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724 I SÉRIE - NÚMERO 21

ração acima de 3 ha, è caso para colocar estas questões.
Teve o Governo em consideração as consequências socioeconómicas de tal decisão? Qual o impacto desta medida para milhares de viticultores que dependem económica e exclusivamente desta actividade? Que alternativas lhes são apresentadas? E se elas existem por que não foram apresentadas em simultâneo, com? aliás qualquer planeamento integrado exigiria?

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Ou será que o Governo estudou mesmo as consequências e que elas são de tal forma gravosas que por isso mesmo não as divulga?
Aliás, questões semelhantes terão de ser colocadas para qualquer fase do projecto em questão. Ao avançar na reconversão agro-pecuária de uma região tão deprimida como é a rural de Trás-os-Montes, onde o peso do autoconsumo e da subsistência constitui uma base da própria economia, tem o Governo em conta o impacto inevitável das medidas que propõe no tecido socioeconómico e humano da região?
As alternativas procuradas são em razão exclusiva da maximização dos rendimentos físicos, ou têm em conta a realidade da estrutura económico-agrícola e de todas as condicionantes e da sua própria debilidade? Quem serão realmente os beneficiados? Qual o preço de uma pretensa maximização tecnocrática?
E poderemos avançar desde já porque o Governo nos concedeu de barato as consequências da aplicação da portaria relativa à vinha do Douro? Nada existe, nada nos foi apresentado pelo Governo que nos permita equacionar objectivos e impactos, sendo certo que os mesmos, independentemente de permitir desenvolvimentos subsectoriais, podem ter efeitos profundamente inibidores na maioria dos que constituem a substância social e económica da região e que são os pequenos agricultores.
Outras questões serão de levantar. Apresenta-se, como eu disse, um projecto tecnocrático, pretensamente maximalista, mas inserido em que contexto? Qual a política de crédito a aplicar? Teremos a mesma estratégia de crédito que é neste momento aplicada à agricultura portuguesa em geral? Vamos pretensamente desenvolver o sector primário para depois o expropriar através das mais diversas vias, desde os circuitos de comercialização à política de preços? Será por esta via? Será pela via das transferências através do sistema monetário-financeiro?
Nada nos é respondido sobre isto, nem nada nos é apontado quando se colocam questões como a política de preços e comercialização. Assim pergunto se a política de preços e comercialização será aquela que o Governo pratica actualmente.
Esta questão não é também de oportunismo, é de oportunidade, porque é caso para perguntar: que indústrias nascentes vão resultar deste projecto? Se elas resultam, já que não sabemos quais são, quem delas vai beneficiar? Quem serão aqueles a quem vão ser dados os benefícios de desenvolvimento deste próprio sector? Vamos permitir que o sector primário estenda a sua actividade às indústrias nascentes, ou mais uma vez as vamos integrar em sistemas perfeitamente isolados do sector primário?
Estamos pretensamente a querer desenvolver o sector primário promovendo, eventualmente, aumento dos rendimentos unitários, que é, aliás, uma coisa que é profusamente distribuída, mas que também não se justifica como. Diz-se que se reduz a área de trigo, mas que em contrapartida teremos produções médias de 1 ha que passarão para 1,8 ha.
Com que base é definido esse critério de avaliação dos rendimentos físicos? Resulta do simples facto de se retirarem as culturas dos solos marginais e, portanto, dá-se um aumento substancial dos rendimentos? Ou estamos a contar os factores de investimento técnico-económico nas próprias culturas?
Quando se avançam perspectivas de reconversão cultural, tem-se em conta o impacto dessa mesma reconversão na realidade da estrutura económico-agrícola? Quando se diz que as explorações vão deixar de produzir trigo ou centeio e que vão passar a fazer forragens, tem-se em conta o impacto disto na componente económica da exploração atingida?
Enfim, nada disto é avançado no projecto e eu poderia dizer, sem possibilidade de ser desmentido, que este projecto não é possível de ser discutido tecnicamente porque não nos são dados fundamentos técnicos.
O projecto não é possível de ser perspectivado porque o que nos é apresentado são meros planos de intenção e algumas portarias sectoriais.
A única coisa que nos resta é o facto de saber se, contudo, interessa ou não um projecto de desenvolvimento integrado para Trás-os-Montes. Certamente que aqui estamos de acordo: interessa e é indispensável.
Simplesmente, não seremos nós que iremos avalizar em primeiro lugar um desrespeito, mais uma vez repetido, do Governo para com esta Assembleia, ao pretender solicitar-lhe que ela, às cegas, sem qualquer fundamentação, avalize a concessão de um financiamento.
No entanto, também consideramos que se o nosso voto seria claramente contra a concessão desta autorização caso aqui houvesse apenas uma relação directa desta Assembleia e deste grupo parlamentar para com o Governo, tal não deverá ser o caso porque estão em questão interesses da população de uma vasta região que têm de ser acautelados.
Não seremos nós, portanto, a obstaculizar a possibilidade do financiamento a este projecto. Diremos tão-somente que bem esperamos que os agricultores de Trás-os-Montes não venham a ser defraudados e que as esperanças legítimas que se criam na perspectivação deste projecto não venham, no fim de contas, a ser mais um instrumento de exploração daqueles a quem teoricamente ele se destina, que são os agricultores transmontanos.
É que, para terminar, costuma-se dizer que «para lá do Marão mandam os que lá estão». Infelizmente a História tem demonstrado que assim não é. Para lá do Marão, infelizmente, como para lá de muitas outras regiões, mandam os que cá estão, no poder central.
Está mais uma vez demonstrado - na falta de uma discussão aberta e de uma apresentação concreta dos projectos, na falta da audição e da participação dos agricultores, das suas organizações e das autarquias, na falta de diálogo e de esclarecimento - que efectivamente não se trata de descentralizar. Está-se mais uma vez a proceder a uma acção centralizadora, feita por meia dúzia de cérebros cuja idoneidade técnica até nem se pode apreciar porque nada nos apresentam de técnico que possa fundamentar o projecto.