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I SÉRIE - NÚMERO 49

quer que isso signifique, e creio que usou argumentos que são francamente descabidos ou inaceitáveis.
Em vez de assumir, frontalmente, aquilo que decorre da Constituição, uma interpretação não funambulista, não tortuosa, não pseudo-hábil para encalhar rapidamente nalguns escolhos inultrapassáveis, adopta uma via que é sinuosa e com argumentos novos e velhos, porventura mais velhos do que novos, que não são aceitáveis. Um deles chocou-me particularmente: de revisão em revisão, aquilo que o ouvimos há meses dizer surge-nos agora elevado à décima potência e a visão governamentalizadora, que aqui exprimiu em nome do Governo, das competências da Assembleia da República aparece-nos agora hipergovernamentalizada. Neste momento, o Sr. Secretário de Estado já vem proclamar uma inversão do regime constitucional em matéria de competência legislativa e já o ouvimos dizer que não só as autorizações legislativas não espoliam a Assembleia, o que não é propriamente uma grande novidade para trazer à Câmara, embora o Governo o venha na prática operando, como também que o Governo goza de competência legislativa própria em todas as matérias do artigo 168.º. Deste ponto de vista, este artigo é um enorme logro e engano e deveria ser um apêndice do artigo 201.º da Constituição, que tem as competências legislativas do Governo, não passando a Assembleia da República de um semáforo, que concede «o acto-condição, através do qual o Governo pode operar a sua competência legislativa própria». 15to é uma portentosa inversão do sistema constitucional e V. Ex.ª terá, provavelmente, oportunidade de a sustentar em sede de revisão constitucional, mas em sede de legislação ordinária é francamente abusivo!
O segundo argumento, que penso que visava tocar especialmente a bancada do PCP, era de que a autorização estaria limitada porque a alusão à pena e à dosimetria do Código Penal bastaria para constituir um limite e um modelo quanto à política penal e aos padrões a que o Governo se deveria acomodar, não constituindo pois qualquer violação a concessão de uma autorização deste tipo, que não seria em «branco». Citou em abono dessa teoria aquilo que o meu camarada Veiga de Oliveira pôde expender, adequadamente, antes do regime da revisão constitucional e depois dele, no momento em que sob a nova redacção da Constituição ainda não estava apurado o mau uso e o abuso a que o Governo vem submetendo este instrumento! É um procedimento francamente lamentável e, de resto, acho insólito que se dê ao trabalho de o recordar quando tivemos ocasião de enfatizar, no Diário da Assembleia da República, n.º 87, de 21 de Março de 1984, a p. 3798, que «na sequência da revisão constitucional, clarificado o alargamento da reserva de competência da Assembleia da República em matéria criminal, a concessão ao Governo de poderes para criar ilícitos de mera ordenação social e fixar coimas e aperfeiçoado o regime de autorizações legislativas, não cabe mais a concessão de autorizações legislativas genéricas com este teor». Sendo certo que o Sr. Secretário de Estado veio defender agora o que não defendeu então, não se atrevendo, portanto, neste momento, a pedir uma autorização legislativa inteiramente indelimitada, já aceitando colocar uma cláusula como a que propusemos que fosse introduzida e que visa excluir a modificação de crimes, contravenções e penas previstas no Código Penal, coisa que o Governo reivindicou e usou para a famosa rábula de injúrias ao Sr. Primeiro-

-Ministro, em Coimbra, no ano de 1983. Quer dizer que o Governo reconhece que andava mal em 1983 e penso que se durasse muito mais haveria de acabar por reconhecer que anda mal em 1985. Esperamos que não ande mal durante muito mais tempo!

Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presldennte: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raul Castro (MDP/CDE): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: Embora se trate de um debate repetitivo, ele é da maior importância porque afecta as liberdades individuais dos cidadãos. É sabido que o n.º 2 do artigo 168.º, ao caracterizar as leis de autorização legislativa, afirma que elas devem definir «[...] o objecto, o sentido, a extensão e a duração da autorização [...]».
O esclarecimento que queria pedir ao Sr. Secretário de Estado, já que não me parece que ele resulte da intervenção que fez, era no sentido de saber quais eram as condutas que o Governo pode vir a entender serem ilícitas.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares.

O Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Permitam-me que altere a ordem das respostas em relação às perguntas, no sentido de satisfazer em primeiro lugar, uma solicitação do Sr. Deputado José Manuel Mendes, a que já devia ter feito referência na minha intervenção, pedindo pelo facto desculpa.
De acordo com a minha indicação - e é possível que algo me tenha escapado - o Governo utilizou a autorização legislativa conferida pela Lei n.º 25/84 no Decreto-Lei n.º 316/84, de 1 de Outubro, relativa à difusão da música portuguesa pela rádio e televisão, no Decreto-Lei n.º 290/84, de 27 de Agosto, que introduziu alterações ao registo comercial; no Decreto-Lei n.º 400/84, de 31 de Dezembro, que define o regime dos loteamentos urbanos, nos Decretos-Leis n.º 21/85, de 17 de Janeiro, e n.º 22/85, de 17 de Janeiro, sobre os jogos de sorte, fortuna e azar (as máquinas eléctricas de diversão).
Em relação à intervenção do Sr. Deputado José Magalhães, não vou rebater a adjectivação em cascata com que o Sr. Deputado me mimoseou. O excesso adjectivante não quer dizer neste caso, decerto, falta de argumentação, significando apenas uma forma de estimular o debate. O que lhe quero dizer, com toda a clareza, é que não defendi aqui nenhuma concepção governamentalizadora da repartição de competências legislativas. Limitei-me a perfilhar a concepção doutrinária expressa pelo Prof. Gomes Canotilho no seu Direito Constitucional, 3.ª edição, onde ele explicitamente indica que em matéria de autorizações legislativas o Governo age em nome próprio e não como representante ou mandatário ou como mero núncio da Assembleia da República. A concepção doutrinária perfilhada pela generalidade dos juspublicitas da Europa Ocidental, nomeadamente na esteia das concepções alemã e italiana, que são as doutrinas que mais detalhadamente estudaram esta matéria, é a de que a competência legislativa do Governo, nestes casos em que