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578 I SÉRIE - NÚMERO 18

O Sr. Veiga de Oliveira (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Defesa Nacional: Quando há cerca de 4 semanas, examinámos pela primeira vez a proposta de lei do Governo sobre Defesa Nacional e Organização, Funcionamento e Disciplina das Forças Armadas, o Grupo Parlamentar do PCP logo advertiu para quatro questões essenciais.
Em primeiro lugar, o quadro constitucional resultante do processo de revisão, contra o qual o PCP se pronunciou no momento e através das formas adequadas, não determina, nem impõe nenhuma das soluções que temos por negativas e reducionistas e exclui mesmo, de forma clara, algumas das soluções da proposta de lei e do texto sobre ela aprovado.
Em segundo lugar, o texto está eivado de inconstitucionalidades. Inconstitucional, desde logo, a concepção de defesa nacional e das missões das Forças Armadas, ínsitas na proposta. Inconstitucional, a amputação de algumas das competências do Presidente da República e da Assembleia da República.
A regulamentação das restrições ao exercício de direitos por militares e agentes militarizados, surge feita fora do tempo e do lugar próprios, com desmedida extensão, alargada aos membros das Forças Policiais. É ainda inconstitucional, a inclusão nesta lei de normas da competência reservada do Governo, designadamente, as relativas à orgânica do Ministério da Defesa Nacional, com o que se pretende fugir por contrabando à fiscalização presidencial a que os decretos-leis estão sujeitos, e conseguir soluções de concentração de poderes que dificilmente seriam alcançáveis por outra forma. O decreto inclui ainda figuras sem cobertura constitucional, ou claramente contrárias à Constituição e sempre desestabilizadoras das Forças Armadas, como por exemplo, a chamada «confirmação» das actuais chefias militares e a criação da cavilosa figura dos CEMGFAs e CEMs interinos. Finalmente apontámos o facto de a proposta misturar inaceitável e perigosamente a regulamentação do estado de sítio e do estado de emergência, com a Lei de Defesa Nacional e de Organização, Disciplina e Funcionamento das Forças Armadas. Amálgama do qual se poderiam extrair consequências desastrosas para a democracia portuguesa.
Em terceiro lugar, a proposta e o decreto dela resultante caracterizam-se por uma incorrecta inserção das Forças Armadas no Estado, colocando-as, na prática, na exclusiva dependência do Governo, com prejuízo do equilíbrio constitucional dos poderes dos órgãos de soberania e abrindo caminho à sua governamentalização e partidarização, com todos os perigos daí decorrentes. Por acréscimo, as soluções previstas concentram os já de si exorbitantes poderes do Governo num dos seus membros, o Ministro da Defesa Nacional, configurando uma situação de poder pessoal contrária ao respeito pelos mais elementares princípios da ordem democrático-constitucional.
Em quarto lugar, do texto agora em reconsideração resultariam limitações indesejáveis e mesmo arriscadas, para a autonomia das Forças Armadas, para a sua democracia interna e para as garantias constitucionais que visam assegurá-las. A instrumentalização do Conselho Superior de Defesa Nacional por parte do Governo, a intolerável redução do Presidente da República ao duplo papel de mero participante nesse órgão consultivo do Governo - se bem que com voto de qualidade - e de seu conselheiro privado, a colocação das chefias militares em posição inferior à de inúmeros altos funcionários da Administração indirecta e autónoma do Estado, de forma nociva à eficácia das Forças Armadas e ao cumprimento das suas missões, tudo isto se insere neste quadro e, para além da aberração que representa, comporta novos motivos de instabilidade e confronto institucional.
De todas estas objecções de fundo, só a referente à exclusão das normas relativas ao estado de sítio e estado de emergência logrou acolhimento. O decreto foi enviado para promulgação, recheado de soluções defeituosas, desestabilizadoras e inconstitucionais. Por isso estamos confrontados com a necessidade de as reexaminar a todas e entendemos que a Assembleia da República deve responsavelmente aproveitar o ensejo que lhe é facultado para expurgar deste decreto as inconstitucionalidades e as soluções contrárias à estabilidade das Forças Armadas e à consolidação da democracia. Irrecusavelmente constitucional, o veto presidencial é por todas as razões oportuno. Depende desta Assembleia, para defesa das instituições democráticas, torná-lo eficaz.
Nestas circunstâncias, são incompreensíveis as posições já adiantadas publicamente por alguns responsáveis políticos, visando constranger, diminuir e mesmo anular, com irracional obstinação, o exercício responsável das competências da Assembleia da República, impedindo-a de corrigir, alterar e eliminar as normas mais defeituosas, as inconstitucionalidades mais flagrantes.
Nem se compreende que alguns, tendo começado por afirmar a sua disponibilidade para considerar e atender as razões constantes da fundamentação do veto presidencial, alinhem agora com a afirmação de que um diploma com estes vícios é a «Lei de Defesa Nacional possível», e alinhem mesmo com a cegueira que já levou outros a afirmar que votarão de novo integralmente o texto já aprovado, «incluindo os erros ortográficos, se os houver», na expressão de um dos incondicionais do actual texto da lei.
Nas últimas 48 horas vieram a público posições contraditórias e graves divergências que põem em causa a maioria de dois terços necessária à obtenção dos propósitos dos que apostam a fundo no confronto institucional.

O Sr. António Moniz (PPM): - Essa agora!

O Orador: - Entre os chefes de fila da via da confrontação há mesmo quem se socorra de interpretações psica-analíticas para iludir responsabilidades, e tentar ignorar as sérias advertências sobre as repercussões de uma tal postura para a consolidação das instituições democráticas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Prosseguir por tais caminhos seria demasiada cegueira. Não admira por isso que mesmo da direita se ergam algumas vozes apelando ao bom senso, à correcção do que possa ser corrigido, em resumo: ao realismo. Pela nossa parte entendemos que sensato será, que esta Assembleia procure as soluções de equilíbrio desde sempre desejáveis, elimine os dispositivos desconformes à Constituição, refazendo o que haja a refazer, sem crispações e preconceitos que ameaçam transformar a Lei de Defesa Nacional numa arma de arremesso contra o normal funcionamento das instituições democráticas.