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6 DE DEZEMBRO DE 1984

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A Comissão de Educação e Cultura desta Assembleia tem dado provas, na análise dos problemas educativos, de que existe uma convergência de opinião no repúdio às políticas educativas quer no governo AD quer agora no governo PS/PSD.
A atitude conjunta de todos os partidos face à portaria que regulamenta o acesso ao ensino superior corresponde ao protesto generalizado de todos os partidos representados nesta Assembleia da República por uma das características mais vincadas da política da AD e da política do actual Governo, a progressiva selectividade do ensino e o afunilamento crescente na formação de técnicos de nível superior.
Infelizmente, a proposta expressa pelo MDP/CDE, que teve o apoio geral dos partidos, não ficou registada na acta da Comissão, mas será por nós tornada pública.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta é uma situação que foge à análise circunstancial dos problemas e remete para a análise tipológica das estruturas.
O MDP/CDE não faz insinuações nem retira ilações da situação; quer apenas remeter à responsabilidade desta Assembleia algumas considerações que poderão eventualmente perspectivar e desenrolar esta nebulosa.
Na verdade, a dinâmica da liberdade nas revoluções portuguesas deste século (5 de Outubro de 1910 e 25 de Abril de 1974) apresentou-se com um forte conteúdo cultural.
As reformas dos primeiros governos logo a seguir à instauração da República estruturaram o ensino técnico superior, tentaram a generalização do ensino primário e multiplicaram de imediato escolas infantis, ao mesmo tempo que se desenvolvia a consciência cívica face à educação e se dinamizava o espírito de voluntariado. O combate ao analfabetismo e a cultura literária do povo impuseram-se como um dever nacional.
As associações culturais surgiram nos bairros das grandes cidades e na mais escondida aldeia. A prática da música, do teatro, o ensino da literatura e a fundação de bibliotecas juntaram em torno de todas estas actividades os intelectuais mais representativos.
Terá de se dizer que todos os grandes escritores, os grandes professores, todos os grandes historiadores e estudiosos desta época participaram neste movimento cultural e a sua obra ficou ligada à luta popular pela democratização da cultura e do ensino.

De tal modo que depois da implantação da ditadura foram precisos 4 ou 5 anos antes que o assassinato eficaz das instituições de ensino e cultura fosse consumado.
A verdade é que, Sr. Presidente e Srs. Deputados, como é do conhecimento desta assembleia de democratas, o espírito de luta por uma cultura e por uma educação popular criou raízes durante a resistência ao fascismo.
Nessa altura, num país quase nada industrializado e apesar da fraqueza do movimento operário, os intelectuais uniram-se ao povo. Durante a ditadura, nas zonas onde se engrandecia a força operária, assistiu-se ao crescimento do movimento cultural apesar de esta força brotar no contexto duma industrialização mergulhada na injustiça e na exploração da mão-de-obra barata.
Esta resistência cultural não foi talvez estranha ao carácter profundamente obscurantista que tomou a ditadura em Portugal, em comparação, por exemplo, com a Espanha que durante o franquismo expandiu a rede escolar, efectivou 8 anos de escolaridade obrigatória e acabou com a analfabetismo.
Aqui, em Portugal, presidiu aos destinos da Nação um professor universitário, discípulo da boa tradição inquisitorial portuguesa, conhecedor dos mecanismos capazes de amesquinhar um povo sob o ponto de vista económico, social e cultural.
A revolução do 25 de Abril foi precedida de uma verdadeira revolução estudantil e de uma explosão escolar que o governo moribundo não foi capaz de dominar. No ano da revolução e nos 3 anos seguintes esta explosão escolar não deixou de aumentar, tendo sido acompanhada de profundas transformações dos valores sociais. Nasceu uma escola nova onde a relação aluno-professor foi definitivamente alterada, a gestão das escolas tornou-se democrática, apesar de algumas pressões políticas em contrário, a relação entre a escola e o meio alterou-se e a autonomia da universidade é hoje um dado adquirido.
Infelizmente os governos constitucionais não tiveram a sensibilidade de quanto seria importante institucionalizar este dinamismo social que a escola lhes oferecia. Deram fracas respostas pontuais e, não tendo a possibilidade de edificar uma política global capaz de aproveitar este dinamismo social, perderam um precioso aliado, a escola.
Depois de 1980 a educação foi totalmente bloqueada pelas contradições políticas das coligações governamentais.
Salvo raras excepções, em breves situações transitórias e nada significativas, os ministros da Educação, contestados por todas as estruturas sociais e políticas de todos os partidos, navegam como um piloto automático, aparentemente independente da razão humana, direitos ao neo-obscurantismo. As várias intervenções do Sr. Ministro da Educação ontem feitas colocaram-se já neste terrível terreno do neo-obscurantismo.

O Sr.ª Amélia de Azevedo (PSD): - Não apoiado!

A Oradora: - Os partidos políticos no poder evitam uma confrontação com a realidade e aninham-se à sombra de uma oposição envergonhada (vide a intervenção do Sr. Deputado Lemos Damião).
A contestação assim generalizada é um grave sinal da profundidade e da extensão do problema e também um sintoma de rotura eminente do sistema, de uma fractura entre o movimento social, os valores profissionais, as necessidades de realização individual e o bloqueio da escola.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Todos os técnicos de educação desta Casa sabem que se a rotura do sistema ainda não se efectuou visivelmente é pelo enorme esforço de muitos professores que, criando autonomia nas suas próprias escolas, são capazes de gerar o ambiente pedagógico que mantém viva a sua função de educadores. De tal modo que poderemos dizer com verdade que mais uma vez em Portugal o ensino se mantém apesar de e contra o poder político.
É, pois, este potencial educativo que urge retirar das mãos nefastas deste Governo, porque não será fácil no contexto institucional que existe e dentro da estrutura do sistema escalavrado, distorcido, mordido, esfarrapado e remendado por montanhas de despa-