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15 DE MARÇO DE 1985 2421

enormes valores de renda que hoje são pedidos». E isto é de prova simples: faça qualquer um as contas para a renda de um prédio que hoje seja vendido, por exemplo, por 4000 contos. Some 12% de despesas aos 4000 contos. Aplique a taxa de 8%. Divida por 12 e o resultado é 32 contos mensais, isto é, o valor do salário médio nacional!
Só que este valor - um salário médio nacional a tempo inteiro para a renda - vai funcionar para os senhorios tão-só como um valor mínimo. Porquê? Porque, quando, como se faz na proposta, o valor da renda no chamado «regime livre» aumenta todos os anos de acordo com os respectivos coeficientes, então para o senhorio não há nenhum incentivo a fixar uma renda mais baixa (a condicionada), quando pode fixá-la mais alta (a livre) precisamente com o mesmo efeito de aumento regular e anual!
Diria o povo: só se o senhorio for parvo... E não é dos senhorios parvos que está o Governo a curar!

A Sr.ª Zita Seabra (PCP): - Muito bem!

O Orador: - Srs. Deputados, esperar-se-ia, porventura, do Governo um discurso de citações e números - formação bruta de capital fixo (FBCF), taxas de juros, valor acrescentado bruto (VAB), etc. -, tudo para justificar solenemente o relançamento da construção civil que esta proposta iria operar.
Esse discurso não foi feito nem sequer ensaiado.
Por uma razão evidente: porque toda a campanha governamental em defesa da proposta parte de um pressuposto falso e hipócrita: o de que as rendas estariam congeladas.
Mas não estão! Não estão congeladas as rendas dos novos arrendamentos desde 9 de Junho de 1981 (data da entrada em vigor do Decreto-Lei n.° 148/81).
Não estão congeladas e podem ser aumentadas as rendas dos fogos em arrendamento antigo, onde sejam feitas obras - e isto, pelo menos, desde 27 de Julho de 1982, data da publicação do Decreto-Lei n.° 294/82.
Não estão congeladas as rendas dos fogos em que tenha havido transmissão e os descendentes tenham ou atinjam 25 anos.
Não estão congeladas as rendas dos prédios em que tenha havido direito a novo arrendamento.
Não estão congeladas as rendas para comércio e indústria.
Todas estas rendas aumentam (e aumentaram desde 1981!) todos os anos e o mesmo sucederia em relação a todos os novos arrendamentos que hoje, amanhã ou depois se celebrassem na vigência da legislação actual.
Só que, ao contrário do que foi invocado pêlos que aprovaram essa legislação, dela não resultou nada do que foi apregoado: nem aumento do número de construção de fogos; nem aumento da aquisição e oferta de fogos para arrendamento; nem redução dos valores da renda; nem aumento das obras de beneficiação; nem dinamização da construção civil.
Foi, assim, feita a demonstração, preto no branco, da falência da tese de que o descongelamento das rendas provocaria uma melhoria do parque habitacional existente e o incremento e dinamização da construção e oferta de fogos habitacionais.
O fracasso foi evidente - e daí o silêncio que sobre toda essa matéria imperou!

Aplausos do PCP e do MDP/CDE.

Deve dizer-se que a consciência de que o problema da habitação não se resolve por via do aumento das rendas é universal.
Quando, por razões que agora se mostram claramente eleitoralistas, até o PS e o PSD votaram contra o decreto-lei de Mota Pinto que propunha o que hoje está proposto, o argumento de fundo de todas essas bancadas foi sempre o mesmo: que a questão das rendas era a «última a mexer», que «só no quadro de urna política global de habitação», etc...
Um ministro deste Governo (o Ministro Sousa Tavares) clamava pela municipalização do solo urbanizável. Outro ministro (o Ministro Almeida Santos) afirmava: «ponto é, se não temos até hoje esperado de mais do regime das rendas». Concluía em conjunto o Grupo Parlamentar do PS: o que é preciso é uma «Lei Quadro da Habitação» - e apresentou-a -, que aqui esteve pendente de apreciação, estendendo-se por 19 páginas do Diário da Assembleia da República, a 2 colunas.
A coerência de que falava o Sr. Deputado Leonel Fadigas está, assim, à vista. Não há, afinal, política de habitação...

Aplausos do PCP.

... mas é proposto, à cabeça, o aumento geral das rendas!
Para alguns fica, entretanto, a pergunta. Porquê? Porquê tanta pressa? Porquê já, em ano eleitoral? Será tão forte como isso o lobby dos senhorios (dos senhorios ricos, porque só esses é que podem formar um lobby com força suficiente para pressionar o Governo)?
A resposta foi dada com brutal clareza, através da apresentação da proposta de lei n.° 101/III, que estabelece o regime de prazo nos arrendamentos urbanos.
Brutalmente, de sopetão, sem pré-aviso, nem debate público o Governo vem propor à Assembleia da República, nem mais nem menos, que abra caminho e consolide o estabelecimento de prazos nos contratos de arrendamento.
Isto é: o inquilino na situação da proposta de lei sabe desde logo que o senhorio, findo certo prazo, pode, pura e simplesmente, pô-lo na rua. Acabaria, assim, uma garantia fundamental dos inquilinos, garantia de que, pagando a renda e cumprindo as suas outras obrigações gerais, pode permanecer tranquilamente na sua residência.
Como no mundo do trabalho, o contrato a prazo representa uma das violências extremas que o capital pode exercer sobre quem dele depende.
O poder majestático é afirmado no «quero, posso e mando». Não bastava aumentar-lhes as rendas. Foi necessário afirmar publicamente que manda quem pode - o senhorio - e obedece quem deve - o inquilino.
Não há «socialismo» nem «social-democracia» nesta proposta de lei. Dirão que a proposta de lei é só para os novos arrendamentos, é só para 2 anos, é só nestas ou naquelas circunstâncias.
Dirão o que quiserem. Mas violar este princípio da renovação automática, violar um princípio que foi reclamado e foi bandeira dos homens da 1.ª República, violar um princípio de progresso que honrou ao longo do tempo os republicanos, os democratas que o subscreveram, é, tudo resumido, recuar decénios e decénios e deslustrar a luta de um povo que incorporou de ma-