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2172 I SÉRIE - NÚMERO 32

gerir ao Sr. Deputado Cardoso Ferreira que revisse os seus conhecimentos de aritmética.

Risos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à segunda parte do período da ordem do dia, da qual consta a discussão da proposta de lei n.º 98/III, que concede ao Governo autorização legislativa para definir ilícitos criminais ou contravencionais e as correspondentes penas.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Ministro da Justiça.

O Sr. Ministro da Justiça (Mário Raposo): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em termos pessoais, ser-me-ia, por certo, mais estimulante regressar à actividade parlamentar, embora agora em representação do Governo, para encarar medidas legislativas, elas próprias mais estimulantes - como é, designadamente, o caso das que dizem respeito ao acesso ao direito e aos tribunais.
Isto até porque nelas haverá, desde já, embora com as inevitáveis dissonâncias, reconhecíveis pontos de confluência de meios normativos e de objectivos finais entre o Governo e as oposições.
Mas nem sempre o que gostaríamos que acontecesse se verifica na realidade e, ao iniciar as minhas funções no actual Governo, vim encontrar, já em fase de debate, a presente proposta de lei de autorização legislativa.
Não tenho dúvida de que alguns dos reparos que a ela poderão ser deduzidos serão dotados de alguma pertinência formal, embora, em boa verdade, pense também que eles se quedarão numa mera aparência. Com efeito, com o presente pedido de autorização legislativa não se propõe o Governo transgredir quaisquer das decisivas regras de inter-relacionamento com a Assembleia da República, que é a sede natural e institucional da soberania legislativa.
O que o Governo pretende é que, assegurado como está o controle ratificativo da Assembleia, e definidos como ficam na proposta os seus âmbito, sentido e duração (já que da proposta se exclui o espaço imputado ao Código Penal), a sua actuação legiferante, em diplomas avulsos secundários, se possa processar com a adequada flexibilidade e imediação.
Poder-se-á, é certo, objectar que, por esta metodologia, ficam por caracterizar os grandes objectivos que o Governo se propõe em matéria de política criminal. Creio, porém, que assim não é. Esses grandes objectivos são os que fluem do Código Penal; e, quanto a esses, o Governo, em tempo devido, dará conta à Assembleia da República das alterações que, sem de modo algum o descaracterizarem, nele poderá pretender introduzir.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Não tenho dúvida de que, tendendo o ilícito contravencional a ser progressivamente substituído pelo direito das contra-ordenações, e sendo propósito do Governo submeter a esta Assembleia os diplomas legislativos que, pelo seu relevo, possuam significativo relevo e dignidade normativa, a autorização legislativa que agora se pede só incidentalmente virá a ser utilizada. Acontece, porém, que, sobretudo no direito da economia, a não assunção atempada de medidas legislativas onde, como contrapólo das normas impostas, se prevejam medias sancionatórias de natureza penal ou contravencional pode ser contrária ao interesse público e à realização dos objectivos determinantes de um Estado de direito. É a esse perspectivável risco que se pretende obviar.
Acontece, de resto, que, não visando erigir-se em le ministère de la loi, como na frase de Alain Peyrefitte, estará o Ministério da Justiça, numa perspectiva interdisciplinar e interdeparmental, atento, por forma a que não se desvirtuem as grandes coordenadas da política criminal por que é muito especialmente responsável.
E, globalmente, estará o Governo atento a que, em circunstância alguma, se desvirtue a relação de responsabilidade política que, nessa medida, o vincula à Assembleia da República.
E, para tal, evitará, com ressalva de circunstâncias excepcionais e meramente subsidiárias em relação à sua competência própria, fazer uso da autorização que agora solicita.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Espero, noutras situações, comparecer perante esta Assembleia - da qual me honro de ter feito parte - para analisar e ajudar a debater, por parte do Governo, problemas de fundo que, desde logo, ajudem à construção de um Estado de direito e de justiça social.
Apresento-me agora para justificar uma questão de metodologia, que, convolada para a sua eventual aplicação futura, se revelará meramente instrumental. O futuro o dirá. E dirá, sobretudo, em seguimento do que a experiência tem revelado, que, por vezes o apelo ao perfeccionismo formal poderá pôr em risco objectivos essenciais que, em confluência, à Assembleia da República e ao Governo cabe prosseguir, cada um no seu espaço institucional próprio.
O direito sancionatório que agora poderá estar em causa será, com efeito, e em qualquer caso, um direito incidental e secundário, que não envolverá significativas opções em matéria de política criminal.
Esta repercutirá, é certo, em qualquer opção legislativa.
E será exacto e pertinente exigir que o Governo, nas opções, mesmo incidentais que tome, respeite a unidade do sistema. Mas não menos certo é que a esta Assembleia sempre pertencerá a última e decisiva palavra, a mais relevante das quais será a de um juízo de confiança sobre a actuação global do Governo.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Ministro da Justiça, pude, há momentos, da tribuna da Assembleia da República, fazer a apresentação de um projecto de lei do PCP, relativo à organização e funcionamento dos julgados de paz, aduzindo então algumas considerações sobre a situação da justiça em Portugal.
Referi aquilo que ninguém contesta: que é péssimo o estado das instalações; que há juízes que não são nomeados para onde é necessário que eles estejam; que há carências gritantes de infra-estruturas e de apoios de natureza técnica na rede dos tribunais; que os processos se amontoam, tornando a justiça perfeitamente ineficaz, para além de ser já cara e distante; que atinge o astronómico número de 270 000 o conjunto dos processos pendentes, alguns dos quais, em matéria criminal, há mais de 5 anos jazendo à espera de uma decisão, panorama que é, não apenas grave, como aviltante