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4 DE JANEIRO DE 1985 1305

No entanto, o relatório tão detalhado na informação da actividade do Ministério de José Augusto Seabra, no que se refere a projectos de decretos-leis e nomeação de grupos de trabalho, não foi suficientemente exaustivo, facto que impediu a referência a um projecto de decreto-lei sobre a escolaridade obrigatória da autoria desta equipa ministerial, que na procura de soluções para a sua efectivação enumerava uma série de medidas repressivas transformando policias em caçadores de crianças, professores em cobradores de multas e penalizando com a redução do suplemento alimentar todas as crianças que de barriga vazia e cabeça cansada não obtivessem aproveitamento.
Provavelmente por modéstia, também o relatório não refere o louvor dado por tão insólito ministro a 2 crianças deste pais que na perseguição persistente da escolaridade obrigatória faziam diariamente vários quilómetros a pé até ao estabelecimento de ensino que frequentavam. É desta forma demagógica que este Governo assume as responsabilidades constitucionais a que está obrigado. É desta forma ligeira e hipócrita que este Governo cria as condições necessárias ao cumprimento da escolaridade obrigatória.
Mas passemos finalmente à única medida referida, como concretizada, na tentativa de efectivação da escolaridade obrigatória.

Em primeiro lugar, valerá a pena confrontar a legislação existente, ou seja, o Decreto-Lei n.º 538/79 e o Decreto-Lei n.º 301/84.
Enquanto o primeiro, nunca aplicado na integra, regista no preâmbulo a necessidade de assegurar «um efectivo cumprimento da escolaridade obrigatória em toda a sua amplitude e relativamente a todos as crianças portuguesas» e a «necessidade de se criarem condições que propiciem esse cumprimento e o direito ao trabalho de deficientes que não concluam a escolaridade obrigatória», o Decreto-Lei n.º 301/84, da responsabilidade de José Augusto Seabra, limita-se a reconhecer no preâmbulo a ineficácia das medidas legislativas em vigor, a compilação de legislação sobre a matéria, a que introduz algumas inovações que visam cumprir o objectivo consignado no artigo 74.º da Constituição da República Portuguesa.
Passando à análise do articulado de um e outro diploma é pertinente fazer uma leitura comparada. No seu artigo 2.º, o Decreto-Lei n.º 538/79, garante a todas as crianças do território português a escolaridade correspondente ao ensino básico, enquanto que o Decreto-Lei n.º 301/84, da autoria desta equipa ministerial, no seu artigo 1.º, aceita dispensas de frequência neste grau de ensino, contrariando frontalmente o princípio da universalidade do ensino básico.

Uma voz do PCP: - Escândalo!

A Oradora: - Enquanto em 1979 só se autorizava a dispensa da obrigatoriedade escolar quando comprovada a incapacidade física ou mental da criança pelos Centros de Medicina Pedagógica de Lisboa, Porto e Coimbra, pelos serviços da Direcção-Geral do Apoio Médico ou dos centros de saúde do Ministério dos Assuntos Sociais e, mesmo assim, exclusivamente sob despacho ministerial, o Decreto-Lei n.º 301/84, na opinião de Seabra, entrega essa autorização ao critério das autoridades sanitária e escolar da zona.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: É um escândalo! Enquanto em 1979 se exigia um despacho ministerial caso, a caso, em 1984 qualquer autoridade sanitária, e isso significa, por exemplo, um bombeiro e qualquer autoridade escolar de zona, e isso significa um delegado escolar, podem decidir da permanência ou expulsão do sistema de ensino de uma criança rotulada à pressa e por deficiências do próprio sistema, de inadaptada, de incapaz.

O Sr. Jorge lemos (PCP): - É criminoso!

A Oradora: - O sistema escolar, pode desta maneira rejeitar todas as crianças que não têm sucesso na aprendizagem. 15to é tanto mais grave quanto o diploma institucionaliza o dever de aproveitamento para as crianças que frequentem este grau de ensino, o que significa que o inêxito escolar é causa suficiente para o recurso ao facilitado parecer das autoridades sanitária e escolar da zona, que determinarão facilmente o abandono precoce do sistema de ensino, sem quaisquer alternativas.
E quem são estas crianças que precocemente abandonarão a escola? E por que não aprendem na escola? Provavelmente filhos de pais com salários em atraso ou no desemprego. Provavelmente não aprendem porque têm fome, porque não têm material didáctico, porque não têm instalações com o mínimo de condições, porque têm horários inadequados às suas idades, porque têm professores a quem é recusada toda e qualquer valorização e dignificação profissional.
Enquanto o Decreto-Lei n.º 538/79, de 31 de Dezembro, fixa o início da obrigatoriedade escolar, o actual aceita o ingresso antecipado em termos que se não precisa, respondendo deste modo a uma reivindicação de sectores sociais privilegiados, ignorando as desvantagens para a criança e para o ensino da frequência precoce da escola primária.
O Decreto-Lei n.º 538/79, de 31 de Dezembro, assegura o cumprimento da escolaridade obrigatória às crianças do ensino especial mas o Decreto-Lei n.º 301/84 é omisso nesta matéria, mas não só. Também quanto ao alargamento do período de obrigatoriedade escolar, previsto em 1979, o actual diploma omite-o. E quando a omissão não faz lei, faz o retrocesso.
Em 1979 a gratuitidade do ensino básico envolvia a isenção de pagamento de quaisquer propinas, transportes gratuitos sempre que os alunos residissem a mais de 3 km ou 4 km da escola, conforme as escolas tivessem ou não cantina, envolvia suplemento alimentar para os alunos do ensino primário e preparatório TV, concessão de alimentação e alojamento em condições fortemente bonificadas, auxílios económicos directos, cabendo ao Estado, quando possível, ampliar esses mesmos auxílios, e assegurar a gratuitidade total nas áreas de material escolar, alimentação e alojamento; em 1984 assegura-se a inexistência de propinas, a garantia de instalações escolares adequadas, o seguro escolar e a ridícula isenção de imposto de selo. Quanto a todos os restantes aspectos, a Administração Central reparte desde logo as suas competências com a Administração Regional e Local. O ano lectivo que agora se iniciou, é um exemplo flagrante da leviandade deste alijar de responsabilidades que impediu muitas e muitas crianças de frequentarem os estabelecimentos de ensino obrigatório.
Em 1979, tendo em conta a situação de muitos cidadãos, a quem não foi possível, em devido tempo, por