O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

15 DE MARÇO DE 1985 2419

Embora com vários pedidos, não vou repetir...

Aplausos.

Uma espécie evidenciou-se, porém, na sua evolução e criou uma diversidade espantosa de estilos de abrigo, adaptados aos frios intensos, aos calores tórridos, aos pântanos, e conseguiu mesmo que até eles chegasse a água, o calor e a luz.
Essa espécie, está bem de ver, é o Homem!

Risos.

Do habitat nas grutas à moderna casa, é toda uma caminhada, semeada inicialmente de soluções engenhosas, equilibradas, adaptadas ao meio natural em que as comunidades humanas viviam.
As casas antigas das nossas aldeias e vilas reflectem esse saber milenário, feito da experiência das múltiplas gerações de habitantes dessas regiões.
Mas não só as técnicas e os materiais utilizados eram harmoniosamente adaptados; a própria gestão do solo a urbanizar, tal como os espaços de construção, eram colectivos e representavam uma verdadeira solidariedade social, que se perdeu quase por completo e que os movimentos ecologistas, cooperativos, etc., estão a reanimar como alternativa económica, social, cultural, ecológica.
Hoje, porém, nas nossas cidades, o homem e a mulher do «casal moderno» lutam toda a sua vida útil para pagar ao banco ou ao senhorio o seu ninho, um cubículo construído sem qualidade, onde quando chove o bolor destrói o papel de parede e cria alergias e outras doenças em todo o agregado familiar, onde se ouvem os vizinhos de cima, de baixo, dos lados nas suas movimentações quotidianas, onde se treme com o frio do Inverno...

Risos.

Eu não quis entrar em pormenores!

Risos.

E essa parte, infelizmente, é muito importante...

Risos.

Nós falamos aqui com um certo humor, mas, na realidade, isto é dramático para os casais que não podem exercer naturalmente...

Risos.

Aliás, ao ver algumas caras sérias, penso que há realmente problemas desse estilo nas suas habitações.

Risos.

Mas, como dizia, nessas casas treme-se de frio no Inverno e é-se assado com o calorzinho do Verão!
Para ir para o emprego e dele voltar, são horas nos transportes apinhados, lentos e cada vez mais caros!
Come-se à pressa e em pé em qualquer balcão de restaurante ou, como vai sendo cada vez mais vulgar, uns croissants com recheios para enganar a fome numa das centenas de vistosas e coloridas croissanteries que proliferam por este país, como cogumelos nos bosques! Sinais de crise, na área da alimentação, com solução de tipo europeu!...

Mas ei-los que voltam à tarde, cansados, nervosos, frustrados, com a saúde física e mental ameaçada a médio prazo, para o seu lar, doce lar. As crianças vêm da creche ou da casa das pessoas que delas cuidam, não se sabe se bem se mal; é o engolir qualquer coisa à pressa e o deitar ou ver a televisão que temos, como quem toma um suporífero!

A estabilidade do nosso «mundo organizadinho» é ameaçada quando o homem, a sua estabilidade psicofísica, se afunda e rebenta pelas costuras, sujeito a pressões, ao stress continuado e, no nosso caso português, galopante e suburbano.

Mas essa ameaça para o sistema, que nos utiliza, tem sido exorcizada pela existência de válvulas oficiais de segurança, como são os psiquiatras, por um lado, e os tribunais e os policias, por outro, como válvulas de contenção.
E vêm também os tecnocratas do ambiente com vista ao remendo de todas as situações de ruptura ecológica, com o mesmo fim, ou seja, o de evitar contestações demasiado perigosas ao sistema.
Poderão dizer-me que isto é o progresso, é a qualidade de vida, é o futuro, é o alto preço que se paga por se viver no conforto, na comodidade da cidade! Eu digo-lhes que não, que este é o preço que pagamos por não gerirmos o nosso território numa perspectiva humana e sim sob o ponto de vista do lucro cego, estúpido e escravizante, sob a batuta das grandes empresas transnacionais que geram e gerem à distância a nossa crise, na falta de dirigentes políticos com coragem para enveredar pelo desenvolvimento equilibrado e seguro, baseado nas realidades deste pais, nas suas potencialidades e preservando as suas condições naturais e humanas.
Regionalizar o Pais e fazer desaparecer a pressão populacional sobre as cidades da costa - como Lisboa, Porto, etc. - é ter terrenos mais baratos, onde a especulação não chegou nem chegaria se ao Poder Central fossem dados meios para elaborar e fazer cumprir os seus planos directores, para apoiar as cooperativas de habitação existentes no nosso país desde há muitos anos, mas que aumentaram grandemente em número e em qualidade de acção no pós-25 de Abril.
Essa acção, essas cooperativas têm sido abafadas, desmobilizadas pela política levada a cabo nesse sector pelos representantes dos interesses dos especuladores de solos, dos construtores privados desonestos (que muitos há honestos!) e outros vampiros do sistema lucrativista em que vivemos e que hoje aqui manobram os cordelinhos com vista a aprovar mais uma lei altamente gravosa para largos milhares de famílias portuguesas que vivem já hoje em situação dramática.
Tal como dizia Zeca Afonso: «Eles comem tudo, eles comem tudo e não deixam nada!»
Vão dizer-me que venho defender aqui posições utópicas perfeitamente desligadas do mundo moderno, onde Portugal se quer integrar a todo o custo!
No entanto, em Estrasburgo, em Dezembro de 1984, organizações europeias da Bélgica, França, Holanda e Inglaterra divulgaram um manifesto por elas assinado em que lembravam aos Estados da Europa actual que a dignidade dos homens, das mulheres e das famílias passa socialmente pelo facto de viverem numa habitação condigna; que este direito é fundamental para o exercício primário da liberdade; que todos os Estados devem assegurar um regime de direito que consagre e defenda o direito à habitação.