social espontânea, a contestação contra o ambiente familiar em que se está enquadrado, a desadaptação social e o aliciamento, receio ou complexo de insuficiente realização pessoal em relação ao presente e ao futuro.
Provêm hoje os drogados - pelo menos em França, que é talvez o país mais estudado neste aspecto - de todos os meios sociais e não apenas das classes mais ricas, muitas vezes de famílias recentemente transplantadas para os grandes meios urbanos. São, em regra, celibatários, com ligações instáveis, com horror à fixidez do casamento e com certa percentagem de homossexuais. Traduzem, muitos, um conflito familiar ou reflectem perturbações internas da família.
A falta, o interesse ou o fracasso como educador do pai, que o adolescente procura substituir pelo chefe de grupo, corresponde a percentagem importante dos que fogem para o mundo da droga, aspecto este dos mais graves a valorizar.
No grupo de irmãos, são de preferência os de posição extrema, o mais velho ou o mais novo, que abandonam a família.
Os toxicómanos levam, em regra, uma vida hippy, em pequenos grupos, de constituição variável, e cultivam um certo calão próprio. Recusam a ordem social estabelecida, mas com passividade, sem ideias ou desejo de a modificar. Certo neoconformismo, certo esoterismo e certo snobismo, desprezo e esquecimento da sociedade em que vivem dão a alguns, sobretudo utilizadores dos alucinogéneos, uma posição filosófica mística, relacionada com as ideias de Leary, fundador do movimento "para a expansão do espírito", nos Estados Unidos da América.
Dele, diz Paul Chuchard:
Na origem da voga actual, sabemos que se encontra o apostolado venenoso do psicólogo americano T. Leary, convertido ao hinduísmo, que descobriu os cogumelos alucinogéneos em Cuernavaca (1960) e viu na droga deles extraída o meio de dar, sem esforço e sem ascese, uma mística pseudo-oriental aos jovens americanos. O grande humanista A. Huxley, sem compreender também a diferença que existe entre o universo da droga e o universo da ascese, sustentou tese semelhante pouco antes de morrer. E, assim, aparece uma das características essenciais do movimento hippy, de que eles foram origem, que consiste na confusão total das justas reivindicações sociais e do retorno à natureza com a toxicomania, quer a das drogas, quer a da degradação do erotismo e pelo erotismo, "libertações" que são, de facto, terríveis sujeições, bem piores do que as da sociedade moderna.

As motivações próximas que aliciam o toxicómano vão desde os conflitos profundos e interiores de personalidade até às dificuldades nas relações com os outros.
Correspondem a elementos causais na personalidade do drogado a fuga e a evasão, a curiosidade, a influência de amigos, uma hipótese de marcar virilidade ou superpersonalidade, o desejo de expansão, reflectindo muitas vezes uma personalidade imatura ou uma regressão a essa imaturidade, frustração sexual, com reacção contra ela pela perversão, e a "elação".
O fenómeno social da droga nos países onde ela medra e alastra, que não felizmente no nosso, esse fenómeno, dizia, ultrapassa, ou não, a preguiça de doentes psicopatas ou predispostos, ou a perversão ou a curiosidade de uns tantos aliciados para a vadiagem, e a inutilidade, aliadas a um vício que arrasta em bola de neve uns após outros e que tem a cultivá-lo e a expandi-lo os próprios viciados e a tenebrosa rede de traficância que os explora, os tenta e os enebria num proxenetismo odioso?
Dizem certos sociólogos que sim, que a droga é uma doença da civilização, aspecto sui generis da contestação contra a sociedade em que vivemos, sociedade de consumo, ou, antes, de superprodução, como dizia certo autor.
Encontro em Paul Chuchard, ainda, e dele transcrevo, para encurtar considerações, a definição do sentido que ganha a toxicomania como contestação a essa sociedade:

Para não morrer de ignorância, de miséria e de fome num mundo hostil, estaremos condenados a este trabalho incessante de progresso que nos permitiu conquistar a Lua? Os espíritos amargurados e mesquinhos que recordam o passado não têm razão ao dizer-nos que tudo estava melhor outrora e ao condenar a civilização técnica. Mas não devemos deixar de lhes dar razão na sua crítica daquilo que não vai bem numa sociedade desenvolvida que pode ser justamente qualificada de sociedade das doenças da civilização e do progresso, sociedade do esgotamento nervoso [...]. A toxicomania é uma forma de contestação de uma civilização desumana e desequilibrada, que não resulta de uma análise reflectida e lúcida em