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15 DE MARÇO DE 1973 4765

O Sr. Agostinho Cardoso: - Eu vou fazer uma espécie de "ponto" acerca daquilo que VV. Exas. disseram e aquilo que eu penso.
Em primeiro lugar, acho que se deve tratar qualquer pessoa mesmo sem probabilidades de cura. Tratámos os cancerosos, tratámos os tuberculosos no tempo em que não havia cura, etc.
Portanto, todo o toxicómano tem de ser tratado.

O Orador: - Eu não disse o contrário.

O Sr. Agostinho Cardoso: - Exactamente, eu estou a fazer o "ponto".
Segundo ponto: Perante a legislação, como temos considerado o toxicómano? Como um doente em grande percentagem e como um delinquente em percentagem pequena.

O Orador: - Eu considero-o sempre um doente.
Eu considero delinquente o traficante da droga.
O que toma a droga é um simples doente.

O Sr. Agostinho Cardoso: - Aí reside a minha grande discordância e que quero corajosamente pôr.
Um toxicómano é essencialmente um doente, mas pode ser um delinquente, e é-o em certas circunstâncias, como um alcoólico é um doente e é, em certas circunstâncias, um delinquente. É-se delinquente na medida em que se usa a droga em grupo, na medida em que perturba a ordem pública, na medida...

O Orador: - Mas ele faz isso tudo devido à doença.

O Sr. Agostinho Cardoso: - Mas há doentes que são castigados não por serem doentes, mas por praticarem actos de que são considerados responsáveis, erradamente ou não.

O Orador: - São castigados não como doentes, são castigados como responsáveis.

O Sr. Agostinho Cardoso: - É o que eu digo: são doentes, mas que são considerados pelas legislações como delinquentes.
É o caso do toxicómano que contagia os outros e que faz propaganda, etc.
Portanto, em muitas circunstâncias o toxicómano, sendo essencialmente um doente, é considerado pelas legislações também como delinquente.
Como doente ele tem que ser tratado, quer seja voluntário, e neste caso acreditamos um pouco na cura, quer não seja voluntário.
Em regra, os heroinómanos e os consumidores do L. S. D., são quase sempre reincidentes. Agora o que fazem os Franceses é relacionar um pouco a coacção legal com o tratamento, quer dizer: o doente que não se quer tratar é tratado em regime de internamento hospitalar, em meios próprios - eles chamam-lhe, até, socioterapia -, que é feito, pois, longe dos estabelecimentos de psiquiatria, e até o contacto dessa gente com os psicopatas lhes é nocivo. Depois passa para um regime de liberdade vigiada, em que é obrigado a apresentar-se perante o médico sanitário de três em três meses, durante um certo período. Mas, tendo saído desses estabelecimentos hospitalares especializados onde foi tratado coercivamente, pode escolher o seu médico e apresentar às autoridades sanitárias um atestado de que está a ser vigiado periodicamente.
Há aqui, por assim dizer, uma ligação entre a repressão e o tratamento. Há uma espécie de repressão sanitária - se pudermos empregar o termo -, dando e prolongando o tratamento.
Parece-me que é esta a posição que devemos tomar perante o toxicómano.

O interruptor não reviu.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Deputado Agostinho Cardoso, mas voltámos à mesma coisa: eu não afirmei aqui que se deviam tratar os toxicómanos, mesmo aqueles que não tinham possibilidades de cura. A minha dúvida é só esta: não acredito nos resultados que venham a obter-se nesse caso.
Reabilitação. - Uma vez conseguida a desintoxicação destes doentes, é necessário prepará-los para a vida normal. A par de uma intensa psicoterapia para eliminar completamente as tensões e as ansiedades, há que tomar medidas de carácter vocacional, recreativo e social, de modo a acompanhá-los e a integrá-los na sociedade como indivíduos perfeitamente válidos. É de interesse assinalar a importante acção que os ex-doentes podem exercer, ajudando o tratamento e a recuperação dos enfermos mais recentes.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Depois de ter feito uma síntese, tão rápida quanto possível, do problema em discussão, para que o possamos compreender e enquadrar num contexto internacional, não desejaria concluir esta intervenção sem mencionar o que conheço existir na nossa terra no campo da luta contra a droga. Julgo que, além do Centro de Recuperação Social da Ilha da Taipa, em Macau, apenas há, e desde há cerca de dois meses, uma consulta no Hospital de Santa Maria, criada por iniciativa da clínica de psiquiatria, e que funciona como centro de rastreio e tratamento ambulatório de toxicómanos.
É indispensável que num futuro o mais possível breve se instalem centros especializados de rastreio e tratamento no Porto e em Coimbra, além de se melhorar e ampliar a consulta de Lisboa, com equipas bem treinadas de médicos, enfermeiras, psicoterapeutas de grupo, assistentes sociais, etc., além de ligar esses centros com os hospitais psiquiátricos, para tratamento dos casos graves, e com centros de reabilitação, que, igualmente, se devem montar nas três zonas hospitalares do País. Acrescente-se, como nota animadora, que no IV Plano de Fomento, ora em preparação adiantada, se encara a criação de centros anti-droga, o que constituirá, sem dúvida, o primeiro passo de um importante projecto a executar.
A terminar estas minhas palavras, referentes à toxicomania, quero apenas reproduzir duas autorizadas opiniões sobre a enorme gravidade do problema em causa. A primeira, formulada em Junho de 1971, pelo Presidente Nixon, que afirmou:

A toxicomania nos Estados Unidos tem agora o aspecto de uma catástrofe nacional. Se não pusermos fim a este flagelo, será ele que dará cabo de nós.