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13 DE ABRIL DE 1985 2835

O Sr. Presidente: - Para. uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Salgueiro.

O Sr. João Salgueiro (PSD): - Sr. Presidente. Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo: Poucos temas na vida do povo português se justificarão mais do que este, que durante 2 dias nos ocupou um debate na Assembleia da República. É das raras ocasiões em que sabemos que se está, necessariamente, a fazer história: a assinatura de um acordo que vai ter consequências inevitáveis por dezenas de anos na boa sorte do povo português...
Pela forma como o debate decorreu acabaram por não se discutir em detalhe as condições de adesão. A preparação necessária para a ratificação do acordo terá de se fazer, entretanto, ao nível das comissões especializadas e por trabalho individual de cada um de nós. Mas é, talvez, melhor assim porque todo o realce foi dado à importância política da decisão em si mesma. Decisão maior que o simples facto de ter levado a concluir mais de 8 anos, com 9 governos, várias coligações e várias maiorias, tornou claro que se trata, antes de uma questão de governo, de uma questão de Estado, verdadeira, uma questão nacional, que vai ser traduzida no texto do Acordo.
Luta de mais de 8 anos, mas que para muitos de nós foi bem mais longa. Desde o tempo da juventude e nos anos que se lhe seguiram foi a luta que muitos de nós quiseram travar. Nesses tempos, democracia e Europa eram sinónimos a vários títulos. A mesma bandeira e o mesmo objectivo traduzido indissociavelmente numa estratégia, num programa, numa maneira de ver o mundo e a realidade portuguesa. Para nós a Europa como a democracia traduzem simultaneamente um projecto de sociedade e um entendimento do. que é a civilização de que fazemos parte.
Da negociação ressaltaram os aspectos económicos e jurídicos mas para nós a luta pela Europa foi ao longo destes decénios, bem mais do que isso: um projecto de democratização plena da sociedade portuguesa com o que isso implica de respeitadas liberdades e direitos individuais, e de garantia das condições para o funcionamento efectivo do pluralismo político, simultaneamente, um projecto de desenvolvimento, de inovação técnica e científica, de acumulação, de capacidade produtiva, de criatividade cultural, de liberdade de informação, um projecto de solidariedade, vivida, entre os Portugueses e com os povos de outros países.
Não podem, por isso, subsistir quaisquer ambiguidades sobre a nossa posição em relação ao que é um desígnio histórico da vasta maioria do povo português. O facto de terem participado em sucessivos governos os 3 principais partidos que foram protagonistas deste projecto de mudança, evidenciou na realidade do que foram estes 8 anos, o apoio da vasta maioria do povo português a tal desígnio.
Mas também não devem subsistir ambiguidades sobre a necessidade de criar as condições para que a reintegração de Portugal no conjunto das nações europeias se possa fazer plenamente. Devemos olhar mais para o futuro do que para o passado. A consequência primeira de tomarmos a sério a importância desta decisão é mudarmos necessariamente de comportamentos em relação ao futuro que nos espera. Olhemos, no entanto, brevemente para algumas das lições que o passado próximo das negociações nos concedem.
Ressalto apenas dois aspectos.
Em primeira lugar, o facto de que chocando, em certa medida, com atitudes tradicionais portuguesas, esta negociação foi, em grande medida, a negociação de números, de quilos, de litros, de escudos por quilo, de calendários, de discussão de meses e de anos! Isto é, a discussão de condições concretas que para os sectores da indústria, do comércio, da pesca e da agricultura, para todas as nossas actividades produtivas e a própria sociedade traduzidas numericamente num período de transição vigorosa. E essa é uma lição, que em particular nós, Portugueses, devemos aprender. Se é decisivo para a sorte dos. povos das grandes nações já industrializadas da Europa o detalhe quantitativo e o calendário das actuacões quanto mais o não deve ser para o povo português essa análise, cuidada dos detalhes e da sua oportunidade!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Diz, aliás, o povo português, numa expressão que ficou de outras épocas, que «quem vai para o mar avia-se em terra». Não é depois de estarmos a navegar, depois de estarmos ao largo, que se pode assegurar o cuidado que a preparação das missões deve ter.
Em segundo lugar, a outra lição foi a de que se nós próprios não tratarmos dos nossos interesses, outros não o farão no nosso lugar. Esta lição, mais desagradável para nós, ficou também bem patente.
Teria sido possível concluir a negociação com a CEE em finais de 1982 negociada já a maioria dos capítulos e encerrados dois terços destes. Se calhar até teria sido possível encerrá-la alguns anos antes, mas disso não tenho provas. Não é por saudosismo, nem para olhar desnecessariamente para o passado, que agora aqui o recordo. É porque não podemos acalentar esperanças de que aquilo que não conseguimos no passado vamos alguma vez impor à Comunidade em relação a alguma dificuldade futura da nossa economia.
Gostaria de salientar que não foi nunca por parte da equipa negocial portuguesa que os atrasos se somaram. Digo-o comia intenção de frisar, se por um lado, a qualidade da equipa, de que estão aqui alguns membros como o então embaixador Dr. Ernâni Lopes e o Dr. António Marta. Mas também para registar o apoio que todos os serviços de todos os ministérios deram para que fossem, pontualmente, apresentadas, mesmo as mais difíceis posições. E ainda - como tive ocasião de fazer quando Ministro das Finanças e do Plano, algumas vezes aqui referi, a importância das decisões históricas do governo PS - também para salientar o apoio que nessa altura, o CDS, hoje na oposição, deu às negociações, designadamente em capítulos particularmente difíceis como os da indústria e da agricultura.
O calendário foi o que a Comunidade entendeu em função da necessidade de negociar com a Espanha. Apesar de todos os contactos com as capitais europeias, nem o conseguimos nós, nem foi conseguido anteriormente, nem posteriormente impor um calendário que fosse o de Portugal. Que isto nos sirva de lição para não esperarmos de diligências políticas no futuro o que for necessário para resolver os problemas portugueses. Contemos connosco, antes de mais.
E parto daqui para a necessidade de afirmar, sem qualquer ambiguidade, que as transformações das nossas estruturas económicas e sociais são hoje inadiáveis.