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304 I SÉRIE - NÚMERO 11

É evidente que poderia continuar a citar-lhe exemplos. E vou ler-lhe mais uma passagem sobre outro aspecto que o preocupa muito, do Prof. Robert Debré, da Academia Nacional de Medicina Francesa:

«Acabámos de dizer que, no que diz respeito ao aborto, não se trata de saber em que fase de desenvolvimento é permitido ou não matar. Estamos longe da Idade Média, onde ainda as pessoas se perguntavam em que momento é que o embrião tinha alma.
Nessa altura, pensava-se que para os embriões do sexo masculino a alma vinha aos 40 dias depois da fecundação, para as raparigas aos 80...»

Risos

E o Prof. Debré continua a dizer que. de facto, mesmo hoje estamos longe de saber responder de uma maneira definitiva a todas estas questões. E lembro ao Sr. Deputado Oliveira Dias que o sistema nervoso central de uma criança só está perfeitamente definido por volta dos 6 anos de idade, e mesmo aí ainda há um processo de evolução que vai passar-se.
Em relação a um outro aspecto que aqui também foi levantado, queria lembrar-lhe que. efectivamente, sobre o problema da vida e sobre o problema de saber em que momento é que a Igreja considera que há vida - é evidente que a Igreja e toda a gente consideram que há vida a partir da fecundação do óvulo -, é um facto que, paradoxalmente, o feto que nasce prematuramente, antes das 28 semanas de gestação, não é considerado como um cidadão com todos os seus direitos e não é baptizado pela Igreja.
Há um outro problema que também preocupa muito o Sr. Deputado que é o problema da demografia. Vou pois citar-lhe o que diz Maitre Anne Maríe Dourlen-Rollier da Associação Nacional para o Estudo do Aborto e que também foi membro da comissão que estudou, em França, o projecto de lei sobre a interrupção voluntária da gravidez:

«O que é que se passa na Europa no que diz respeito à natalidade? Constou-se, depois do boom que se seguiu à II Guerra Mundial, uma baixa ligeira em todos os países. Não é um fenómeno particular à França.
A taxa de natalidade na Europa Ocidental varia entre 14,5/1000. Na Bélgica...» -e lembro ao Sr. Deputado que a Bélgica e a Irlanda são os 2 únicos países da Europa que têm uma legislação repressiva, além de nós, em relação à interrupção voluntária da gravidez - «... apesar de haver uma legislação repressiva, a taxa de natalidade é precisamente igual à taxa de natalidade na Suécia onde há muitos anos não há legislação repressiva, pelo contrário, em relação aos meios de contracepção e à interrupção voluntária da gravidez.»
Em Portugal, nesta altura, a taxa de natalidade é de 20.5/1000: na Itália e na Grécia é de 17/1000 e 18,2/1000 respectivamente, taxa esta muito próxima às da Grã-Bretanha e da Suíça e ligeiramente inferior à da Holanda que é de 18,6/1000.
Quero mostrar com estes números que os países que conservaram uma legislação muito restrita em matéria de interrupção voluntária da gravidez e de contracepção vêem igualmente as suas taxas de natalidade diminuir, enquanto que nos países em que esta legislação vigora ou em que há uma prática mais liberal, mantêm-se taxas de natalidade idênticas.
É evidente que os senhores me vão responder com os problemas que se passaram na Roménia e na Hungria.
Mas sabe-se o que se passou nesses países! E essa é a causa principal do nosso apoio ao projecto de lei que o Partido Comunista apresenta e é a nossa razão ao apoiar o projecto de lei que o Partido Social Democrata apresenta sobre a contracepção.
Se se verificou o problema que veio a notar-se depois da introdução da lei que liberalizava a interrupção voluntária da gravidez na Hungria e na Roménia, isto deveu-se apenas a um facto: é que esta lei não foi acompanhada de uma outra que devia prever, que devia informar, que devia, digamos, criar a ligação entre a protecção à maternidade e a situação pior que é a interrupção voluntária da gravidez, ligação essa que é o planeamento familiar.
Pura e simplesmente, não foi feito planeamento familiar nem na Hungria, nem na Roménia depois da introdução da lei sobre a interrupção voluntária da gravidez, o que evidentemente levou a um aumento dos problemas de que os senhores se servem como argumento neste campo.

Aplausos da UEDS, do PS, do PCP e do MDP/CDE.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Arnaut.

O Sr. António Arnaut (PS): - Sr. Deputado Oliveira Dias, a sua intervenção, pretensamente estribada em elementos de carácter científico, está, no meu entender - salvo o devido respeito -, profundamente eivada, de uma concepção ultrapassada da moral cristã.
Naturalmente que V. Ex.ª invoca essa moral sendo, como é, militante de um partido confessional.

Uma voz do CDS: - Não é confessional. Está enganado!

O Orador: - E eu não vejo hoje na Europa, mesmo em nome dessa moral, tomarem-se posições tão ultramontarias como V. Ex.ª tomou.

O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - Mesmo países católicos da Europa têm como sabemos, legislado no sentido da despenalização do aborto e mesmo até alguns responsáveis governamentais - como é o caso da França - tomaram essa iniciativa. Na Europa, só a Irlanda e a Espanha é que têm ainda uma legislação repressiva do aborto.
Mas, enquanto V. Ex.ª falava em nome dessa moral, eu lembrei-me que a Igreja Católica, durante séculos, mandou para as fogueiras da Inquisição milhares e milhares de pessoas, certamente numa concepção especial do direito à vida e do princípio da inviolabilidade da vida...! Enquanto V. Ex.ª falava, nos 20 minutos que levou a sua intervenção, morreram no mundo 500 crianças vítimas da fome porque, como sabe, todos os dias, cada dia que passa, morrem mais de 40 000 crianças vítimas da fome.
Eu gostaria, pois, de saber se V. Ex.ª, na sua concepção pretensamente moral, condena com a mesma indignação as circunstâncias de opressão, de miséria e de ignomínia, de desigualdade e de injustiça social que permitem que morram por dia cerca de 40 000 crianças, que ainda morram em Portugal - e certamente morreram enquanto V. Ex.ª falava - pessoas e crianças por falta de assistência médica.
V. Ex.ª não vai com certeza fulminar-me por eu ser um apóstata ou um herege porque eu, com o meu espírito de tolerância, não o quero neste momento acusar de ser