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I SÉRIE - NÚMERO 49

Conviria, de qualquer modo, explicitar que se nos afigura que não é passível de colher o nosso aplauso um procedimento governamental que, à revelia do estabelecido pelo n.º 2 do artigo 168.º da Constituição, visa, sem configurar o objecto, ou o sentido, ou mesmo a extensão daquilo que pretende, obter desta Assembleia da República um cheque em branco em matéria tão gravosa e tão delicada como a penal.
Efectivamente, estamos, uma vez mais, perante um verdadeiro pedregulho jurídico, tanto mais quanto é certo que o Executivo, reiteradamente, insiste na sua conduta e não consegue, de sessão para sessão, encontrar a grelha de defesa dos seus mecanismos, minimamente capaz de convencer seja quem for. A teoria das válvulas de segurança, que ainda há pouco ouvimos discutir, pela enésima vez, sem que possa revelar-se sufragável e suficientemente forte para dar garantias de defesa aos cidadãos e ao regime, não colhe neste domínio. Por isso mesmo, perante um pedido de autorização legislativa que permite tudo e que vai sendo indecisamente modificado, à medida que o tempo passa, não temos outra alternativa que não seja a de, na conformidade do texto constitucional e coerentemente com as nossas posições, adoptarmos o voto que adoptámos.
Lembre-se, por exemplo, que, antes da revisão constitucional, o Governo havia obtido seis vezes este tipo de mecanismo. As penas eram então limitadas a 2 anos. De então para cá já se subiu para 3 anos e não sei quando é que o Governo não entenderá, por abstrusidade total, que elas devem ser alteadas até à pena maior e que os crimes devem ser todos. Estamos num domínio em que as competências da Assembleia são espoliadas, não tanto pela natureza teórica do instrumento de que se lança mão, mas pela sua efectivação prática, uma vez que se impedem os deputados de conhecer, em matéria penal, aquilo que o Governo preconiza e de que o Estado irá ser dotado, uma vez que, deste modo se enfraquece, e, diria mesmo, em alguma medida, envilece, a componente parlamentar do regime.
Estas razões abundam e bastam para que a nossa atitude seja esta, mas importa salientar que o mau uso dado até aqui aos pedidos de autorização legislativa formulados pelos Governos, neste domínio concreto, não tende a ser melhorado por este Executivo. Bem pelo contrário, tudo nos leva a admitir que o uso que vai fazer se é, ademais, para além das razões de constitucionalidade suficientemente arguidas, um uso incoonestável, tão mau que importa sinalizá-lo desde já. Daí que, na apreciação da proposta governamental, tenhamos aflorado questões de generalidade, não esquecendo, naturalmente, que ela irá ainda surgir nesse patamar para nossa discussão. As portas para toda a discussão estão abertas, será fundamental não deixar de analisar, até ao ínfimo pormenor, as consequências do regime que, à revelia da nossa lei fundamental, se pretende impor.
Será a altura de todos os Srs. Deputados deixarem, de uma vez por todas, de assumir posições de mero comodismo e de reflectirem, com toda a atenção, para que, no momento próprio, saibam assumir as responsabilidades que lhes incumbem.
O que está, está, e está mal. Vejamos se o uso que o Executivo vai fazer deste pedido de autorização legislativa, quando lhe for concedido, mais daqui a uns tempos, será compatível com as leis e com a Constituição. Nós, como disse há pouco, cá estaremos para accionar os mecanismos necessários, quando for caso

disso, sempre que o Governo se revele relapso, canhestro e incompetente.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Entendemos que tendo esta matéria sido já suficientemente abordada e discutida em todas as suas consequências e implicações jurídico-constitucionais noutras oportunidades, e mais uma vez agora brilhantemente referidas pelo Sr. Secretário de Estado, nos
pôde dispensar de vir à colação participar activamente neste debate.
A nossa posição de voto, ao rejeitar a impugnação da ASDI relativamente à proposta de lei n.º 98/III, é, naturalmente, uma posição tranquila que decorre, como todos compreenderão, não de uma atitude de submissão relativamente ao Governo, como se pretendeu insinuar, mas da convicção de que não é prejuízo a existência de uma linha de fronteira entre órgãos de soberania quando esses órgãos se propõem manter uma atitude de cooperação num sentido construtivo e num sentido útil para o País.
Entendemos que este pedido de autorização legislativa está suficientemente fundamentado quando, no exercício da actividade legislativa própria, o Governo precisa de definir ilícitos criminais ou contravencionais, justamente, para que certas normas não fiquem em branco e possam ter uma aplicação coerente relativamente ao estatuído nos diplomas que o Governo tem necessidade de criar. Pensamos, portanto, que as questões de oportunidade legislativa estão suficientemente justificadas por parte do Governo e que a oposição não conseguiu aqui demonstrar que esteja a ser flagrantemente violada - nem sequer indirectamente violada a norma constitucional.
Quanto ao critério, que ouvimos aqui referir, de que a Constituição, depois da revisão, criou uma sessão legislativa que não é agora interrompida a partir de meados de Junho, entendemos que esse argumento é também um mero critério de oportunidade e que no passado foi com base nesse critério de oportunidade que se justificou, por parte da Assembleia da República, o recurso às autorizações legislativas por si própria concedidas, então, se elas eram constitucionais ao abrigo da norma sobre autorizações legislativas, não vemos que deixassem agora de o ser porque a sessão legislativa decorre entre 15 de Outubro de um ano e 15 de Outubro do ano seguinte, apesar de haver um período normal e um período extraordinário dos seus trabalhos.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - São, portanto, argumentos que estão batidos e esbatidos até à exaustão, não nos convenceram, preferimos manter uma linha de cooperação com o Governo nesta matéria e por isso, naturalmente, votámos contra o recurso interposto pela ASDI no sentido de impugnar a admissão da proposta de lei do Governo.

Vozes do PS: - Muito bem!